Morreu Manuel Amado, o pintor da "perceção do invisível"

O pintor Manuel Amado morreu hoje, em Lisboa, aos 81 anos, vítima de cancro, disse à Lusa fonte da família.

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Lusa
14/10/2019 19:59 ‧ 14/10/2019 por Lusa

Cultura

Óbito

Nascido em Lisboa, em 1938, formado em arquitetura, foi no entanto a pintura que o moveu desde muito cedo, e à qual se dedicou em exclusivo desde 1987, num exercício de "perceção do invisível", como a Casa das Histórias Paula Rego definiu o seu percurso.

"É como se ele pintasse para erradicar um fantasma, algo que nunca conseguirá fazer", disse Paula Rego, quando fez a curadoria de uma retrospetiva do artista, em 2016.

Autor de 'Quarto Interior', que faz parte da Coleção Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, e do tríptico da Casa Fernando Pessoa, em Lisboa, Manuel Amado fez o curso do liceu no Colégio Moderno, período durante o qual se dedicou ao teatro. Iniciou-se na pintura em 1956, e concluiu arquitetura, em 1965.

Em 1975, participou pela primeira vez numa exposição coletiva, na Sociedade Nacional de Belas Artes, a que se sucedeu uma outra, na antiga Galeria Ottolini, em Lisboa, organizada por Mário Cesariny e Cruzeiro Seixas.

Em 1978, a convite de Cruzeiro Seixas, fez a sua primeira exposição individual, a que se seguiu nova mostra em nome próprio, no início da década de 1980, na Galeria São Mamede, em Lisboa, e, depois, na Cooperativa Árvore, no Porto.

Desde então, expôs com regularidade em Portugal e no estrangeiro, destacando-se a presença no Smithsonian, em Washington, na ARCO Madrid, na Galeria Anne Berthoud, em Londres, na Mouvances, em Paris, na China Art Gallery, em Pequim, na Fundação Telefónica, em Madrid, que acolheu a sua primeira retrospetiva, em 1994, e na Fundação Calouste Gulbenkian, na capital francesa, onde levou "A Grande Cheia", em 2001.

Executou diversos cenários em colaboração com diferentes grupos de teatro, entre os quais o Teatro Universitário de Lisboa, o Teatro da Malaposta e o Grupo 4/Teatro Aberto.

Manteve uma regular colaboração com a Manufactura de Tapeçarias de Portalegre, a partir da década de 1990.

A sua obra está representada em diversas coleções públicas e privadas, como Fundação Calouste Gulbenkian, Fundação das Descobertas (Centro Cultural de Belém), Fundação Millennium BCP, Fundação Oriente, Fundação EDP, Fundação Portugal Telecom, Fundação Cupertino de Miranda, Casa Museu Fernando Pessoa, Fundação Berardo e, no estrangeiro, na Fundação Jacqueline Vodoz e Bruno Danese (Itália), e na Fundação António Perez Museu de Arte Contemporânea (Espanha).

Em maio de 2016, a Casa das Histórias Paula Rego, em Cascais, acolheu a sua exposição "O Verão era assim como uma casa de morar onde todas as coisas estão...", uma das mais importantes na recente carreira do artista, retrospetiva com curadoria da própria pintora Paula Rego, com a coordenadora da Casa das Histórias, Catarina Alfaro.

Os quadros de Manuel Amado "possuem todos uma simplicidade ameaçadora", disse então Paula Rego sobre a obra do pintor, durante o trabalho de seleção dos quadros para a mostra, como recorda a Casa das Histórias, na página dedicada ao artista.

E prossegue a instituição: "Não há dúvida de que a obra de Manuel Amado se constrói a partir de um mistério que é, à partida, simples: as coisas normais vêem-se sobre um ângulo diferente, e por isso os modos de conceção da subjetividade na apreensão do mundo podem tornar-se a verdadeira fonte do enigma. Cada uma destas pinturas será, então, um exercício de perceção do invisível no visível da obra".

"As suas ligações afetivas aos espaços que habitou, e que são reveladas através da memória, não fotográfica, mas uma memória reconfigurada que contém ressonâncias que derivam do passado e do presente, do momento em que esses espaços estão a ser relembrados pelo artista", traduzem então essas "forças invisíveis" da pintura de Manuel Amado, segundo a Casa das Histórias.

"Em Manuel Amado o silêncio faz-se palavra pela celebração da luz. Vai mais longe: confere vida à cidade com a discretíssima insinuação de poesia e de segredo, que paira nesse mundo deserto de personagens", escreveu José Cardoso Pires (1925-1998), no catálogo de umas primeiras exposições individuais de Manuel Amado, na Galeria de São Mamede.

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