Setor alerta para risco de subfinanciamento do ICA

A isenção prevista de aplicação de taxas aos operadores dos serviços audiovisuais a pedido, no âmbito da transposição da diretiva europeia, constitui risco de subfinanciamento e de esvaziamento orçamental do Instituto do Cinema e Audiovisual, segundo agentes do setor.

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Lusa
03/09/2020 16:56 ‧ 03/09/2020 por Lusa

Cultura

Cinema

O alerta foi deixado hoje durante a audição de associações de profissionais do cinema e do audiovisual, na comissão parlamentar de Cultura e Comunicação, onde decorre a discussão na especialidade da transposição da diretiva europeia de 2018, que tem como objetivo regulamentar, entre os Estados-membros, a atividade dos serviços de televisão e dos serviços audiovisuais a pedido, conhecidos como VOD ('video on demand'), como as plataformas Neflix, HBO e Amazon.

Para a Plataforma do Cinema, que congrega 13 entidades do setor, esta lei não consegue precaver "o esvaziamento orçamental" do Instituto do Cinema e do Audiovisual (ICA), "pelas duas vias em que é atualmente financiado e que sustentam o financiamento da produção cinematográfica em Portugal": as taxas anuais pagas pelos operadores de televisão por subscrição, ou televisão por cabo, e as taxas de exibição de publicidade nos canais tradicionais.

O realizador João Nicolau, presente na audição pela Plataforma do Cinema, recordou que as receitas destes operadores estão a ceder à "passagem da audiência para as plataformas de serviços audiovisuais a pedido, e não é expectável que recuperem, dada a migração de serviços para a internet".

Ao mesmo tempo, "e tal como a proposta de lei reconhece, assim como o ICA, a publicidade nos meios tradicionais está a cair e a proposta de lei isenta - não sabemos se por lapso se por vontade legislativa - a publicidade nas plataformas de partilhas de vídeo, que gera atualmente muito dinheiro", acrescentou João Nicolau, que a considerou "uma desastrosa opção política".

O produtor Luís Urbano, dos Produtores de Cinema Independente Associados, alertou igualmente para estes fatores, recordando que a tendência de migração para a Internet é uma realidade e que, "se a questão não for resolvida agora", alargando também a taxa de subscrição a serviços de internet e de dados, terá de o ser "daqui por três ou quatro anos".

Para o produtor, devia ser aproveitada "a oportunidade para corrigir esta distorção e para não retirar vantagem competitiva às televisões, que veem a sua principal fonte de receita migrar para estas plataformas, onde a publicidade é mais barata por não estar sujeita a taxas".

Na quarta-feira, durante a audição na comissão parlamentar, o ICA também propôs o alargamento da taxa de exibição de publicidade a plataformas de partilha de vídeos.

A proposta de lei, apresentada pelo Governo para a transposição da diretiva, privilegia o investimento na produção, pela parte de plataformas de 'streaming', em vez da aplicação de taxas, mas a maioria das associações presentes na audição defenderam em particular um sistema combinado, de taxas e investimento, como acontece em França. Foi também dado o exemplo alemão, exclusivamente assente na aplicação de taxas pagas ao congénere do ICA.

A secretária-geral da Associação de Produtores Independentes de Televisão, Susana Gato, considerou que o sistema combinado seria o ideal, mas mostrou-se satisfeita com a perspetiva de investimento na produção, uma vez que, até agora, na prática, tinham apenas três clientes, os três operadores portugueses.

Posição similar foi defendida pela Associação de Produtores de Cinema e Audiovisual, através de Pandora da Cunha Telles, que alertou para a importância da inclusão da taxação de dados.

O produtor Luís Urbano levantou igualmente a questão da dimensão e natureza das plataformas de vídeo a pedido.

"Um operador como Netflix tem de ser tratado como um operador produtor, que produz as suas próprias obras, que vai difundir". Assim, prosseguiu, "as obrigações de investimento podem levar a distorções que, se não forem bem reguladas", podem levar para fora, o que uma grande plataforma está obrigada a investir em Portugal.

Os profissionais alertaram também para a necessidade de estabelecimento de uma fiscalização eficaz para o cumprimento da lei, que ficará a cargo da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) e do ICA.

Susana Gato frisou a importância da ERC a premência de esta entidade "ter vontade de ser autoridade".

Luís Urbano sublinhou que o ICA, como regulador e suporte da política para o setor, tem de ter viabilidade financeira garantida a longo prazo.

Nos aspetos positivos da proposta de lei, os profissionais destacaram a passagem dos custos de funcionamento do ICA para as receitas gerais do Estado, e o alargamento da taxa de exibição de publicidade aos serviços de televisão que emitem para Portugal, fora do território.

A proteção dos menores e dos direitos do consumidor e um sistema de infrações e coimas "verdadeiramente desencorajador do incumprimento" foram outros fatores positivos.

Na audição de hoje, foram ouvidos representantes da Plataforma do Cinema, da Associação de Produtores de Cinema e Audiovisual, da Associação de Realizadores de Cinema e Audiovisuais, da Associação de Produtores Independentes de Televisão, da Associação Portuguesa de Realizadores e Argumentistas de Ficção e dos Produtores de Cinema Independente Associados.

A Plataforma do Cinema reúne agências como a Portugal Film e da Agência da Curta Metragem, a Portuguesa de Realizadores, o Sindicato dos Músicos, dos Trabalhadores do Espectáculo e do Audiovisual (Cena-STE), os festivais Curtas Vila do Conde, Doclisboa, IndieLisboa, Monstra, Queer Lisboa e Porto/Post/Doc e o Sindicato Nacional dos Trabalhadores das Telecomunicações e Audiovisual.

Na página da Comissão de Cultura e Comunicação estão disponíveis os pareceres de todas estas entidades, sobre a proposta de lei.

A discussão incide sobre a apreciação na especialidade da proposta de lei n.º 44/XIV/1.ª, que altera as leis do cinema e da televisão, em vigor, e que transpõe a Diretiva 2018/1808, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de novembro de 2018.

 

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