Proposta de taxas de IVA diferenciadas na luz permite "ganhar tempo"
O antigo ministro das Finanças Bagão Félix discorda da criação de taxas de IVA diferenciadas em função do consumo de eletricidade, considerando que esta é uma solução que permite ao Governo "comprar tempo" e responder aos partidos de esquerda.
© Lusa
Economia Bagão Félix
Em entrevista à agência Lusa, Bagão Félix referiu acreditar que se trata de uma medida "muito difícil de ser posta em prática" e da qual discorda porque introduz "fatores de progressividade por via de impostos sobre o consumo", o que "é absolutamente inovador mas é uma inovação deslocada, porque isso faz-se dos impostos diretos e não dos impostos indiretos".
Para o ex-ministro das Finanças do Governo de Santana Lopes, a solução para o IVA da energia que deverá integrar a proposta do Orçamento do Estado, que será entregue no parlamento no próximo dia 16, servirá para "comprar tempo".
Na terça-feira, durante o debate quinzenal, o primeiro-ministro, em resposta à líder do Bloco de Esquerda, referiu ter enviado nesse dia uma carta à presidente da Comissão Europeia solicitando a alteração de critérios do IVA da energia para permitir a variação da taxa "em função dos diferentes escalões de consumo".
"A minha interpretação, e aqui especulando, naturalmente, acho que isso é comprar tempo", referiu, para acrescentar que uma medida desta natureza "vai demorar muito tempo, porque os serviços europeus nessa matéria são muito lentos e, portanto, ganhando tempo, [o Governo] vai poder responder aos partidos que exigem a redução da taxa de energia para 6%", dizendo que apresentou a proposta mas que não pode "ir por esse caminho" enquanto Bruxelas não responder.
Além disso, precisou, com esta solução poderá até conseguir "evitar" a possibilidade de se formar uma coligação negativa no parlamento.
Assinalando "o fator muito significativo e positivo que é a possibilidade já anunciada" de um excedente em 2020, Bagão Félix acredita que este será um Orçamento do Estado "não muito espetacular" ou "ousado", mas de "continuidade" beneficiando sobretudo dos chamados estabilizadores automáticos.
Ainda que seja apenas uma "intuição", Bagão Félix admite que o partido que estará "mais próximo daquilo que pode ajudar a que o orçamento passe é o Bloco de Esquerda".
Porém, sublinhou, esta proposta de Orçamento do Estado vai chegar ao parlamento e ser discutida num ambiente político diferente da anterior legislatura, em que "havia uma lógica mais global com os partidos que direta ou indiretamente sustentavam o governo".
"Agora como não há isso, tenho receio de que, para se obter o voto positivo ou a abstenção dos partidos à esquerda do PS, haja cedências, haja 'leilões' relativamente a medidas concretas que cada um desses partidos quer fazer reverter a seu favor", referiu o economista.
Neste contexto, observou, "a questão principal não vai ser a votação na generalidade do Orçamento do Estado", mas a votação final global, "isto é, depois da discussão na especialidade vamos ver que manta de retalhos é que vai ficar".
Relativamente aos aumentos salariais na função pública, Bagão Félix reconheceu que são legítimas as expetativas dos trabalhadores em quererem uma atualização dos salários, mas alerta para as pressões na despesa com pessoal que vêm da legislatura anterior pelo regresso ao horário semanal das 35 horas.
"Não se pode é ter tudo ao mesmo tempo: não se pode trabalhar menos, haver mais funcionários e aumentar significativamente os vencimentos dos funcionários", disse porque isso seria "a quadratura do círculo". Na sua opinião, a atualização dos salários deve ser feita "pela inflação verificada no próprio ano" em que a negociação é feita, isto é, 2019.
Admitindo que usando a inflação já conhecida e não a estimada, o resultado "não é simpático para quem tem aumento", considera, ainda assim, "que do ponto de vista teórico, é assim que se deve atuar".
No caso das pensões -- em que a atualização é feita numa fórmula que conjuga o crescimento da economia com a inflação conhecida em dezembro -- o antigo ministro das Finanças reconheceu que o reduzido valor da inflação de referência (últimos 12 meses sem habitação e que foi de 0,24% em novembro) resultará num aumento reduzido.
Neste contexto, considerou que será "bem-vindo" um novo aumento extraordinário das pensões mais baixas, "se for possível contabilizá-lo com as metas orçamentais".
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