"Desde ontem (sexta-feira) estão sempre a cair as casas", sublinha, considerando prematuro começar qualquer levantamento de prejuízos porque muitas outras vão cair.
Habitações feitas de material tradicional, 'tijolo burro' (barro local) e cobertas de palha, não aguentaram a força do vento, com rajadas que chegaram aos 200 quilómetros por hora, e à chuva torrencial, equivalente a várias semanas, concentrada em poucas horas.
Há entulho e marcas de destruição no bairro de Napapare, uma aldeia de Meconta, colada à capital provincial.
Filomena Gassi serviu de pilar e segurou com as mãos durante toda a madrugada a ponta do teto da sua casa, para salvar os filhos e a mãe, após uma parede ceder.
"A casa caiu, pouco a pouco" e Filomena disse à Lusa que só saiu da posição em que estava quando as crianças ficaram a salvo.
"Depois fugimos e o resto da casa caiu", quando já era manhã de sexta-feira, contou a mulher, vista como uma heroína numa aldeia com centenas de casas transformadas em entulho que cobre a pouca farinha de mandioca que restava para o sustento da família.
"Eu não tenho casa, não tenho comida, estou mal", lamenta a camponesa que é atingida pela segunda vez com um temporal este ano, após a passagem da depressão tropical Ana, em janeiro.
Ao virar da esquina, Awa Amade caminha sobre bambus e palha retorcida que já foi cobertura da sua casa.
"O vento e chuva, vinha tudo com muita força", explica à Lusa, restando-lhe "dormir junto de vizinhos" também desalojados, com "alimentação limitada".
Avelo Bolacha assiste a tudo, tenta ajudar no que pode e arrisca dizer que não há casa que tenha uma parede intacta após a passagem do ciclone Gombe, que arrastou pontes, derrubou cajueiros - maior fonte de receita das famílias locais - e deitou abaixo campos inteiros de milho.
Acena com a cabeça em sinal de dor, numa pausa da missão de tentar salvar as paredes que se mantém de pé.
A estrada de argila que liga Corrane à cidade de Nampula está cortada em vários locais.
Há troncos atravessados, derrubados pelo vento, e pequenas pontes arrastadas pela chuva, testemunhos de uma noite de susto.
Anastácio Viagem, secretário de bairro em Corrane, disse à Lusa que a invasão das águas pelas hortas adentro vai degradar a já frágil segurança alimentar das famílias, que recorriam a farinha de mandioca para se alimentar.
"As machambas (campos agrícolas) foram destruídas pela corrente e agora não podemos ir dar assistência aos campos porque também foram invadidos" pelo rio Mutomote, que dividiu os bairros de Corrane.
A Organização Internacional das Migrações (OIM) estima que haja 115.000 pessoas afetadas e o balanço provisório das autoridades nacionais dá conta de 11 mortes, mas falta chegar a vários distritos costeiros que permanecem inacessíveis.
Apesar de o ciclone ter perdido intensidade, continua a provocar chuva intensa e mantém-se o alerta para uma possível subida de caudal dos rios do norte e centro de Moçambique, nomeadamente o rio Licungo.
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