Na gigantesca área natural entre os rios Okavango e Zambeze, partilhada por cinco países - Angola, Botsuana, Namíbia, Zâmbia e Zimbabué - está a ser desenvolvido um projeto internacional que conjuga turismo e conservação ambiental, como explicou à Lusa o diretor geral do Polo de Desenvolvimento Turístico da Bacia do Okavango (PDTBO) e ponto focal do projeto transfronteiriço KAZA.
Angola, com 90 mil metros quadrados, compreendendo quatro municípios (Cuito Cuanavale, Dirico, Rivungo e Mavinga), detém a terceira maior parcela, mas será talvez o país que menos tem tirado partido do potencial turístico nesta região da província do Cuando Cubango, onde está quase tudo por fazer.
"Ainda temos algumas lacunas", admite Gime Sebastião, responsável da Área Transfronteiriça de Conservação do Kavango Zambeze (ATFC KAZA), que congrega cinco países e 36 parques nacionais, numa área total de 520 mil quilómetros quadrados.
O tratado que estabeleceu o KAZA foi assinado há 12 anos, em Luanda, mas Angola ainda não ratificou o documento, o que cria dificuldades no acesso a fundos internacionais e captação de investimento.
"Aguardamos a todo o momento que esse passo seja dado", afirma à Lusa Gime Sebastião.
Esse será um passo importante para o desenvolvimento do turismo no Okavango, denominador comum onde se cruzam as águas dos rios Cuando e Cubango, na província a que deram o nome, uma das mais extensas e remotas do país, ocupando uma área com o dobro de Portugal, com diversidade faunística e paisagens intocadas.
Segundo o responsável do PDTBO, acessos e "normalização das fronteiras" são obstáculos ao desenvolvimento, dificultando o movimento de turistas naquela região que faz fronteira com a Namíbia, a sul, e a Zâmbia, a leste.
"Os postos fronteiriços daquela zona ainda estão encerrados administrativamente", diz Gime Sebastião, esperando que a situação esteja ultrapassada até ao início do próximo ano.
Lembrou, por outro lado, que a região foi fortemente afetada pelo conflito armado que durou cerca de 30 anos em Angola, opondo as forças governamentais à UNITA de Jonas Savimbi, levando a vida selvagem a dispersar e praticamente abandonar o seu 'habitat' durante a guerra civil.
"Neste momento, com a segurança que se vive e limpeza das minas, os animais estão a regressar", garante.
Atualmente pode-se circular "com toda a segurança" em cerca de 50% do território do Cuando Cubango, mas é preciso desminar o restante para garantir a segurança e movimentação dos turistas, já que em grande parte da região se circula em picadas, estando em curso ações de desminagem a cargo das autoridades angolanas e parceiros como a ONG Halo Trust.
Mas faltam também operadores e guias turísticos que desenvolvam atividades e roteiros e infraestruturas hoteleiras para acolher os visitantes.
"Para começar", o Governo angolano vai tentar cativar os adeptos do chamado "turismo de natureza", prometendo a criação de parques de campismo para breve, "tão logo estejam oficializados os postos transfronteiriços".
Gime Sebastião espera contar com alguns operadores turísticos provenientes de países vizinhos, como é o caso da Namíbia, no próximo ano.
Entre as atrações, além da fauna selvagem, onde destaca a presença de elefantes, búfalos, girafas e palancas, o diretor do PDTBO aponta a pesca desportiva como oferta turística complementar, estimando que, em 2024, cerca de 10 a 15 mil turistas venham conhecer a região.
O responsável diz ainda que as autoridades angolanas estão atentas às comunidades locais, sublinhando que no polo do Okavango, após a instalação de unidades hoteleiras prevista na primeira fase, prevê-se a criação de 1.500 postos de trabalho, proporcionando o desenvolvimento do turismo comunitário.
"Os melhores guias são eles, são eles que vão mostrar aquilo que o turista procura, os animais, as áreas de observação", exemplifica, referindo-se aos grupos étnicos locais como os Nganguela e os Khoisan.
Quanto à exploração de petróleo de que já se fala no Okavango, afirma que nada está decidido.
"Fala-se nisso, o país vizinho, a Namíbia, já tem prospeção em curso, mas na nossa componente ainda não. São ações que dependem fundamentalmente do governo, não tenho conhecimento de projetos dessa natureza que tenham sido autorizados (...) de momento, não temos nada", assegura, reforçando que o foco é o turismo.
"Neste momento, o turista do lado namibiano já viu tudo, no Botsuana já viu tudo, na Zâmbia já viu tudo, agora Angola é que está fechada e eles estão a pressionar para que a gente abra as portas" destaca Gime Sebastião.
Na semana passada, o Presidente angolano, João Lourenço, assinou um despacho autorizando 19 milhões de dólares (17,5 milhões de euros) para a construção de um novo aeroporto internacional em Mavinga, destacando a importância internacional da nascente do Delta do Okavango e o facto de ser "uma zona estratégica de interesse de investimentos para o desenvolvimento do turismo no país".
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