Sérgio Paulo Marceneiro Conceição foi, é e será um nome incontornável na história do FC Porto. Já depois de ter sido jogador dos azuis e brancos, por duas ocasiões, a referência do futebol português acabou por aceitar o desafio de Pinto da Costa, em 2017, para liderar os destinos dos dragões, numa ligação que durou sete épocas ininterruptas e terminou, na passada segunda-feira, após muitos recordes alcançados... e ainda alguma polémica.
Os números falam por si e dão conta de um registo digno de ser comparado às célebres '7 Maravilhas'. Com o estatuto de treinador com mais jogos realizados (379), as 274 vitórias (72,3%) - com 53 empates e 52 derrotas - e os 812 golos marcados - contra 307 tentos sofridos - valeram ainda um número capicua de 11 troféus. Em todas as épocas, conseguiu conquistar, pelo menos, um título.
Aliás, todos estes valores fizeram com que Sérgio Conceição abandonasse o comando técnico do FC Porto como sendo ainda o treinador mais vitorioso e mais titulado da história do emblema da cidade Invicta. Tudo isto aconteceu sensivelmente cinco semanas após Pinto da Costa ter perdido o cargo de presidente para André Villas-Boas, nas eleições do passado dia 27 de abril, 'rompendo' uma renovação que havia sido assinada... dois dias antes.
Despedida de Sérgio Conceição aconteceu no Jamor, no passado dia 26 de maio, com a conquista da Taça de Portugal (2-1 após prolongamento), frente ao rival Sporting.© Getty Images
'Mar' de dificuldades não naufragou ambição
Já depois de diversas experiências em clubes como Standard Liège, Olhanense, Académica, Sporting de Braga, Vitória SC e Nantes, Sérgio Conceição chegou ao FC Porto no verão de 2017 e conseguiu fazer a chamada "omelete sem ovos", contra todas as expectativas, ao sagrar-se campeão logo na primeira temporada. Além disso, ainda levou a sua equipa até às 'meias' da Taça de Portugal e da Taça da Liga, não esquecendo o caminho até aos 'oitavos' da Liga dos Campeões.
Seguiu-se uma temporada atípica em que a conquista da Supertaça (e ainda a ida até aos 'quartos' da Champions) não foi propriamente motivo de contentamento no universo azul e branco, naquela que foi a temporada do "quase". Além de cair nas finais da Taça de Portugal e da Taça da Liga, o FC Porto ainda viu uma vantagem de sete pontos para o Benfica transformar-se em desvantagem, possibilitando ao seu rival a festa de campeão nacional.
A vingança não tardou em aparecer. Em 2019/20, aconteceu precisamente o contrário. Sérgio Conceição guiou os dragões a uma épica reviravolta na classificação e anulou uma desvantagem precisamente de sete pontos, confirmando mais um campeonato para o FC Porto - algo ao qual se juntou a Taça de Portugal e, consequentemente, a primeira 'dobradinha'. A nível internacional, só houve espaço para uma caminhada até aos 16-avos da Liga Europa, na única época em que o hino da Liga dos Campeões não tocou no Estádio do Dragão.
Épocas | Títulos | I Liga | Taça de Portugal | Supertaça | Taça da Liga | Liga dos Campeões | Liga Europa |
2017/18 | 1 | Vencedor | 'Meias' | - | 'Meias' | 'Oitavos' | |
2018/19 | 1 | 2.º lugar | Finalista | Vencedor | Finalista | 'Quartos' | |
2019/20 | 2 | Vencedor | Vencedor | - | Finalista | - | 16-avos |
2020/21 | 1 | 2.º lugar | 'Meias' | Vencedor | 'Meias' | 'Quartos' | |
2021/22 | 2 | Vencedor | Vencedor | - | Fase de grupos | Fase de grupos | 'Oitavos' |
2022/23 | 3 | 2.º lugar | Vencedor | Vencedor | Vencedor | 'Oitavos' | |
2023/24 | 1 | 3.º lugar | Vencedor | Finalista | Fase de grupos | 'Oitavos' |
À semelhança do que tinha acontecido após a primeira época do título, o FC Porto voltou a arrecadar apenas a Supertaça na temporada seguinte (2020/21), ficando pelas 'meias' da Taça de Portugal e da Taça da Liga, numa altura em que permitiu que o rival Sporting, de Rúben Amorim, voltasse a conquistar a I Liga... 19 anos depois. Ainda assim, no que toca à Liga dos Campeões, a nova presença nos 'quartos' da prova milionária permitiu um encaixe financeiro significativo para os cofres dos dragões.
