Nélson Monte aterrou, na noite deste sábado, no Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, depois de deixar a Ucrânia. O único jogador português a alinhar no futebol ucraniano, ao serviço do Dnipro, estava a tentar sair do país desde quinta-feira, mas apenas este sábado conseguiu chegar à Roménia, viajar até à Áustria e apanhar um voo com destino a Portugal.
"Nem consigo dizer nada, sinceramente. Foi muito difícil aqui chegar. Foram dois ou três dias muito complicados. Agora quero desfrutar com os miúdos e a minha mulher. Há que sofrer e ser duro. Aquilo que fiz foi obter a máxima informação e ontem fazer mais estrada para sair dali o mais rapidamente. A situação está mesmo muito feia. O que mais queria era sair do país. Agradeço às pessoas que me ajudaram. O Estado de Portugal esteve sempre em contacto comigo e a Embaixada também. Quero também agradecer ao Sindicato dos Jogadores e à FPF, bem como à Câmara Municipal de Vila do Conde", começou por dizer Nélson Monte, aos jornalistas, visivelmente emocionado, prosseguindo.
"Foram dias muito complicados. A partir do primeiro bombardeamento tive um sentimento de medo. Só quando hoje passei a fronteira para a Roménia é que alivei um bocado a tensão que sentia. É de loucos. Quando acordei com o bombardeamento... Nós, os estrangeiros que viviam em Dnipro, fugimos para o centro de estágios do clube e a informação que nos deram é que era para irmos para Lviv. Ouvi duas bombas e depois rebentou outra e tivemos que nos esconder num bunker no centro de estágio", explicou, detalhando o percurso dos últimos dias.
"Foi horrível. Pelo GPS dava uma estimativa de 13 horas e meia e o que é certo é que conduzi durante quase 25 horas. Havia estradas cortadas. Tivemos que andar no meio do mato. É um desespero. A meio do caminho recebemos a informação que Lviv estava a ser evacuada e depois alterámos a rota para a fronteira com a Roménia", afirmou Nélson Monte.
"Se eram russos ou ucranianos não sei. Passámos por alguns check-points para mostrar passaportes e fazerem revista de carros. Era um momento de tensão enorme. Eram armas por todo o lado. Quando estava no hotel, fui à janela e estava um tanque à porta. Ainda com mais medo fiquei. Só pensava nos meus filhos, na minha mulher e na minha família. Ainda hoje foi muito complicado para passar a fronteira. Estava uma fila inacreditável para fugir do país. O que eu fiz foi deixar o carro a 10 quilómetros da fronteira e fazer o resto do percurso a pé para passar. Mas o problema é que quando chego à fronteira só estavam a deixar passar as mulheres e as crianças. E não nos davam a justificação por que razão os estrangeiros não podiam. Os ucranianos são obrigados a ficar dentro do país. Só diziam mulheres e crianças. Foi dos piores momentos. Assisti a muita coisa", sublinhou.
"O despero dos ucranianos é inacreditável. Só queriam fugir e nem sabem para onde ir. Eu não sei se vai haver futebol tão cedo na Ucrânia. O meu pensamento era só voltar a Portugal para estar junto da minha família e pensar no futuro. Eu estou bem, mas claro que vi muita coisa que me vai marcar para o resto da minha vida. Houve dois momentos... Quando as duas bombas explodiram, eu corri para a garagem à procura do meu carro e vi várias famílias com crianças e com as malas. Era assustador. E depois, na fronteira, a quantidade de ucranianos que ficaram horas na fronteira para tentar passar, mas quando era a vez deles não podiam. O que eles faziam? As mulheres e os filhos foram e eles ficaram", lamentou.
Recorde-se que o defesa central atravessou de carro, nos últimos dias, quase toda a Ucrânia, tendo chegado à fronteira com Roménia na madrugada de sábado. Acabaria, horas mais tarde, por apanhar um voo de Iasi para Viena, na Áustria, antes de chegar, por fim, a Lisboa.
Família e Sindicato dos Jogadores presentes
A família de Nélson Monte estava à espera do jogador português no Aeroporto, bem como vários membros do Sindicato dos Jogadores, como o presidente Joaquim Evangelista.
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