“O que tenho a dizer é muito desagradável, mas tenho de o dizer: estas imputações são falsas, todas elas. Não há neste documento um pingo de verdade. E lamento que o Ministério Público não se interesse pela descoberta da verdade, mas que esteja mais concentrado na perseguição”.
Terá começado assim o último interrogatório de Rosário Teixeira, Procurador-geral da República, a José Sócrates, conforme é descrito pela revista Sábado. Este encontro terá tido lugar em Lisboa, a 27 de maio.
De acordo com as transcrições reveladas pela revista, todas as transações entre o ex-primeiro-ministro e o procurador são pautadas pelo mesmo tom, o de acusação - no âmbito da investigação e fora dele.
Sócrates acusou, depois, Rosário Teixeira de insulto porque a acusação de corrupção, nas palavras do socialista, acontece “só por ter um contrato com uma farmacêutica”, algo que o procurador nega de imediato.
“Não, não admito, porque tenho a melhor das ideias do Carlos Santos Silva”
Rosário Teixeira prossegue e levanta suspeitas sobre as operações que envolveram a compra de uma quinta em Sintra, que pertencera a Duarte Lima. O procurador refere as passagens de propriedade para um primo de Sócrates, depois para o grupo Lena.
“E, portanto, como era do meu primo, é meu. Pronto, é assim que os senhores fazem imputações. Epá, parabéns”, atira Sócrates prontamente, com ironia. O procurador ainda tentou, de acordo com a revista, conseguir explicações mas o ex-governante tomava tudo como um insulto, desviando a questão para a falta de acusação.
“Não é altura de metermos a mão na consciência, senhor procurador?”, questionou, referindo-se ao facto de terem decorrido seis meses sem uma acusação formal.
O procurador continuava, no entanto, a questionar e inquiriu sobre uns terrenos em Vale do Lobo e Angola, pertencentes a um primo de Sócrates. “Pergunte-lhe a ele, não o posso ajudar”, respondeu o socialista.
José Sócrates insistia em pedir contas à investigação. “Como é que o senhor se atreve a fazer-me imputações de corrupção em casas da Venezuela, concessões rodoviárias, TGV, Parque Escolar e, agora, o aeroporto? Se tem algum elemento, faça o favor de me apresentar”, atirava.
Rosário Teixeira respondeu com uma pergunta: “Admite que alguma vez o senhor Carlos Santos Silva tenha pedido contrapartidas à Lena invocando o seu nome?”. Sócrates responde que não. “Não, não admito, porque tenho a melhor das ideias do Carlos Santos Silva”, indicou.
“Não vá por aí, não vá por aí, pá”
O resto da conversa continua num tom muito crispado, dizendo o socialista que a acusação limita-se a “escrever corrupção e pronto”. Sócrates faz mais acusações aos procuradores e à “perseguição” de que diz ser alvo.
“Desculpe, eu não estou a ofendê-lo, estou a criticá-lo (…). O sr. Procurador não pode ser assim uma virgem vestal a quem não se pode dirigir uma crítica”, diz Sócrates, quando Rosário Teixeira se diz ofendido com as acusações.
A conversa termina com questões sobre viagens de fim de ano a Veneza, que Sócrates recebeu por dois anos seguidos quando era primeiro-ministro e cujas faturas foram alteradas. O socialista diz que não se lembra dos detalhes.
“Se me tivessem oferecido um fim de ano em Veneza, com certeza eu lembrar-me-ia de quem é que ofereceu. Por isso mesmo é que lhe foi feita a pergunta”, diz Rosário Teixeira. “Não vá por aí, não vá por aí, pá”, responde José Sócrates.
[Notícia atualizada às 16h04]