"Enquanto não se eliminar a exclusão e a desigualdade social, na sociedade e entre vários povos, será impossível erradicar a violência. Acusamos os pobres [...] da violência, mas, sem igualdade de oportunidades, as diferentes formas de agressão e de guerra encontrarão terreno fértil que, tarde ou cedo, provocará a explosão", escreveu o papa na exortação apostólica "Evangelii Gaudium" (A Alegria do Evangelho em português).
O documento de 142 páginas, o primeiro do género do seu pontificado, dá orientações sobre a nova evangelização, na sequência da assembleia sinodal de outubro de 2012, e, num sentido mais lato, apresenta o programa e as ideias pessoais do papa.
No documento, Francisco critica o sistema económico mundial, que considera não apenas "injusto na sua raiz", mas que "mata" porque faz predominar a lei do mais forte.
"Como o mandamento de 'não matar' põe um limite claro para assegurar o valor da vida humana, hoje temos que dizer não a uma economia da exclusão e da desigualdade. Essa economia mata", disse o papa.
O papa considerou revoltante que "não seja notícia a morte de frio de um idoso na rua e que o seja uma queda de dois pontos na bolsa" de valores.
"Isso é exclusão", exclama o papa, que denuncia a "atual cultura do descartar".
É uma cultura que não só "deita fora a comida quando há gente que passa fome", como "considera o ser humano um bem de consumo, que se pode usar e logo descartar".
"Já não se trata simplesmente do fenómeno dos excluídos e explorados, mas de serem considerados restos", afirma o papa argentino.
Jorge Bergoglio critica também aqueles que "continuam a defender as teorias que sustentam que todo o crescimento económico, favorecido pela liberdade de mercado, consegue por si só maior igualdade e inclusão social no mundo".
Segundo o papa, "vivemos na idolatria do dinheiro" à qual se junta "uma corrupção ramificada e uma evasão fiscal egoísta, que assumiram dimensões mundiais".
A par da crise financeira, segundo o papa, há "uma profunda crise antropológica que nega a primazia do ser humano e o substitui por outros ídolos".
O papa lamenta que enquanto "os ganhos de poucos crescem exponencialmente", os da maioria estejam "cada vez mais longe do bem-estar dessa minoria feliz".
Este desequilíbrio social, continua o papa, "provém de ideologias que defendem a autonomia absoluta dos mercados e da especulação financeira" e que estão a negar "o direito de controlo dos Estados, responsáveis por velar pelo bem comum".
Por isso, o papa dirige-se aos líderes políticos para lhes pedir "uma reforma financeira que não ignore a ética" e para que encarem "este desafio com determinação e visão de futuro".
"O dinheiro deve servir e não governar", sentencia o papa, assegurando que apesar de "amar a todos, ricos e pobres" tem a obrigação "de recordar que os ricos devem ajudar os pobres, respeitá-los e promovê-los".
Numa outra passagem do longo texto, o papa considera que, apesar de ser tão denegrida, a política "é uma das formas mais importantes de caridade"
"Peço ao senhor que nos ofereça mais políticos a quem doa a verdade da vida dos pobres", disse.