O Comité Executivo da UEFA aprovou, no passado dia 7 de abril, os novos regulamentos de “Licenciamento de Clubes e Sustentabilidade Financeira”, os quais entrarão em vigor em junho de 2022, ainda que de forma gradual. Desde a sua implementação inicial em 2010, esta é a primeira grande reforma dos regulamentos financeiros da UEFA, a qual procura a tão desejável sustentabilidade financeira dos clubes europeus, não obstante o enorme grau de dificuldade de que se reveste, nomeadamente, entre outros, para os clubes portugueses, atendendo a que as suas finanças muito dependem das ditas receitas extraordinárias.
Num quadro mais rigoroso e assíduo, a Confederação Europeia de futebol promoverá um conjunto de avaliações quadrimestrais, numa clara manifestação de preocupação e monitorização de possíveis incumprimentos contratuais de clubes para com outros clubes, jogadores, treinadores, funcionários e, inclusivamente autoridades estatais, já para não mencionar incumprimentos de natureza regulamentar perante a própria UEFA.
Na verdade, à panóplia de regras já existentes, estes regulamentos vieram introduzir o conceito de “net equity rule”, segundo o qual, o património líquido de um clube deverá apresentar resultados positivos à data de 31 de dezembro da época desportiva anterior àquela para qual a licença UEFA é solicitada ou, em alternativa, que o referido património tenha registado uma evolução positiva de, pelo menos, 10%, relativamente a 31 de dezembro do ano transato. Outra novidade igualmente relevante, a “football earnings rule”, consiste numa versão aprimorada da “break-even rule”, que basicamente assenta na diferença entre receitas e despesas. Ainda assim, no caso do agregado de “football earnings” de um determinado clube se apresentar deficitário ao longo de um período de 3 anos, ser-lhe-á ainda assim permitido apresentar um défice até 5 milhões de Euros, valor que poderá mesmo ascender a um máximo de 60 milhões de Euros em casos verdadeiramente excecionais.
Perante a política despesista a que muitos clubes europeus nos têm habituado ao longo das últimas décadas, envolvendo verbas verdadeiramente obscenas a título de transferências, mas também ao nível das folhas salariais, quase sempre desfasada de uma realidade social que se pretende sã, a UEFA veio instituir uma nova regra de ouro, a “squad cost rule”. Esta regra vem limitar custos relacionados com transferências de jogadores, respetivos salários e custos com intermediários, a um máximo de 70% do valor das receitas, estando previstas, em caso de incumprimento, sanções não só de natureza financeira, como também disciplinar, a serem aplicadas pelo Comité de Controlo Financeiro de Clubes da UEFA.
Olhando para o nosso panorama nacional e certos de que os principais colossos do futebol mundial poderão contornar, com a mestria financeira que lhes é largamente reconhecida, estas novas exigências regulamentares, resta preparamo-nos para esta nova realidade que se avizinha. E o mais rapidamente possível, sob pena de nos tornarmos ainda menos competitivos a nível internacional. É que, sem exceção, os clubes portugueses têm necessitado, época após época, de transferir jogadores, gerando receitas ora classificadas de extraordinárias e que, portanto, não contam para efeitos dos referidos 70%.
Ora, longe da capacidade financeira ostentada por parte dos clubes estrangeiros Europeus, nomeadamente daqueles que compõem as cinco principais Ligas, tanto ao nível das receitas provenientes da alienação dos direitos de transmissão televisiva, como da bilhética ou do merchandising, mas igualmente ao nível dos valores que conseguem angariar com contratos de patrocínio, tudo consequência direta da dimensão dos respetivos mercados, as sociedades desportivas portuguesas estão cada vez mais forçadas a mudar o seu (ultrapassado) paradigma de gestão. Salvo melhor opinião, julgo ser seguro afirmar que a sobrevivência da maioria das sociedades desportivas portuguesas, depende, a curto/médio-prazo, de tal mudança.
Em face desta nova realidade que se avizinha, aparte de um scouting mais exigente, nomeadamente, em mercados periféricos, resta-nos uma ainda maior aposta na formação, que resulte num aproveitamento efetivo dos valores oriundos das camadas jovens, tudo isto em detrimento do talento estrangeiro já consagrado. Estratégia essa que até já se encontra parcialmente sustentada pelos recentes sucessos das equipas jovens portuguesas em competições internacionais, olhando para os exemplos do FC Porto e do SL Benfica, ambos já vencedores da UEFA Youth League, inclusivamente tendo este último alcançado outras 3 finais da competição. Acrescem, ainda, os exemplos de sucesso desportivo que proliferam nas camadas jovens da nossa Seleção Nacional, representativos de talentos não só formados pelos ditos grandes clubes, mas por tantos outros que para isso contribuíram desde tenras idades.
Acima de tudo, parece-me inegável que este tipo de alterações regulamentares a que ora assistimos, promovidas pelos organismos internacionais do futebol (Nota: Relembro as novas regras quanto aos limites de empréstimos de jogadores, recentemente introduzidas pela FIFA e que entrarão em vigor já a partir da próxima época), surgem com o propósito de se alcançar, com a maior brevidade possível, uma real sustentabilidade do futebol, enquanto desporto, espetáculo e negócio.