O português "tem de se assumir como a língua da diferença porque se nós, em português, não formos capazes de entender a diferença entre o português e o angolano ou entre o brasileiro e o moçambicano, aí torna-se numa língua impositiva, culturalmente colonialista, quando tem de ser o oposto: Tem de explodir em todas as direções e ser uma língua da diferença", disse Helder Macedo, à agência Lusa.
Como assinalou o poeta, romancista e ensaísta - que proferiu, ao final da tarde, uma palestra subordinada ao tema "O Português e a Cultura Lusófona no Mundo de Hoje" no Instituto Politécnico de Macau - "é isso que, de certa maneira, acontece um bocado com a língua inglesa", idioma literário de paquistaneses, nigerianos, indianos ou de norte-americanos.
"Nós ainda temos o sentido um bocado imperialista da língua portuguesa", criticou Helder Macedo, para quem "é muito importante que os praticantes culturais de língua portuguesa percebam que se podem entender uns aos outros sem nenhum dominar".
Para o escritor, "se as várias culturas de língua portuguesa se levarem culturalmente a sério deixam de ser periféricas em relação à cultura inglesa e às outras culturas e passam a assumir a sua própria identidade".
"A sobrevivência da língua portuguesa vai ser muito menos dependente de Portugal europeu do que do Brasil, Angola, Moçambique. Esses é que são os países que vão manter a [sua] importância internacional e o desenvolvimento da língua portuguesa, com todas as variantes que vai ter", argumentou.
Por outro lado, nenhuma língua é estática, pelo que "se se vai desenvolver em contacto ou participação e até criatividade de gente que vem de outras línguas e de outras culturas - que é o caso dos africanos - é claro que a língua vai ser muito diferente", prevê Helder Macedo, que aprendeu português nos bancos de uma escola primária de Moçambique.
"Nós, falantes e praticantes da língua portuguesa, - temos acesso a outras línguas, ao inglês, por exemplo, - mas os de língua inglesa não nos leem: São profundamente ignorantes da diferença", defendeu, apontando que "o nosso problema em relação à língua portuguesa é manter a integridade da diferença num mundo cada vez mais o mesmo".
Quanto à China, "só recentemente está a penetrar, de facto, ao nível mundial nas outras culturas e vai ser muito interessante o que vai acontecer porque aí vai haver códigos linguísticos totalmente diferentes", defendeu, recordando, por outro lado, "o investimento político, cultural e económico na língua portuguesa" por parte dos chineses, os quais "perceberam a importância comercial da língua por causa do Brasil e do potencial de África".
"Ainda não aconteceu nada parecido. Qualquer que seja o poder que exista, a cultura chinesa tem raízes tão profundas e tão vastas ao mesmo tempo que vai ser diferente e sendo diferente não imagino o que possa ser essa diferença. Mas que não vai ser parecido com o tupi-guarani desaparecer e toda a gente no Brasil falar português, isso de certeza que não vai", concluiu.