Fernando Rosas: "Lusotropicalismo" é um conceito que perdura em Portugal
O historiador Fernando Rosas, que lança este mês o livro 'Salazar e os Fascismos', considera que o lusotropicalismo é um dos aspetos do Estado Novo que ainda se mantém na política portuguesa, apesar da instauração da democracia.
© Reinaldo Rodrigues/Global Imagens
Cultura Historiador
"A representação do lusotropicalismo perdura na sociedade portuguesa atual. O discurso legitimador do colonialismo português apresentando-o como um colonialismo bondoso e tolerante perdura e está muito presente nos discursos oficiais", disse à Lusa o historiador.
Fernando Rosas sublinha que o lusotropicalismo sendo o aspeto mais perdurável da ideologia do Estado Novo nem sequer é um conceito que tenha existido desde o princípio no colonialismo do anterior regime, mas acaba por manter-se ao longo das décadas.
Até ao princípio dos anos 1950 a doutrina colonial predominante, refere, era a superioridade do homem branco, o darwinismo social, a raça superior, branca e as raças inferiores, os negros e, "portanto, o colonialismo era legitimado em nome de uma raça que trazia a civilização e a fé às raças inferiores".
Com o final da II Guerra Mundial (1939-1945) as circunstâncias mudaram devido ao início do período da descolonização, das independências e dos movimentos de libertação.
No livro, o historiador aborda a importação pelo Estado Novo das ideias do sociólogo brasileiro Gilberto Freire que defendiam que os portugueses teriam um "jeito especial" e um colonialismo diferente e uma forma de se "misturarem" dando origem a sociedades mestiças.
"Essa ideia do colonialismo bondoso e amigo dos africanos ficou e manteve-se como uma espécie de doutrina oficiosa do Estado português, em democracia", frisa Fernando Rosas sublinhando que a realidade é a situação oposta.
"O colonialismo português foi nas suas relações com o africano violento, racista, recorreu ao trabalho forçado, às culturas obrigatórias, ao estatuto dos indígenas, tal como o colonialismo francês, inglês ou belga. Não há grandes diferenças. Pode haver diferenças do ponto de vista administrativo, mas do ponto de vista doutrinário as diferenças não são nenhumas", conclui o historiador.
Na obra "Salazar e os Fascismos" o historiador estuda a origem do fascismo do século XX como uma resposta à crise do capitalismo e que sai "das entranhas" do sistema liberal.
Trata-se de uma resposta de certos setores da classe dominante em aliança com o "fascismo plebeu" face à crise do sistema, sobretudo no período entre a Grande Guerra (1914-1918) e a II Guerra Mundial e, sobretudo, nos países periféricos.
Em países como Portugal, Espanha, Itália existe menos margem de manobra e menos acumulação de capital e em que se verifica o recurso a meios extremos "para se acabar" com a movimentação sindical operária, para se acabar com o sistema político partidário e o parlamentarismo e para uma interferência ativa na economia.
"Nesse sentido, acabar com a agitação social, o parlamentarismo, o pluripartidarismo e intervenção na economia de forma a instaurar a forma de acumulação e de lucro orientam a criação desses regimes. É a aliança de um fascismo das classes dominantes com um fascismo 'plebeu', pequeno-burguês que nessa mesma aliança vê a forma de chegar ao poder", afirma o historiador que aprofunda igualmente o regime nazi e as ligações entre os vários países europeus marcados pelo fascismo, incluindo o Estado Novo, em Portugal.
O livro 'Salazar e os Fascismos' de Fernando Rosas (Tinta da China, 305 páginas) vai ser apresentado no próximo dia 22 de abril, em Lisboa.
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