No inicio da cerimónia, José Manuel Mendes, presidente da direção da Associação Portuguesa de Escritores (APE), destacou que estas seis personalidades -- um arquiteto, um jornalista, um cantor, um ensaísta, um historiador e um ator -- foram escolhidos em Assembleia Geral por unanimidade dos sócios.
"Foram escolhidos pelo que sabemos ser a vida pública, a obra singular e marcante da vida de cada um deles e pela proximidade connosco, unidos pela arte", acrescentou.
Esta distinção insere-se na política da APE de "assumir uma intervenção cultural em domínios diversos, não confinada a qualquer visão estrita da literatura".
"A APE é um lugar onde a literatura não está separada das outras áreas da cultura", explicou José Manuel Mendes, destacando sobretudo a relevância de Eduardo Lourenço.
"Ele não gostaria de ser considerado uma unanimidade universal" mas foi uma "figura única no panorama português, não só o filósofo, mas aquele que pensou Portugal, na vida pública, política, literária, [na] história e [na] antropologia", destacou, seguido de uma sonora ovação pelos presentes.
As palavras foram acolhidas pela irmã do ensaísta, ausente da cerimónia por razões de saúde, tal como o historiador José-Augusto França, que teve em sua representação um amigo.
O local escolhido para a cerimónia de homenagem foi o restaurante "As velhas", em Lisboa, onde se reuniram cerca de 30 pessoas, entre homenageados, amigos e convidados, e onde, em ambiente de tertúlia, se trocaram ideias, partilharam memórias e se ouviu tocar Suítes para violoncelo solo, de Johann Sebastian Bach, pelo violoncelista Ricardo Mota.
Apesar de se terem distinguido em áreas culturais diferentes, todos os homenageados estão "unidos pela palavra, a palavra tocada pela arte", justificou o presidente da APE.
"Nas palavras nos encontramos todos: na voz inconfundível de Carlos do Carmo, na obra de ficcionista e historiador de José-Augusto França, na palavra escrita de António Valdemar, que não gosta que se diga que é escritor, mas sim jornalista, na de Rui Mendes, aquele que deu lume às palavras que pôde interpretar e interpretou".
Eduardo Lourenço leu Portugal e "marcou-nos a todos" com essa leitura, enquanto Álvaro Siza Vieira é autor de obra de "uma precisão, de um rigor, que está muito perto da elaboração literária do escritor", acrescentou.
Pegando na deixa, o arquiteto enfatizou essa relação com a literatura: "Vejo rigor, perfeição, exigência".
"O que mais me impressiona e estimula [na literatura] é esse rigor, enquanto o que acontece na arquitetura é fruto de um grande trabalho. Na poesia, esse rigor é ainda maior: cada palavra tem de estar no sítio certo, no momento certo e entre eles tem de haver um ritmo", considerou Siza Vieira.
Para o secretário-geral da APE, Luís Machado, a cerimónia de homenagem àqueles "seis nomes maiores da cultura portuguesa" foi um "momento memorável, um momento sublime e de alta elevação".
"E não foi por acaso a escolha do espaço [restaurante 'As velhas'], uma referência do património histórico-cultural de Lisboa, que foi, no passado mês de maio, com 95 anos de existência, classificada como Loja com História".
Luís Machado aproveitou o momento para contar precisamente um pouco da história daquele restaurante de mesas corridas, fundado por duas sexagenárias, que o batizaram como "As velhas", e herdeiro da Carvoaria da Glória.
Neste regresso ao passado, o secretário-geral da APE recordou algumas efemérides que marcaram o ano da fundação do restaurante, como a prisão de Alves dos Reis, acusado de falsificar notas de 500 escudos, a inauguração do Cinema-Teatro Tivoli, os recitais de Guilhermina Suggia, o nascimento de Carlos Paredes, o fim da publicação da revista Athena, dirigida por Fernando Pessoa, e a presença de Manoel de Oliveira nos clubes Bristol e Maxim's.
Entre peixinhos da horta e bacalhau no forno, mousse de chocolate e melão, café e Porto de Honra, servidos sob comando do casal Guadalupe e José Gonçalves, os homenageados foram dizendo algumas palavras: Carlos do Carmo recordou uma história em que a violoncelista Guilhermina Suggia se espantou com uma oferta que lhe fora feita reagindo com a expressão "esse dinheiro todo para tocar rabecão?", Rui Mendes leu o poema "Morte ao meio-dia", de Ruy Belo, e António Valdemar emocionou-se ao agradecer publicamente a presença no almoço do filho do seu único amigo ainda vivo, dos Açores.
A tertúlia terminou com um brinde e com a entrega dos cartões e diplomas que oficializaram o título de sócios honorários aos seis homenageados.