Compacto Lusófono "é uma declaração" sem garantia de financiamento
O antigo secretário-geral adjunto da ONU e alto representante da União Africana para as parcerias com a Europa, Carlos Lopes [ao centro na foto], afirmou à Lusa que o Compacto Lusófono, é apenas "uma declaração", sem garantias de financiamento.
© Reuters
Economia Carlos Lopes
"Os instrumentos que permitem ter garantias de financiamento para os projetos não são instrumentos do tipo do Compacto. São outro tipo de programas", afirmou Carlos Lopes, numa entrevista à Lusa, em Lisboa, onde recebeu esta semana o "Prémio José Aparecido de Oliveira", da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), que lhe tinha sido atribuído em 2016.
O académico guineense, que no ano passado foi considerado uma das 100 personalidades mais influentes de África, numa lista elaborada pela revista 'New African', afirmou que o modelo do Compacto "introduz muitas dúvidas".
"Porque estas organizações e países assinam muitas coisas", referiu, acrescentando: "e já vi muitos filmes".
Por isso, à cautela, vai dizendo "é ver para crer", quando questionado sobre a assinatura esta quarta-feira do Compacto para Angola.
O Compacto Lusófono é uma iniciativa lançada no final de 2018 pelo Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) e pelo Governo português para financiar projetos privados em países africanos de língua portuguesa, com o apoio financeiro do BAD e com garantias do Estado português, que assim asseguram que o custo de financiamento seja mais baixo e com menos risco.
Para o professor da Universidade de Governança Nelson Mandela, na África do Sul, o que pode falhar neste modelo é pura e simplesmente "não haver desembolsos e ficar no domínio das declarações de princípio e das boas intenções" .
"Estou a introduzir um elemento de dúvida sobre a capacidade financeira de implementar essas declarações", reforçou.
Carlos Lopes foi ainda mais longe nas afirmações, considerando que é preciso que o modelo "seja traduzido em desembolsos reais", referindo: "Porque assinar grandes princípios de investimento, através de declarações... As declarações não são um instrumento financeiro, são fáceis de assinar, porque não obrigam as partes".
"Os recursos são fungíveis. Eu posso tirar de A e pôr em B, e depois mudar outra vez de B para A, e depois mudar outra vez de A para C", alertou o sociólogo.
Fundamentando, o antigo secretário-geral adjunto das Nações Unidas apontou alguns exemplos do que deveria estar definido no modelo do Compacto.
"Se eu assino um programa com o Fundo Monetário Internacional, tenho de assinar um determinado número de condicionalidades, mas o fundo tem de dizer quanto vai desembolsar na data tal. Portanto não é uma coisa assim vaga", indicou Carlos Lopes.
"Se eu fizer um empréstimo e contrair uma dívida soberana junto de um país terceiro eu tenho um contrato, que específica exatamente quanto eu vou receber, com que modalidade e com que taxa de juro. Tudo isso é muito, muito explicito, fica muito definido em termos jurídicos e legais. O Compacto é uma declaração", concluiu.
O vice-presidente do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) Mateus Magala disse na quarta-feira que espera assinar ainda este mês todos os Compactos específicos para cada país lusófono, salientando o interesse de várias instituições financeiras multilaterais.
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