A medida foi defendida perante os deputados durante uma audiência na Comissão de Cultura e Comunicação, na Assembleia da República, em Lisboa, efetuada para apresentação das preocupações da plataforma no quadro da discussão do novo Orçamento do Estado para 2020.
"Não existe um serviço público de Cultura. É uma grande lacuna na nossa democracia", criticou Alexandra Lourenço, presidente da Associação Portuguesa de Bibliotecários, Arquivistas e Documentalistas (BAD), um dos membros da plataforma que estiveram presentes na audiência.
A responsável fez questão de esclarecer que a Plataforma Cultura em Luta foi criada em 2015 já com o propósito de representar todos os setores da Cultura, e não exclusivamente o setor das artes, "que habitualmente recebe mais atenção mediática".
"É preciso investir na preservação e na gestão do património, arquivos, bibliotecas, museus, cinema, e até no financiamento das entidades dependentes do Ministério da Cultura, que estão também suborçamentadas", sustentou Alexandra Lourenço, acrescentando que a situação atual "não cumpre as necessidades básicas" das áreas da Cultura.
Na terça-feira, mais de 300 artistas estiveram concentrados em frente ao Teatro Nacional de São Carlos, em Lisboa, para exigir um valor imediato de 1% do Orçamento do Estado (OE) para a Cultura, em 2020, numa iniciativa convocada pela Plataforma Cultura em Luta.
O protesto envolveu mais de uma dezena de sindicatos e estruturas que representam artistas, arqueólogos, documentalistas, trabalhadores de museus, entre outros da área da cultura, que vieram exigir um reforço do financiamento de uma área que consideram "o parente pobre" no Governo.
Os responsáveis da plataforma apresentaram ainda, no parlamento, várias questões relacionadas com o valor que têm defendido há vários anos de 1% do OE para a Cultura, e pediram esclarecimentos sobre o valor que o atual Governo tem vindo a anunciar de 2% da despesa como meta para cumprir de forma progressiva, ao longo dos quatro anos da legislatura.
"Estamos particularmente confusos, este ano, sobre estes valores. A mensagem do Governo não tem sido clara", comentou a responsável.
Retomando esta questão do financiamento para a cultura, Hugo Barros, do CENA-STE (Sindicato dos Trabalhadores de Espetáculos, do Audiovisual e dos Músicos), reiterou a exigência feita na terça-feira, no protesto, de 1% imediato do OE para a Cultura, "já que a UNESCO recomenda 1% do PIB, o que seria o equivalente a 2,5% do OE, mas atualmente situa-se em 0,3%", lamentou.
Sobre os apoios às artes, que a plataforma considera insuficientes, Hugo Barros chamou a atenção da necessidade para "aumentar o financiamento a estruturas artísticas que têm um lugar fundamental no tecido cultural".
"Já não são questões pontuais. Há gerações de artistas que estão a viver em precariedade no país", disse, chamando a atenção para a notícia da morte do ator José Lopes, de 61 anos, cujo corpo terá sido encontrado numa tenda, onde vivia, junto à linha de Sintra, e onde, alegadamente, terá morrido sozinho e na miséria.
Todos os grupos parlamentares na audiência lamentaram, com pesar, a morte do artista.
A plataforma voltou a repetir o que disse à Lusa na terça-feira, no protesto, que não está a pedir a demissão da ministra da Cultura, Graça Fonseca, mas sim uma mudança de políticas culturais no Governo: "O que está em causa são políticas e não pessoas".
Aquela estrutura defende um "sistema misto de apoio às artes, já que - sustentam - certas estruturas, como orquestras e companhias de teatro, "devem ter apoio permanente porque têm trabalho constante, não deveriam ser sujeitas a concursos".
"Mas muitas delas são microestruturas, que sempre que há uma crise desaparecem, e com eles um património artístico importante para o país", sustentam.
Sobre os apoios aos artistas, Rosário Gambôa, do PS, disse subscrever o reforço do OE na Cultura, que considerou "insuficiente", mas, relativamente aos concursos, disse que "nem todos podem ser distinguidos e a verba nunca será suficiente, no entanto, o Governo tem feito um esforço" para reforçar.
Em relação ao modelo de apoio às artes, lembrou que "vai ser melhorado": "É complexo, e é preciso aperfeiçoar".
Do lado do PSD, a deputada Carla Borges disse que este modelo de apoio às artes "é uma falácia e é ineficaz", e que "o diálogo agora anunciado [pelo Ministério da Cultura] devia ter sido mantido sempre".
"Para nós não basta colocar valores financeiros em cima da mesa. É preciso definir como serão distribuídos", defendeu.
Por seu turno, a deputada bloquista Beatriz Gomes Dias manifestou preocupação do partido relativamente aos problemas suscitados pela falta de apoios financeiros às artes, pela situação reiterada, que surge todos os anos e afeta as estruturas, em particular no interior do país.
Ana Mesquita, do PCP, recordou que o partido já apresentou, em anteriores orçamentos, várias propostas no sentido do aumento do valor para a Cultura em 1% do OE, e "a necessidade urgente de um Plano Nacional de Desenvolvimento para as Artes e a Cultura, de forma a criar um verdadeiro serviço público para a Cultura".
Defendeu também a "reposição da justiça nos concursos bienais", em particular para as estruturas elegíveis que ficaram de fora, e o reforço de verbas para a Direção-Geral do Património Cultural.
Disse ainda que a proposta do Governo no OE de 2% da despesa discricionária "é coisa nenhuma".