Obra sobre António Ferro é apresentada na quinta-feira
Um livro da historiadora Margarida Acciaiuoli, sobre a atividade do escritor e jornalista António Ferro como primeiro diretor de um departamento de propaganda da ditadura do Estado Novo (1933-1974), é apresentado em Lisboa.
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A obra, "António Ferro -- a vertigem da palavra", é apresentada na quinta-feira, às 18:30, no Padrão dos Descobrimentos, em Belém, pelo sociólogo Manuel Villaverde Cabral e pelo historiador e escritor José Sasportes.
Margarida Acciaiuoli afirma na obra, editada pela Bizâncio, que Ferro "convenceu" o presidente do Conselho de Ministros, António de Oliveira Salazar, de que "o povo precisava de espetáculo" e mostrou-lhe "que tinha um programa para várias temporadas".
António Ferro, que fizera parte do grupo de intelectuais do Orpheu, na década de 1910, "jogou o seu futuro político" nas entrevistas que, em 1932, fez a Oliveira Salazar, e que foram anunciadas pelo Diário de Notícias, que as publicou, como "o maior inquérito que se tem feito sobre a figura e obra política de um homem público em Portugal".
Numa das entrevistas passeia de automóvel com Salazar por Lisboa e os seus arredores, onde se faz notar as obras públicas do novo regime, imposto após o golpe de Estado de maio de 1926.
Ferro conseguira a série de entrevistas com Salazar, após publicar um livro, que lhe "deu notoriedade", sobre as ditaduras europeias da época.
O jornalista era já um "animador da cena nacional", escreve Acciaiuoli, tendo publicado uma peça de teatro, "conhecia o poder do palco e sabia como utilizá-lo".
Em setembro de 1933 foi criado o Secretariado de Propaganda Nacional (SPN), com ação interna e externa, sendo nomeado seu diretor António Ferro.
António Ferro ao dirigir o SPN "durante 15 anos fez do país um teatro e assumiu o papel de encenador", escreve Margarida Acciaiuoli, que refere as diversas exposições organizadas, prémios literários e artísticos que criou, filmes que foram financiados, a criação da companhia de bailado Verde Gaio, do Museu do Povo, e a organização de exposições no estrangeiro, entre outras iniciativas.
Ferro pensou no turismo e "preocupou-se com o aspeto das ruas, lançou concursos de montras, promoveu a decoração de estações de comboios e de apeadeiros, incentivou o melhoramento de hotéis e restaurantes, colaborou no programa de pousadas (...) e pôs em marcha uma campanha que tenderia a generalizar o bom gosto".
Todavia, a historiadora considera que, com o fim da II Guerra Mundial, em 1945, se "verifica que, apesar da animação a que se assistia, o país não mudara" e este livro reflete sobre "esta contradição".
A autora sublinha que, ao longo da investigação, teve em atenção as convicções de António Ferro "e à importância que este dava às palavras".
O subtítulo da obra é "Retórica, política e propaganda no Estado Novo" e, na introdução, Margarida Acciaiuoli escreve que a forma como Ferro ascendeu a diretor do SPN, mais tarde batizado SNI (Secretariado Nacional de Informação, Cultura Popular e Turismo), não "deixa de ser uma ilustração do modo como se faz um político e da maneira como se justificam certas políticas".
Sublinhando que a realidade passada nada tem "a ver com as realidades de hoje", a historiadora afirma que a pergunta sobre o que define um político continua atual, e dá como exemplo a expressão "interesse nacional", tantas vezes utilizada pelos políticos em todos os tempos, que se "torna num instrumento de dominação e de fácil legitimação de procedimentos".
A expressão, por si, é "inevitavelmente vaga e maleável quanto ao seu conteúdo", conclui.
A autora afirma que "muitos políticos, por isso, chegam à ribalta sem necessidade de terem uma vocação que os determine ou uma causa pela qual se batam" e o resultado "foi que ditadores e colaboradores depressa se transformaram em atores que representavam papéis sem qualquer limitação nos excessos que cometiam ou nas jogadas que faziam". Mesmo nesta conjuntura, António Ferro (1895-1956) é "um caso singular".
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