Quadro de Pomar "não faz sentido" ser classificado Património Cultural
Os proprietários de 'O almoço do trolha', de Júlio Pomar, disseram à Lusa que, "enquanto o quadro estiver na Coleção Manuel de Brito, não faz sentido" a sua classificação pelo Património Cultural.
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O quadro 'O almoço do trolha' não está à venda, encontra-se preservado nas reservas da galeria, numa situação de todo diferente da prevista na lei para classificação como bem de "interesse público", prevista para casos de exportação, com dano para o património.
"Enquanto o quadro estiver na Coleção Manuel de Brito, não faz sentido para nós essa classificação", disse o galerista Rui de Brito, contactado pela agência Lusa, na sequência do arquivamento do processo de classificação da pintura pela Direção-Geral do Património Cultural (DGPC), publicado na segunda-feira, em Diário da República, "por falta de consentimento do proprietário da obra".
De acordo com a lei, os bens móveis pertencentes a particulares são passíveis de classificação como de interesse público, sempre que sejam de "elevado apreço" e, em simultâneo, corram risco de "exportação definitiva do território nacional", com possibilidade de dano grave para o património cultural.
Em declarações ao jornal Público, hoje, Rui de Brito também afastou a intenção de vender a obra para o estrangeiro, como motivo para discordar da classificação, apontando antes as "burocracias" impostas por esse estatuto.
"A classificação até pode reforçar a importância da pintura, mas esta fica sujeita a peritagens e relatórios, e se, por exemplo, a quiser mudar de sítio, tenho de pedir autorização", disse o responsável da Galeria 111 ao Público.
Em 2015, quando foi anunciada a venda do quadro em leilão, o Palácio do Correio Velho recebeu uma notificação da DGPC, dando conta da abertura do processo de classificação e da possibilidade do exercício do direito de preferência na compra.
Esse direito, porém, não foi exercido, porque, como a DGPC então indicou, "não foi possível reunir a verba para adquirir o quadro".
O processo porém prosseguiu e, em julho do ano passado, um anúncio publicado em Diário da República dava a conhecer a intenção de a DGPC propor, ao ministro da Cultura, a classificação da pintura de Júlio Pomar, que morreu em maio deste ano.
O quadro é considerado um ícone do movimento neorrealista português. Foi exposto ainda inacabado, em 1947, na segunda Exposição Geral de Artes Plásticas da Sociedade Nacional de Belas Artes, enquanto Júlio Pomar, então com 21 anos, se encontrava preso em Caxias. O quadro só seria terminado em 1950.
Com 150 centímetros por 120, mostra um operário, que segura uma tijela de comida, junto à mulher e ao filho.
O quadro foi adquirido pelo colecionador Manuel Torres, na década de 1950, e foi a sua família que o levou a leilão, em 2015.
O colecionador foi um dos sócios fundadores da Gravura -- Sociedade Cooperativa de Gravadores Portugueses, por onde passaram dezenas de artistas, como Júlio Pomar, e que se afirmou como uma das principais divulgadoras da arte moderna e contemporânea em Portugal.
"O almoço do trolha" foi vendido em leilão, no dia 27 de maio de 2015, em Lisboa, por 350 mil euros, tendo sido adquirido pelos herdeiros do galerista Manuel de Brito, fundador da Galeria 111, em Lisboa, amigo de Júlio Pomar e admirador da sua obra.
Na altura do leilão, antes ainda de conhecidos os novos proprietários, o pintor disse à Lusa que, "naturalmente", "gostaria que a obra ficasse num museu e pudesse ser vista pelo público", pois tinha marcado "um determinado momento do país".
Júlio Pomar recordou então que, quando pintou a obra, passava todos os dias por ruas onde havia obras de construção, e os trolhas faziam uma pausa para comer na rua, junto à mulher que lhes levava o almoço.
"Tive uma vontade forte de pintar [essa cena]. Portugal era aquilo, muita pobreza", disse.
Depois da venda, o quadro já esteve em exposição no CAMB - Centro de Arte de Manuel de Brito, em 2016, e no Atelier - Museu Júlio Pomar, no ano passado. Neste momento encontra-se nas reservas da galeria, "disponível para ser mostrado sempre que se justifique", indicou Rui Brito, à Lusa.
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