Começando por recordar que Portugal pediu ajuda externa em Abril de 2011, o professor João César das Neves elogia hoje, num artigo de opinião intitulado ‘Austeridade à lusitana’ e publicado no DN, a flexibilidade e adaptação dos portugueses, e, por outro lado, critica os que defendem os “direitos adquiridos, favores, ‘cunhas’ e redes de influência”.
“Quase inaudito é que, apesar da pressão financeira sobre as famílias, a sua taxa de poupança tenha aumentado mais do que duplicado, do mínimo de 5,6% do rendimento disponível em 2008 para 13% a meio deste ano. É verdade que estes e outros indicadores resultam dos custos da terrível recessão; mas outros países com ajustamentos semelhantes não conseguiram resultados tão rápidos”, destaca João César das Neves.
Ainda assim, contesta, “os portugueses, mesmo em terrível emergência, insistem em defender interesses e privilégios através de entranhados mecanismos sociais e políticos”, tais como, prossegue, “direitos adquiridos, favores, ‘cunhas’, redes de influência”.
Na opinião de César das Neves, esta luta pelos interesses particulares resulta “a dois níveis”. “O primeiro é o protesto, reivindicação e bloqueio legislativo e judicial às medidas de ajustamento” apesar, refere, “das evidentes dificuldades nacionais, alguns grupos acham-se com direito a manter benesses que a sociedade evidentemente não consegue pagar” tais como “funcionários, médicos, professores, pensionistas, autarquias, precisamente os mais favorecidos nos anos de fartura.”
E “as forças políticas vão à boleia do embuste, capitalizando no descontentamento e contribuindo para a desigualdade nacional”, critica César das Neves, afirmando que “os desempregados, empresas falidas, imigrantes, contribuintes, são realmente os mais afectados pela crise” e os que “acabam sempre sacrificados e usados como figura de retórica para preservar benesses de outros.”
O segundo nível, “talvez mais grave”, prende-se com o facto de “as empresas e poderes económicos próximos do Estado, que têm distorcido o ajustamento a seu favor”. “Muitas grandes empresas conseguem proteger-se graças a relações políticas. Através de rendas, apoios e influências, os bancos, construtoras, comunicações, energia, outros serviços básicos e alguns grupos económicos mantêm artificialmente negócios e investimentos insustentáveis”, escreve o professor, referindo-se ao que designa de “capitalismo de compadres”.
Neste sentido, deixa o aviso: “Aqueles que hoje bloqueiam as reformas em defesa de interesses particulares arriscam a ruína nacional, que os destruirá a eles e a todos, como repetidamente tem mostrado a nossa história.”