Vargas Llosa apontou a corrupção como "grande ameaça à democracia"

O escritor Mario Vargas Llosa apontou a corrupção como "uma grande ameaça à democracia, que está a minar as suas fundações" e para a qual "há uma tolerância que é extremamente perigosa".

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Lusa
22/07/2014 22:36 ‧ 22/07/2014 por Lusa

Mundo

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Mario Vargas Llosa falava aos jornalistas, minutos depois de ter recebido o doutoramento "Honoris Causa" pela Universidade Nova de Lisboa.

O escritor afirmou que "sempre houve corrupção, mas, hoje em dia, parece haver uma tolerância, que cria uma falta de respeito pelas instituições, uma atitude um pouco cínica face ao poder, ao Governo, às eleições, um grande desprestígio dos partidos políticos, que pode corromper a vida democrática, e é um fenómeno que tanto pode ocorrer nos países desenvolvidos como em vias de desenvolvimento".

Questionado sobre o apoio ao manifesto contra a independência da Catalunha, que assinou, assim como centenas de personalidades da cultura espanhola, entre as quais Pedro Almodóvar, o escritor hispano-peruano Vargas Llosa defendeu que "há que se respeitar a Constituição [de Espanha], que foi amplamente aprovada por imensa maioria de espanhóis, entre eles, uma imensa maioria de catalães".

"Esta Constituição tem regras que devemos respeitar, ou a democracia é ferida, e este texto define que a soberania reside no povo espanhol, no seu conjunto, e uma fração não pode decidir arbitrariamente, tornar-se independente do resto de Espanha, violando uma Constituição e uma soberania", argumentou.

O escritor afirmou que a "Constituição pode ser alterada, mas é preciso respeitar os mecanismos que ela própria tem".

"Uma minoria não se pode substituir a uma maioria do país, e criar um problema constitucional, que é o princípio da democracia".

Questionado pela Lusa sobre a hipótese de criar um regime federalista espanhol - de Estados de Espanha -, como propõe o PSOE, para resolução da questão catalã, Vargas Llosa foi claro: "Não se acalma um tigre entregando-lhe cordeiros. O tigre continua a ser um tigre e, se lhe entregam cordeiros, só se lhe abre o apetite".

"O nacionalismo e o independentismo não são uma doutrina, é uma forma de fanatismo que não se aplaca com a ideia de um sistema federal, pois irão considerar que é uma etapa, até se conseguir a independência. É uma utopia".

Referindo-se ainda a Espanha, o escritor defendeu o regime de monarquia constitucional, e afirmou que "a monarquia tem uma razão de ser em Espanha e desempenhou um papel fundamental", nomeadamente quando da tentativa de golpe de Estado, em fevereiro de 1981, e na transição do regime autoritário de Francisco Franco, em 1975-1976.

"As monarquias constitucionais na Europa são onde as democracias funcionam melhor", afirmou e citou a Noruega, Suécia, Dinamarca e Grã-Bretanha, que são "democracias muito avançadas e muito modernas".

"A monarquia tem um figurino decorativo, mas garante estabilidade e tem um papel em Espanha", asseverou.

Questionado sobre as relações entre a América Latina e Portugal, defendeu que "podiam ser mais intensas e fortes" e que "a Europa se devia aproximar mais" do continente, que "é democrático, tem uma economia de mercado e regista um crescimento económico".

"Não só Portugal, mas também Espanha, que apesar de ter aumentado a sua presença, podia e devia ser maior, dos dois países, aliás", rematou.

Questionado sobre a situação no Médio Oriente, o escritor afirmou que "é um conflito de nunca acabar", e defendeu a "resolução do problema de base, que é a criação de ambos os Estados".

Llosa considerou que "há uma forte intransigência de Israel" e apelou a que "a comunidade internacional seja mais enérgica, nomeadamente os Estados Unidos, que têm uma forte ascensão" sobre o Estado judaico.

Sobre a sua experiência política, quando se candidatou à Presidência da República do Peru, em 1990, afirmou que ficou com "uma má recordação".

"Aprendi que não sou político, foi uma experiência positiva para conhecer um país e é muito diferente a política vista de uma biblioteca, da que se vive nas ruas, quando se faz campanha, nomeadamente as condições especiais que o Peru vivia naquele momento, [em que estava em guerra]".

O escritor, que afirmou que "tem mais projetos do que possibilidade de os vir a escrever, por muitos anos de vida que tenha", terminou recentemente uma obra para teatro, "Los Cuentos de la Peste", que "são vagamente inspirados no 'Decamaron', de Bocaccio, e que será estreada em Madrid pelo Teatro Nacional Espanhol".

Sobre a atual literatura peruana, afirmou que "estão a surgir muitos homens e mulheres" e destacou Jeremías Gamboa, e o seu romance, "Contarlo todo", editado no ano pasado, que é "um retrato da nova sociedade peruana, da emergente clase média indígena".

"Um livro ambicioso sobre a nova sociedade peruana, e que reflete toda essa mudança social que se tem notado", acrescentou.

Natural de Arequipa, no Peru, Vargas Llosa obteve a nacionalidade espanhola em março de 1993, sem nunca renunciar à peruana, como destaca o Instituto Cervantes, e foi feito marquês pelo rei Juan Carlos de Espanha, em fevereiro de 2011.

"Conversa na catedral", "As guerras do fim do mundo", "A tia Júlia e o escrevedor", "A sociedade do espetáculo", "O sonho celta" são alguns dos títulos do escritor, editados em Portugal.

 

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