Formados para sair e não olhar para trás

“Não existia qualquer perspetiva de ficar”. Milhares de portugueses viram-se obrigados a virar costas ao país rumo a uma estabilidade financeira, e também emocional, que em terras lusas não iriam tão cedo conseguir. A emigração não fazia parte do memorando de entendimento mas acabou por ser uma das principais e mais graves consequências destes três últimos anos.

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Daniela Costa Teixeira, Mariana Ferreira Delgado e Pedro Pina
13/05/2014 14:00 ‧ 13/05/2014 por Daniela Costa Teixeira, Mariana Ferreira Delgado e Pedro Pina

País

Emigrantes

O número de portugueses que rumou ao estrangeiro subiu de forma exponencial nos últimos anos. Se em 2010, revelam os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), cerca de 24 mil portugueses tinham abandonado o país, em 2011, altura em que a troika aterrou pela primeira vez em território nacional, eram já mais de 43 mil.

2012 foi o ano da ‘fuga’ e mais de 121.418 portugueses procuraram novas oportunidades noutros países. A tendência de saída fez-se notar ainda no ano passado e, embora não existam ainda números oficiais, o Observatório da Emigração avança que só para o Reino Unido terão rumado 30.121 portugueses (5% do total de emigrantes a entrar em terras de Sua Majestade). Segue-se a Alemanha, com 11.401 portugueses e o Brasil, com 2.913.

Por precaução ou necessidade, os jovens despediram-se dos pais, fizeram as malas e partiram. À geração ‘nem-nem’ juntou-se a geração ‘foge enquanto podes’. E foi isso que a geração mais qualificada de sempre fez, mas sem (poder) olhar para trás.  A fuga dos cérebros começou.

Quando sair não é a alternativa, mas a melhor opção

Suíça, Espanha, Alemanha e Luxemburgo assumem-se também como destinos de eleição. Mas há quem vá mais além: Soraia Torres Lage e Bárbara Silva rumaram ao Dubai. Estas duas jovens, 25 e 23 anos respetivamente, são licenciadas em Comunicação e viram na Emirates Airlines a oportunidade de lutar por um futuro melhor.

Nenhuma saiu por necessidade financeira, nem por falta de emprego, embora confessem que nem sempre o seu trabalho “era bem pago”. Bárbara, de Vila Nova de Gaia e licenciada no ISMAI, diz que a companhia aérea oferece “oportunidades incríveis de subir na carreira”, nomeadamente, em “departamentos de jornalismo e comunicação”. Oportunidades vistas também por Soraia como um dos motivos para rumar a esta aventura aérea. Para a jovem de Lisboa, atualmente em Londres, a empresa proporcionou-lhe “um emprego estável, com um contrato fixo de três anos”, condições que “muito dificilmente” iria encontrar em Portugal.

“Podia ter ficado em Portugal a trabalhar com um ordenado de menos de 800 euros ou podia até ter ficado a ganhar mais experiência em estágios não-remunerados, mas por motivos financeiros e por acreditar que isso apenas piora a situação do nosso país, sendo uma forma de compactuar com o sistema de emprego atual, decidi sair e crescer”, disse a estudante lisboeta, licenciada na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova.

Já com sorte diferente, Gonçalo Vasques Borga, de 26 anos, viu a emigração como escape ao desemprego que se arrastava há seis meses. O ex-aluno do ISCSP apostou mesmo em outras áreas que não a da sua formação. “Cheguei a trabalhar em atividades agrícolas durante o inverno para ter algum rendimento”.

Agora na Irlanda, este jovem sempre esteve “aberto a sair do país”, mas confidencia que pensa em regressar, embora não para já. “Teria que ter garantias de que me conseguiria sustentar por mim próprio, algo que consegui no estrangeiro e nunca tinha tido hipótese em Portugal”, diz.

O fado dos enfermeiros

A área da enfermagem foi uma das mais lesadas com esta vaga de emigração. Milhares de enfermeiros recém-licenciados apenas conseguiram dar início à vida profissional fora de Portugal. O Bastonário da Ordem dos Enfermeiros, Germano Couto, avançou no início deste ano que 90% dos recém-licenciados na área manifestaram a intenção de deixar Portugal.

Cláudia Dias é enfermeira e está em Inglaterra há dois anos. Na altura, não saiu por necessidade, mas sim por desejar “ter uma experiência de vida e trabalho no estrangeiro”, mesmo estando com um contrato sem termo em Portugal. Contudo, “os cortes de ordenado, a suspensão dos subsídios de férias e Natal” começaram a notar-se antes de abandonar o país.

Embora assuma que é em Portugal que quer “assentar e criar raízes”, Cláudia não prevê um regresso a curto prazo. Opinião partilhada por Bárbara e Soraia, que não têm em mente o regresso para breve. Todavia, a jovem lisboeta admite que pretende voltar e criar um “próprio negócio”.

‘Manda-te!’, disse ele

Se em 2011 Pedro Passos Coelho aconselhou os jovens a emigrar porque “a emigração não pode ser um estigma” e, se “não encontram emprego em Portugal, devem procurar oportunidades lá fora”, o site Manda-te.com junta o útil ao agradável. Criada há um ano, esta plataforma dá a conhecer várias propostas de emprego e de formação em Portugal e também no estrangeiro.

Com cerca de três milhões de visitantes únicos, o ‘Manda-te’ publica “conteúdos nas áreas da motivação, liderança, gestão de carreiras, empreendedorismo como forma de cumprir o objetivo de promover a valorização pessoal e profissional e de ajudar as pessoas a desenvolverem competências úteis para o mercado de trabalho”, como refere ao Notícias Ao Minuto, Filipe Amorim, criador do projeto.

Um dos principais objetivos deste site passa por “abanar um pouco o status quo”, numa altura em que, defende Filipe Amorim, em Portugal “muitas pessoas não conseguem encontrar a forma de se enquadrarem num mercado de trabalho mais globalizado e cada vez mais difícil e competitivo”.

Embora a emigração jovem seja a tendência, Filipe Amorim acredita que “já não existe um perfil único das pessoas que querem emigrar”. Para o fundador do Manda-te “existe o perfil do jovem licenciado e qualificado que, por não encontrar oportunidades no mercado interno, procura sair do país, como existe igualmente o perfil do trabalhador pouco qualificado que pode ter 30 ou 40 anos, e que apesar de ter variada experiência de trabalho, deixou de encontrar emprego em Portugal”.

Se a oferta em Portugal se apresenta escassa, a área das Tecnologias de Informação “assume um papel preponderante nas ofertas disponíveis” no estrangeiro. “Dependendo do país a área da Construção e Engenharia também se assume importante”, conclui.

 

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