Para a presidente da Fundação Construir Pontes para o Futuro (BBF, na sigla inglesa), Sara Henderson, uma das maiores falhas na reconstrução de Aceh foi a não entrega dos fundos doados que estavam destinados aos ex-combatentes do Movimento Aceh Livre (GAM, na sigla indonésia).
Os efeitos devastadores do maremoto de 2004, que fez mais de 226 mil mortos numa dezena de países banhados pelo Oceano Índico, motivaram o fim de um conflito armado de 29 anos, marcado pela perda de 15 mil vidas e por vários episódios de tortura.
O GAM desistiu de lutar pela independência de Aceh em troca de uma autonomia especial e de mais fundos vindos de Jacarta, para além de ajudas aos ex-independentistas.
"Em Aceh Oriental, há pelo menos 100 ex-combatentes do GAM que declararam guerra contra o atual governador [Zaini Abdullah]. Estão armados e há mais a juntarem-se [ao grupo] diariamente", advertiu a presidente da BBF, entidade que continua a apoiar a população da província no terreno.
Segundo Sara Henderson, os ex-combatentes desejam o que lhes foi prometido no acordo que ditou a autonomia especial de Aceh -- "distribuição de terra e formação para a sustentabilidade".
A norte-americana aposentada, que criou a fundação BBF após ver a devastação provocada pelo tsunami de 26 de dezembro de 2004, advertiu igualmente que em Aceh Central "os cidadãos indígenas querem autonomia", porque "dizem que não são tratados de forma justa", e "muitos deles estão igualmente armados".
A responsável da BBF teme que, se estas queixas não forem ouvidas, surjam focos de violência em toda a província e o exército seja novamente convocado a "neutralizar as ameaças".
"O malfadado acordo de paz direcionou fundos e posições de poder para certos líderes do ex-GAM", que "lucraram com a reconstrução de alguma forma" e deixaram de fora grande parte dos combatentes, referiu.
Numa comunicação escrita a pedido do antigo presidente norte-americano, Bill Clinton, em 2012, Sara Henderson explicou que os números de ex-combatentes variam "aproximadamente entre 3.000 e 21.000", mas o acordo de paz apenas referia 3.000 "por muitas razões", entre elas o receio de entregar todas as armas.
A norte-americana entende que um futuro conflito poderá ser "GAM contra GAM", visto que milhares de combatentes esperavam que os líderes que chegaram a posições de poder ajudassem os restantes elementos do grupo, enquanto os governantes locais dizem ter cumprido o acordo.
No documento enviado a Bill Clinton, a presidente da BBF advertiu que os ex-combatentes "estendem-se pela província como uma teia, ganhando dinheiro ao cultivar marijuana, extraindo ilegalmente madeira de florestas protegidas e, por vezes, cometendo roubos e tiroteios".
Em alguns casos, estes lutadores são "muito bem respeitados nas comunidades em que vivem" e até encarados como "modelos" por jovens de aldeias remotas com poucas oportunidades, adiantou.