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Bombardeamentos atingiam áreas civis e ninguém se importava

Fevzi Haculi esperou três dias junto à fronteira com a Turquia à espera de autorização para entrar, enquanto a sua cidade natal, Aleppo, sofria intensos bombardeamentos em que as vítimas eram os civis, mas ninguém se importava.

Bombardeamentos atingiam áreas civis e ninguém se importava
Notícias ao Minuto

09:55 - 30/12/14 por Lusa

Mundo Refugiados

"Ficámos na fronteira sem documentos à espera da nossa vez, até nos darem permissão. Estávamos a fugir dos bombardeamentos, que não se importavam em atingir civis", disse à agência Lusa o sírio, pai de 11 filhos, três dos quais continuam a lutar na guerra contra o regime de Bashar al-Assad.

Estávamos em fevereiro de 2013 e Aleppo era então o principal teatro de operações da guerra entre os rebeldes e as forças governamentais. Haculi, de 65 anos, e os oito filhos fugiram a pé até chegar a Akçakale, cidade fronteiriça na Turquia, ao mesmo tempo que a força aérea síria bombardeava alvos civis.

"Mas ninguém se parecia importar", afirma, revivendo novamente o que foram três dias "de angústia e frio".

Aleppo, cidade do norte da Síria, e segunda maior do país, com mais de cinco milhões de habitantes, é considerada Património da Humanidade.

Localizada na encruzilhada das rotas comerciais entre o Mediterrâneo e o Oriente, a cidade prosperou desde o terceiro milénio antes de Cristo.

Em 2012, os rebeldes contra o regime de al-Assad invadiram e ocuparam a zona comercial.

Haculi desde que conseguiu um abrigo no campo de refugiados em Harran, a 20 quilómetros de Akçakale, ocupa os dias a oferecer aulas de pintura e artes num dos contentores do campo.

Estudou Belas Artes na universidade em Aleppo e resolveu montar um atelier para os compatriotas sírios com aulas de pinturas e exposição de quadros. Segundo ele, esta é uma forma de relembrar os bons momentos na sua terra natal e sonhar com um futuro melhor.

"Se tivesse condições físicas para lutar, eu estaria na guerra. Quero que os meus filhos lutem por mim. Não queremos deixar o nosso país para esse poder que domina tudo. Somos donos dessa terra, estamos a lutar contra quem nos quer roubar essa terra", argumenta Haculi.

O artista passa grande parte do dia no atellier. Harran é o campo de refugiado mais moderno na Turquia com estruturas de contentores, enquanto muitos outros apenas albergam tendas.

Este foi o último a ser construído em 2012 e leva o nome da cidade mais próxima que está localizada a 30 quilómetros e começou a receber sírios de língua árabe em 2012.

Segundo a autoridade do campo, Helit Çoban, há dois mil contentores que albergam 14 mil sírios.

"Já estamos na capacidade máxima. Desde março de 2012 não aceitamos mais nenhuma família nova. O campo tem escolas até à secundária e creches para acolher todas as crianças, as aulas são dadas em árabe", explicou Çoban.

O campo é dividido em pequenos bairros com nomes que fazem alusão à paz, irmandade e fraternidade. Além de servirem para habitação, alguns contentores acolhem as duas mesquitas existentes. Os sírios árabes são maioritariamente muçulmanos.

Visto do lado de fora, o campo parece uma prisão, mas os portões de Harran estão sempre abertos 24 horas para as famílias circularem e inclusive saírem. A comunidade de sírios tenta reproduzir a vida na Síria como se fosse um pequeno vilarejo.

Entre as obras que já pintou Haculi mostra a mais recente, em que retrata a vista da casa onde morava em Aleppo.

"Essa é a última imagem que lembro da minha rua. É o que guardo na memória. Infelizmente, a cidade foi destruída, não sobrou nada, nenhuma casa. Vamos ter que reconstruí-la quando a guerra acabar. Sei que essa imagem que pintei não existe mais, mas tenho esperança de um dia voltar", ressalva.

Desde março de 2011, a Síria mergulhou numa guerra civil depois de uma pacífica revolta contra quatro décadas de governo da família Assad.

A revolta culminou em uma insurreição armada depois do o exército ter reagido com força repressiva contra os tumultos.

Segundo o Observatório Sírio dos Direitos Humanos, o conflito já provocou pelo menos 200.000 mortos em quatro anos e destruiu a infraestrutura do país gerando uma grave crise humanitária na região.

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