O caso de Angola, que concentra no petróleo quase 90% das exportações, é "preocupante", mas não é o único.
"Há um conjunto de países para os quais as exportações portuguesas têm crescido muito nos últimos anos (...) em que o petróleo é a principal fonte de rendimentos e divisas externas" e uma descida acentuada dos preços terá certamente impacto nas importações destes países, salientou o especialista em comércio internacional.
O Brasil é outro destes casos, já que "aos preços atuais deixou de ter petróleo viável de ser explorado", a par da Venezuela, indicou o também docente da Universidade do Minho.
Algumas destas economias terão "muito menor crescimento" e poderão mesmo entrar em recessão, admitiu, com "efeitos preocupantes para a economia portuguesa".
Atrasos ou suspensões nos pagamentos, quebra de importações por redução do consumo interno e substituição de portugueses por fornecedores de outras origens são algumas possibilidades, com a China a surgir bem posicionada no terreno, indicou Manuel Caldeira Cabral.
"[A China] tem financiado as exportações das suas próprias empresas" para Angola, quer nas obras públicas, quer nos serviços, sublinhou o mesmo responsável, acrescentando que, "quando há menos disponibilidade para pagar, fornecedores desse género poderão ser mais atraentes", mesmo que os concorrentes portugueses forneçam produtos ou serviços melhores.
As preocupações são secundadas pelo economista da IMF Filipe Garcia.
"A economia angolana corre o risco de ver diminuir o fluxo financeiro de entrada de dólares proveniente das receitas do petróleo", afirmou, estimando que o impacto da descida do crude se possa fazer sentir em "todas as entidades com exposição relevante" a Angola.
Filipe Garcia alertou nomeadamente para os riscos de poderem surgir alterações no sistema financeiro.
"Quanto mais tempo se prolongarem os preços baixos do petróleo pior será o efeito", considerou, sugerindo que Angola pode vir a ter problemas de liquidez e tomar medidas que dificultem a saída de capitais.
Manuel Caldeira Cabral avisou que o cenário de arrefecimento das exportações pode ter consequências ainda mais graves, se a queda de rendimentos gerar também instabilidade política nos países exportadores de petróleo.
"Isso pode ser preocupante face ao número de residentes que Portugal tem" em países como a Venezuela ou Angola, onde vivem quase 200 mil portugueses, de forma permanente ou não.
"Seria um impacto muito grande na economia e sociedade portuguesa se tivessem de voltar", frisou, lembrando que há setores com presença muito forte em Angola, como os da prestação de serviços, 'software' ou construção.
Já Rui Bárbara do Banco Carregosa tem uma visão menos pessimista, destacando que a descida de preços do petróleo é genericamente benéfica para os importadores, entre os quais os países europeus, embora crie um "cenário mais volátil" para quem está a exportar para Angola, Moçambique ou Brasil.
"No geral acaba por ser positivo para a economia portuguesa que continua a contar com países europeus, como Espanha, entre os principais parceiros comerciais", sublinhou o analista.
Rui Bárbara reconhece que algumas empresas e setores mais expostos a países exportadores de petróleo possam ser afetados negativamente e perder receitas, mas ressalvou que "cada caso é um caso".
Manuel Caldeira Cabral realçou também aspetos positivos da queda do petróleo para Portugal, já que baixa o preço das importações e "contribui para reduzir o défice externo do país", no qual os produtos energéticos têm um peso importante.