Reestruturar dívida seria "declarar derrota"

O economista Augusto Mateus considera que reestruturar a dívida seria "declarar uma derrota", o que colocaria Portugal num "patamar de grande dificuldade", defendendo que o país "não está nessa posição".

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Lusa
27/04/2014 10:32 ‧ 27/04/2014 por Lusa

Economia

Augusto Mateus

"As palavras têm um valor e reestruturar a dívida sempre significou -- e há alturas em que isso é absolutamente necessário -- declarar uma derrota. E, ao declarar uma derrota, arrumamo-nos num patamar de grande dificuldade. A minha posição é a de que não estamos nessa situação", afirmou Augusto Mateus em entrevista à agência Lusa.

Para o antigo ministro da Economia, o que está em cima da mesa é o país ter "capacidade de crescer a um ritmo que permita garantir, com tranquilidade, os pagamentos em relação à dívida contraída".

"Isso é possível desde que percebamos que o essencial é criarmos condições para podermos melhorar e não declararmos a nossa derrota", disse o professor universitário, sublinhando a importância do "bom investimento" neste processo.

Augusto Mateus defende a necessidade de Portugal "alterar progressivamente o custo e o prazo da dívida", mas considera que "não é preciso ninguém dizer nada sobre isso [porque] toda a gente sabe" e entende que isso é diferente de reestruturar a dívida, que "significa sempre um corte com um processo".

O antigo governante entende que Portugal teria muito a perder se optasse por um pedido de reestruturação da dívida pública, que se iria refletir tanto nos juros como na confiança dos mercados.

"O que é que nos traria um caso extraordinário de reestruturação de dívida? Duradouramente juros mais altos -- mais baixos do que aqueles em que incorremos no passado recente, mas altos em relação aqueles que podemos alcançar -- e uma tutela permanente sobre a nossa política económica", adverte.

De acordo com Augusto Mateus, Portugal ficaria "sempre condenado a uma situação em que o essencial da economia portuguesa era honrar os novos acordos sobre a dívida" e em que "o esforço era para pagar dívida".

Por isso, o economista rejeita "começar a fazer contas" como se o país fosse incapaz de produzir riqueza.

Augusto Mateus realça que Portugal "não tem outro caminho que não seja o de equilibrar a sua força com a força dos credores e [que] é essencial para Portugal ter menos tutela dos credores sobre as suas decisões de política económica".

Augusto Mateus diz que põe "o acento tónico não na dívida, mas na capacidade de investir e de gerar crescimento económico", porque é isso que dá ao país "margem de manobra para fazer acertos na dívida muito maiores do que se [pedisse] um caso extraordinário de reestruturação de dívida".

O professor universitário critica também os "pseudo-keynesianos", considerando que olham para as finanças públicas como um instrumento funcional, cuja gestão se pode adaptar à conjuntura.

"O mundo está cheio de pseudo-keynesianos que acham que as finanças públicas devem ser funcionais: se estou atrapalhado, aumento o défice; se estou bem, baixo o défice. Isso é história, não tem qualquer aplicação na atualidade, embora seja popular dizer essas coisas", criticou.

Para Augusto Mateus, é preciso ter finanças públicas sustentáveis, que "permitam aos Estados cumprir as suas obrigações constitucionais", mas também ajudar a sociedade a ser "mais equilibrada e mais dinâmica", mas ao mesmo tempo "com contas que se fazem no médio/longo prazo e não com contas que se fazem no curto prazo".

O que há a fazer -- na visão do economista -- é aumentar a taxa de poupança das famílias e capitalizar as empresas, uma vez que o problema da dívida não se confina ao Estado.

Augusto Mateus destaca que, "no auge desta festa insustentável", o país chegou a ter uma taxa de poupança inferior a 6%, um valor que está agora próximo dos 12% em linha com a média europeia, embora já haja "um sinal de ligeira redução que conviria evitar".

Outra proposta apresentada pelo economista é o lançamento de "medidas fiscais para ajudar as pessoas a poupar", acompanhado de um "programa ousado de capitalização das pequenas e médias empresas, para que possam crescer e investir".

Tudo isto, combinado com um "jogo continuado de rigor e de criação de finanças públicas sustentáveis", defende.

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