"Subida demasiado rápida das taxas de juro pode provocar recessão"

O economista e ex-presidente da Autoridade da Concorrência, Abel Mateus, acredita que os próximos anos serão marcados por uma inflação elevada, alertando para o impacto de uma subida demasiado rápida das taxas de juro, caso o BCE demore a agir.

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Lusa
15/02/2022 08:04 ‧ 15/02/2022 por Lusa

Economia

Abel Mateus

"Estas taxas de inflação saem completamente fora dos mandatos que são dos bancos centrais, de manterem a inflação abaixo dos 2%. Muitos destes bancos centrais e os mercados continuam a apostar que é um fenómeno que vai ser sobretudo acentuado no primeiro semestre de 2022 e que depois vai desacelerar. Não estou tão otimista", disse em entrevista à Lusa.

O economista, que foi administrador do Banco de Portugal na área da política monetária em Portugal e participou na adesão portuguesa à moeda única, considerada "inevitável" que o Banco Central Europeu (BCE) suba as taxas de juro, recordando que a Reserva Federal norte-americana já anunciou que o irá fazer a partir de março.

Apesar de admitir que a inflação na zona euro poderá desacelerar devido a fatores ligados às cadeias de produção e estrangulamentos, Abel Mateus salienta que fatores como a transição energética, os ligados ao aumento da liquidez e a poupança extraordinária que é esperada ser canalizada para aumentos de procura vão "descarregar sobre a economia".

"Poderemos durante alguns anos -- não sei quantos -- ter uma inflação relativamente elevada, o que obriga a subir taxas de juro", vinca.

Questionado sobre se existe o risco de o BCE agir demasiado tarde, Abel Mateus recorda que, quando um banco central "sobe tarde as taxas de juro, tem que as subir rapidamente e muito mais do que seria se as tivesse começado a subir gradualmente".

O atual presidente do conselho consultivo da SEDES -- Associação para o Desenvolvimento Económico e Social adverte: Se a "subida for muito rápida, arriscamo-nos a ter uma recessão daqui a dois ou três anos".

"Por exemplo, dois pontos percentuais (pp.) de aumento, que não é nada de extraordinário, já tem um efeito muito sério sobre a economia portuguesa", assinala, exemplificando que para "uma família que tenha um empréstimo, por exemplo, de 200 mil euros na compra de uma casa, um aumento de dois pp. significa um aumento de quatro mil euros do juro por ano que tem que pagar a mais".

Aponta ainda o possível impacto para a dívida pública portuguesa, estimando que dois pp. se traduzam em 2,6% do PIB que aumenta o défice.

"São efeitos que podem ser sérios em termos do impacto, que já se verificaram no passado. Não sei se acontecerá ou não, mas temos de estar preparados para isso. Terá de haver políticas apropriadas para resolver esta situação", disse.

Leia Também: "Os salários não podem subir se não aumentar a produtividade"

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