Multa ao Credit Suisse "é gota" no oceano e não previne novas fraudes
A Organização Não Governamental (ONG) Comité para o Jubileu da Dívida (CJD) considerou hoje que a multa imposta ao Credit Suisse pelas autoridades financeiras norte-americanas, britânicas e suíças é uma gota no oceano e não impede novas irregularidades.
© Reuters
Economia Moçambique/Dívidas
"Uma multa de 475 milhões de dólares [408 milhões de euros] é uma gota no oceano para um banco tão grande como o Credit Suisse, e o falhanço em tomar praticamente qualquer iniciativa contra o banco VTB é desconcertante", disse o diretor do departamento de políticas públicas nesta ONG dedicada à questão da dívida pública sustentável.
Numa nota enviada à Lusa, Tim Jones diz que "são urgentemente necessárias novas regras nos Estados Unidos e no Reino Unido para tornar públicos todos os detalhes dos empréstimos aos governos".
Em causa está o anúncio feito na terça-feira relativamente à multa global de 475 milhões de dólares imposta pelas autoridades judiciais dos Estados Unidos, Reino Unido e Suíça ao banco Credit Suisse, que se deu como culpado no processo de fraude financeira que corria num tribunal em Nova Iorque relativamente à sua participação no chamado 'escândalo das dívidas ocultas' de Moçambique, a que se junta uma outra multa de 6 milhões de dólares, cerca de 5,1 milhões de euros, ao banco russo VTB.
De acordo com os documentos do acordo consultado hoje pela Lusa, disponíveis nos sites destes reguladores financeiros, o banco suíço concordou em pagar uma multa e acordou também perdoar 200 milhões de dólares (171 milhões de euros) devidos pelas empresas estatais que contraíram os empréstimos avalizados pelo então ministro das Finanças, Manuel Chang, atualmente detido na África do Sul.
"A multa da Autoridade de Conduta Financeira do Reino Unido [FCA, na sigla em inglês] reflete o impacto destas transações irregulares, incluindo uma crise da dívida e prejuízos económicos para o povo de Moçambique, e seria mais alta se o Credit Suisse não tivesse concordado em perdoar 200 milhões de dóalres de dívida", disse o diretor executivo do departamento de Aplicação e Supervisão do Mercado na FCA, Mark Steward.
Na nota colocada na página do regulador financeiro britânico, lê-se ainda que "entre outubro de 2012 e março de 2016 o Credit Suisse falhou na gestão adequada do risco de crime financeiro dentro do seu negócio nos mercados emergentes" e acrescenta-se que "tinha informação suficiente para perceber o risco inaceitável de subornos associados com dois dos seus empréstimos moçambicanos e uma troca de títulos de dívida relacionados com os projetos patrocinados pelo Governo".
Mesmo admitindo que os três banqueiros envolvidos "deram passos para esconder deliberadamente os subornos, os sinais de aviso sobre a potencial corrupção deviam ter sido claros para os controladores do Credit Suisse e para os comités séniores do banco, que repetidamente não investigaram, escrutinaram ou indagaram suficientemente face aos importantes fatores de risco e aos avisos", critica-se no comunicado no site da FCA.
O regulador financeiro britânico afirma ainda que "levou em linha de conta a iniciativa do Credit Suisse de perdoar 200 milhões de dólares de dívida à República de Moçambique quando determinou a multa financeira" e alerta que "sem o desconto de 30% por ter concordado resolver o caso com a FCA e sem o alívio da dívida, a FCA teria imposto uma multa financeira significativamente maior".
A descoberta das dívidas ocultas de Moçambique em 2016 levou a uma crise financeira no país que redundou numa série de processos judiciais contra o Credit Suisse e contra o banco russo VTB, lançados pela Procuradoria-Geral da República moçambicana, mas os bancos colocaram também o país no banco dos réus por falta de pagamento, argumentando que o destino e aplicação das verbas emprestadas não era sua responsabilidade.
A justiça moçambicana acusa 19 arguidos do processo principal, cujo julgamento decorre, de se terem associado em "quadrilha" e delapidado o Estado moçambicano em 2,7 mil milhões de dólares (2,28 mil milhões de euros) - valor apontado pela procuradoria e superior aos 2,2 mil milhões de dólares até agora conhecidos no caso - angariados junto de bancos internacionais através de garantias prestadas pelo Governo.
As dívidas ocultas foram contraídas entre 2013 e 2014 pelas empresas estatais moçambicanas Proindicus, Ematum e MAM para projetos de pescas de atum e proteção marítima, que nunca avançaram.
Os empréstimos foram secretamente avalizados pelo Governo da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), liderado pelo Presidente da República à época, Armando Guebuza, sem o conhecimento do parlamento e do Tribunal Administrativo.
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