"A insegurança alimentar é muito preocupante, o número de pessoas em severa insegurança alimentar subiu para 123 milhões; há muitos conceitos sobre má nutrição, insegurança alimentar extrema, mas o que isto significa é que correm risco de vida, há famílias a morrer porque não têm comida suficiente, e o número aumentou massivamente nos últimos três anos, uma em cada três destas pessoas entrou nesta situação desde 2019", disse Luc Eyraud.
Em entrevista à Lusa no âmbito da divulgação do relatório sobre as perspetivas económicas para a região da África subsaariana, o diretor de divisão responsável pela produção do documento afirmou que há muitas razões para a degradação das condições alimentares de boa parte dos países em África, mas salientou as perturbações na cadeia de abastecimento e o aumento de preços, além do impacto da invasão da Ucrânia pela Rússia e da evolução cambial das moedas africanas.
"Como os preços são em dólares, a inflação sente-se mais nestes países, e as alterações climáticas criaram a maior seca dos últimos 40 anos no Corno de África, por isso juntando todos estes fatores, ficamos com uma preocupação enorme", afirmou o responsável, falando à Lusa através de videoconferência a partir de Washington, onde decorrem os Encontros Anuais do FMI e do Banco Mundial.
Questionado sobre o que podem os países africanos fazer para contrariar a situação, Luc Eyraud disse que, a curto prazo, as transferências de capital para as famílias são fundamentais, mas salientou que a ajuda não pode ser permanente.
"O que aconselhamos a curto prazo é um sistema de transferências sociais bem estabelecido, como acontece em Portugal, mas em África é muito difícil fazer isto, não só pela falta de infraestruturas, mas também pelo peso do setor informal na economia, o que acaba por fazer com que toda a gente tenha subsídios e beneficie dos cortes de impostos sobre a energia e os alimentos", explicou.
"Temos de reconhecer que é legítimo usar estes mecanismos em situação de emergência, mas dadas as vulnerabilidades das finanças públicas, estas ajudas não podem ser permanentes, e esse é o maior desafio: ajudar, sim, mas reconhecer que as ajudas são muito caras e não são direcionadas especificamente para quem delas mais precisa", apontou.
A médio prazo, acrescentou, África precisa de "aumentar a produção alimentar, mas apostando em medidas e técnicas que sejam resilientes às alterações climáticas, por exemplo utilizando novos tipos de sementes".
Desde o início da pandemia de covid-19, no princípio de 2020, o FMI já canalizou cerca de 50 mil milhões de dólares (51,12 mil milhões de euros) para os países da África subsaariana, incluindo os 23 mil milhões de dólares (23,51 mil milhões de euros) em Direitos Especiais de Saque, e tem programas de assistência financeira em 22 dos 45 países da região.
Esta semana, o Fundo lançou a janela de financiamento contra choques, o Fundo de Resiliência e Sustentabilidade, que permitirá aumentar o capital disponível para os países em necessidades, calculado em função de um aumento de 50% sobre o valor que podem pedir emprestado ao FMI, que é atualmente 150% da quota de participação na instituição.
"É um montante decente de verbas que podem dar uma ajuda significativa", disse, salientando que o valor depende de país para país.
Para já, este novo fundo já está dotado de 20 mil milhões de dólares 820,4 mil milhões de euros), e tem já garantidos compromissos no valor de 37 mil milhões de dólares (37,8 mil milhões de euros), perto do objetivo de 45 mil milhões de dólares (46 mil milhões de euros) definido quando foi anunciado.
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