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"Pais que leem aos filhos desde os primeiros anos estão a criar leitores"

Entrevista à escritora Maria Teresa Maia Gonzalez, no âmbito do Dia da Criança e do lançamento da 17.ª edição de 'O Guarda da Praia', que há mais de 20 anos faz parte do universo infanto-juvenil.

"Pais que leem aos filhos desde os primeiros anos estão a criar leitores"

Os livros de Maria Teresa Maia Gonzalez têm a particularidade de poderem ser lidos tanto pelos jovens como pelos pais. 'A Lua de Joana', assim como 'O Guarda da Praia', são apenas dois dos 183 livros de sucesso desta autora portuguesa, que já ganhou diversos prémios.

Da sua obra constam sobretudo romances juvenis, mas também histórias infantis, fábulas poesia e até uma coleção juvenil de peças de teatro, que tratam de temas, geralmente, relacionados com os direitos das crianças e dos adolescentes, a espiritualidade e os problemas da adolescência, nomeadamente a solidão, as perdas, a depressão, os conflitos familiares, as dependências químicas, a violência em meio escolar, a violência doméstica, a sexualidade e a afetividade.

No passado mês de maio, 'O Guarda da Praia', recomendado para o 5.º ano de escolaridade (crianças entre os 10 e os 11 anos) foi editado novamente, pela 17.ª vez. O livro conta a história de uma escritora solitária e "cheia de certezas" que vai para uma casa isolada, junto à praia, para escrever o seu próximo romance. Ali conhece um rapaz, com quem desenvolve uma amizade improvável, mostrando de uma maneira simples (e cativante) que tudo na vida é efémero e a importância de dar valor a cada momento vivido.

Em entrevista ao Notícias ao Minuto, a também professora de línguas, falou do sucesso deste livro, uma boa sugestão para oferta do Dia da Criança, que se comemora este sábado, 1 de junho, assim como da necessidade de continuar a incentivar a leitura junto dos mais jovens.

A mensagem mais importante, contudo, é a da falta de atenção, uma vez que, como ficou claro no livro 'A Lua de Joana', "a falta de atenção causa vítimas".

O Livro 'O Guarda da Praia' vai na sua 17.ª edição. Qual foi a receita de sucesso que seguiu para escrever este livro?

Em primeiro lugar, devo lembrar que 'seguir receitas' é próprio de cozinheiros. Penso que, nos tempos que correm, a gastronomia foi levada a um extremo de sofisticação e popularidade (bem mais do que a literatura), ao ponto de haver vários canais televisivos apenas a ela dedicados… Escrevo sem me preocupar com 'sucesso', que é sempre relativo e efémero. Quem não aprendeu isto ainda não fez a travessia dessa turbulência a que chamamos adolescência. Cada um nasce com determinados dons que tem a responsabilidade de desenvolver e colocar ao serviço da humanidade. Se o fizer, terá cumprido o seu dever, ainda que sem 'sucesso'. Teresa de Calcutá dizia que Deus não lhe pedia sucesso; apenas fidelidade ao seu amor. É nisto que creio.

Tal como a 'Lua de Joana', este é um romance juvenil muitas vezes recomendado nas escolas e aos pais para darem aos filhos. Apesar de terem passado cerca de 20 anos do (primeiro) lançamento, estes dois livros continuam a ser muito atuais. Porquê?

Julgo que um livro que fale da condição humana – seus problemas, limitações, dramas, alegrias, derrotas e conquistas – é atual. Os seres humanos vão tendo novos desafios, mas, no essencial, continuam a ser seres de relação, que precisam, acima de tudo, de se sentir aceites e amados e, por outro lado, de descobrir quem são e como podem pôr o que são ao serviço dos outros. O que são 20 anos para um livro? Se pensarmos, por exemplo, em 'Os Lusíadas', 'Dom Quixote de la Mancha', vemos que há livros que atravessam séculos, porque continuam a dar fruto. No entanto, também esses, um dia, deixarão de ser lidos. 'Tudo passa', ensina-nos a Sagrada Escritura. Ter consciência disto ajuda-nos a ter uma perspetiva real da nossa pequenez.

O que sente que preocupa mais os jovens hoje em dia? São os meus problemas que os preocupava há 20 anos?

Camões dizia que ao mudarem-se os tempos também se mudam as vontades. Será assim, mas não em todos os aspetos do nosso viver. Há algumas vontades que resistem às mudanças dos tempos: a de sermos respeitados, acolhidos, tratados com justiça, amados... Os jovens de hoje (como os de sempre) vivem realidades diversas. As famílias são diferentes umas das outras, como o são também os valores espirituais, morais, culturais… Há jovens preocupados com questões familiares complexas e profundamente dolorosas para eles; há os que vivem complexados com a sua imagem, os que se sentem oprimidos pela violência em meio escolar, os que não têm meios financeiros para comprar roupas, telemóveis, computadores que certos colegas possuem, os que se sentem vítimas de discriminação, os que têm grandes dificuldades de aprendizagem, os que sentem que a sua opinião nunca é tida em conta, os que nem sequer têm famílias que possam proporcionar-lhes uma alimentação adequada… E há também problemas 'novos', por exemplo os que se relacionam com a perseguição nas redes sociais. Se estivermos atentos, conseguimos identificar estas situações e poderemos agir, como devemos. Faço-o, sobretudo, através da escrita, que é o meu meio.

Achas que as novas tecnologias, o acesso fácil e rápido à internet, veio afetar o gosto pela leitura dos mais novos? Ou ainda vale a pena escrever livros para as crianças/jovens?

Se achasse que não valeria a pena escrever para os mais novos, não o faria. Claro que vale a pena! Mesmo que um determinado livro venha a ter apenas poucos leitores. Um livro lido deixa sempre uma semente lançada no solo fértil de um coração. Essa semente tem sempre mais hipóteses do que aquela que ninguém lançou…

O que podem os pais (e as escolas) fazer para contribuir para um maior gosto das crianças pela leitura?

Sei, por experiência própria, que os pais que leem/contam histórias aos filhos desde os seus primeiros anos de vida estão a criar leitores. Foi isso que os meus pais fizeram comigo e com os meus irmãos. Os professores que aconselham leituras, falam de livros, organizam bibliotecas de turma e feiras do livro, promovem concursos literários, convidam escritores para irem às escolas (entre outras atividades) contribuem – e muito! – para a divulgação e a promoção do livro e da leitura. Estou-lhes muito grata.

Neste Dia da Criança, que estamos prestes a celebrar, que mensagem gostaria de deixar aos mais jovens?

Aos mais jovens, as mensagens que quero transmitir estão nos livros que para eles escrevo. Aos pais e outros educadores gostaria de lembrar isto: vivemos numa era de desatenção. Não adianta responsabilizar os telemóveis ou os computadores. A falta de atenção causa vítimas (algumas, mortais, como penso ter deixado claro no livro 'A Lua de Joana').

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