Retrospetiva de Menez dá a conhecer quatro décadas da obra da artista
Uma exposição retrospetiva dedicada à pintora Menez (1926--1995), que dá a conhecer quatro décadas da obra da artista, com uma seleção de 29 obras, é inaugurada na quinta-feira, no Museu Casa das Histórias Paula Rego, em Cascais.
© Lusa
Cultura Cascais
'Menez' dá título a esta mostra sobre a "obra enigmática" de uma artista que nunca dava título aos seus quadros, nem gostava de falar do seu trabalho, concedendo raras entrevistas, porque acreditava que a pintura tinha de falar por si, sem recorrer a palavras ou explicações.
Comissariada por Catarina Alfaro, curadora e coordenadora do núcleo de programação e conservação da Casa das Histórias Paula Rego, a exposição é iniciativa da Fundação D. Luís I e da Câmara Municipal de Cascais, no âmbito da programação do Bairro dos Museus, e poderá ser visitada até 02 de outubro.
Naquele museu estará disposta a seleção de trabalhos de Maria Inês da Silva Carmona Ribeiro da Fonseca - conhecida artisticamente por Menez - que transitam do abstracionismo ao figurativismo.
Nascida em Lisboa, a artista portuguesa viveu em várias cidades do mundo, como Buenos Aires, Estocolmo, Paris e Roma, mas, antes, e apenas com dois anos, foi viver com a família na Suíça, onde cumpriu a maior parte do seu percurso escolar, regressando a Portugal aos vinte anos, ao que se seguiria uma estada de dois anos em Washington, nos Estados Unidos.
Começou a pintar ainda na infância, mas foi aos 26 anos que elegeu a pintura como a sua ocupação regular. Sem formação académica na área, a sua prática foi fruto da aptidão para a expressão artística, estimulada pelo contacto com as artes visuais nas numerosas viagens que realizou.
Como todo o artista autodidata, Menez aprendeu enquanto pintava, mas a sua obra, como sublinha a curadoria da exposição, não é exclusivamente dedicada à pintura, abrangendo trabalhos em desenho, gravura, azulejo e tapeçaria.
"A receção positiva da sua obra pela crítica especializada e pelo público é confirmada pelas frequentes exposições individuais e coletivas que apresentou desde a década de 1950, e pela presença das suas obras em coleções de relevo, tanto institucionais portuguesas, quanto privadas", recorda um texto divulgado pela organização da mostra.
A curadora aponta ainda que "a originalidade e o difícil enquadramento estilístico da pintura [de Menez] muito se devem à sua compreensão desta disciplina como um processo de afirmação pessoal, capaz de transmitir a sua visão do mundo".
Os seus primeiros trabalhos, um conjunto de guaches apresentado em exposição na Galeria de Março, em Lisboa, em 1954, e cujo catálogo continha um texto de Sofia de Mello Breyner Andresen, "já evidenciavam a sua preferência por composições que privilegiam a luz como elemento determinante na construção espacial -- executadas a partir de um jogo de ocultação e revelação entre interior e exterior, entre abstração e figuração -- valores que permanecerão e definirão a sua obra".
Na época, o historiador de arte e crítico Rui Mário Gonçalves afirmaria que "a luz e a sensualidade cromática permanecem as qualidades essenciais desta pintora de notável intuição".
As obras que produziria nas décadas seguintes, e após a sua passagem por Londres na década de 1960, revelariam uma artista que voltada para a exploração visual da representação figurativa entre formas abstratas, num "exercício de fantasia formal" que culminaria numa "ambiguidade inusitada e que imprime às suas obras um intricado e denso volume cromático".
Esta exposição também apresenta obras realizadas a partir dos anos de 1980, fase em que a artista transpõe para a tela representações de ambientes cenográficos internos, como ateliers, onde habitam, num isolamento dramático, as suas figuras femininas.
Nalgumas dessas obras, a pintora parece autorretratar-se, "numa encenação do ato de pintar onde ela própria é o objeto da pintura", observa ainda a curadora Catarina Alfaro.
Acrescenta igualmente que o seu modo de "pintar a pintura" foi criando ambientes "estranhamente familiares" dos ateliers que retratava, quase sempre abertos para espaços externos, como jardins, ou para vistas do Tejo, evocando "uma atmosfera onírica e revelando uma interioridade que é íntima, particular, cuidadosamente modelada através da luz, da cor e dos reflexos".
Numa das suas raras entrevistas, Menez afirmou: "O figurativo tem a ver com uma coisa íntima, minha".
Desde 2019, a Casa das Histórias Paula Rego iniciou um novo ciclo de exposições com o objetivo de apresentar a obra de artistas cujas trajetórias se tenham cruzado com a de Paula Rego.
Menez foi bolseira da Fundação Calouste Gulbenkian em Portugal em 1960, e também em Londres, nos anos 1964--65 e 1969, altura em que se tornou amiga da pintora Paula Rego e do marido -- cuja casa frequentava regularmente -, e de outras personalidades como os artistas Mário Cesariny e João Vieira.
A exposição será acompanhada por um catálogo bilíngue, em português e inglês, com textos sobre o percurso da artista e com reproduções a cores de todas as obras expostas.
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