E como a seguir a uma época de sucesso na Champions, vem sempre uma temporada de êxito a nível interno, eis que Sérgio Conceição voltou a ser campeão nacional e a vencer a Taça de Portugal, em 2021/22. Para além da nova 'dobradinha', os azuis e brancos não foram além da fase de grupos da Taça da Liga e da Liga dos Campeões, sendo que, na Liga Europa, acabariam por cair nos 'oitavos'.
A temporada 2022/23 acabou por ser aquela com mais títulos conquistados (3), fruto dos triunfos na Supertaça, Taça da Liga e Taça de Portugal, 'esbarrando' apenas na I Liga, onde acabou a dois pontos do campeão Benfica, de Roger Schmidt - não esquecendo a nova presença nos 'oitavos' da Liga dos Campeões.
E depois veio a onda oscilante...
As peripécias da época que terminou no passado dia 26 de maio, com a conquista da Taça de Portugal, frente ao rival Sporting (2-1 após prolongamento), foram diversas. Em ano de eleições, o FC Porto atravessou marés de altos e baixos e essas ondas oscilantes abriram espaço para críticas - algumas delas, por vezes, exageradas - no universo portista.
A equipa do técnico de 49 anos arrancou a época com a derrota na Supertaça, frente às águias (2-0), seguindo-se algumas 'escorregadelas' na primeira volta da I Liga que 'cavaram' um fosso para os rivais Sporting e Benfica - numa altura em que ainda discutiam a liderança taco a taco. Mesmo com o campeonato praticamente perdido, um dos pontos mais altos da temporada foi, inevitavelmente, a goleada por 5-0, frente ao conjunto de Roger Schmidt, no passado dia 3 de março.
Sérgio Conceição despediu-se da saga dos Clássicos frente ao Benfica com uma goleada certamente inesquecível.© Getty Images
Na era Sérgio Conceição, o FC Porto tinha oscilado sempre entre o primeiro e o segundo lugar, mas a verdade é que só garantiu a terceira posição na última jornada, frente ao Sporting de Braga (0-1), já depois de ter andado a batalhar pelo pódio com os arsenalistas e ainda com o Vitória SC. A salvação da época - no sentido de não 'romper' com as seis épocas sempre a ganhar um troféu - morava mesmo no Jamor, dado que os 'oitavos' da Champions e a fase de grupos da Taça da Liga não se tinham traduzido em títulos para o FC Porto.
Com a troca entre Pinto da Costa e André Villas-Boas na presidência dos dragões, houve quem considerasse que a partida do Jamor pudesse ser a última de Sérgio Conceição como treinador dos azuis e brancos, embora ainda existisse a esperança de que a resistência ao 'assédio' de clubes internacionais conduzisse à sua permanência por mais tempo. A verdade é que a sua saída ocorreu noutros contornos... polémicos.
O que se segue?
Sérgio Conceição deixa o FC Porto depois de ter possibilitado as estreias dos filhos Rodrigo Conceição e Francisco Conceição ao serviço da equipa principal, mas o seu legado acaba por ser a 'palavra de ordem' para se perceber o impacto glorioso impulsionado pela sua passagem pelo Estádio do Dragão.
Apaixonado pelo jogo como nem todos conseguem ser, o treinador de 49 anos somou 25 expulsões (a última das quais precisamente no jogo da despedida), mas nem esse lado fervoroso impediu que vários 'tubarões' do futebol europeu manifestassem interesse na sua contratação - algo que Pinto da Costa conseguiu sempre travar.
Sérgio Conceição foi sempre muito acarinhado pelos adeptos do FC Porto, mas não se pode dizer que tenha escapado a algumas críticas no seu percurso pelos dragões.© Getty Images
Aliás, o ex-presidente do FC Porto tratou de garantir a sua continuidade por mais quatro épocas, no passado dia 25 de abril, a sensivelmente 48 horas das eleições que culminaram numa estrondosa vitória de André Villas-Boas (cerca de 80% dos votos). No entanto, embora a possibilidade de rumar ao Olympique de Marseille até possa estar em cima da mesa, a saída de Sérgio Conceição acontece na sequência daquilo que considerou ser uma 'traição' do adjunto de Vítor Bruno - já desde os tempos do Olhanense - ao negociar a hipótese de ser o seu substituto como técnico principal para a nova época.
Após as '7 Maravilhas' ao longo das sete temporadas, o tom da despedida acaba por ser algo agridoce, fruto das polémicas (algo 'abafadas', por enquanto) que conduziram à sua saída. Certo é que Sérgio Conceição despede-se do FC Porto com três campeonatos, quatro Taças de Portugal, três Supertaças e uma Taça da Liga. Esse legado ninguém pode apagar.
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