Economistas: PIB dá ajuda extra para conseguir "brilharete" de Medina
O crescimento da economia e a estratégia de gestão poderão levar o rácio da dívida pública a rondar os 100% do PIB em 2023, abaixo da meta oficial do Governo, segundo os economistas consultados pela Lusa.
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Economia Dívida pública
A concretizar-se o "brilharete", o ministro das Finanças, Fernando Medina, fecha o ano de 2023 com o peso da dívida pública face ao Produto Interno Bruto (PIB) a rondar o registado em 2010 (100,2%) e abaixo da meta prevista no Orçamento do Estado para 2024 (OE2024), quando apontava para um rácio de 103%.
Os números significam não só a consolidação da trajetória de redução do peso da dívida registada nos últimos anos, como também ficar antecipadamente mais próximo da meta de 98,9% projetada para 2024.
O Banco de Portugal (BdP) divulga na quinta-feira os dados de dezembro do ano passado em termos nominais e em percentagem PIB, na mesma semana em que o Instituto Nacional de Estatística (INE) revelou que a economia portuguesa cresceu 2,3% na totalidade do ano, tendo registado uma expansão homóloga de 2,2% e em cadeia de 0,8% no quarto trimestre.
"É claramente possível [tocar em 2023 a meta de 100%]", considera o coordenador do NECEP - Católica-Lisbon Forecasting Lab, João Borges de Assunção, apontando o efeito positivo combinado de um crescimento nominal da economia acima do normal devido à inflação e também ao bom desempenho real da economia em 2023.
A esse cenário junta os resultados das elevadas receitas fiscais que também beneficiaram de efeitos nominais significativos.
Para o presidente da IMF - Informação de Mercados Financeiros, Filipe Garcia, os 100% são uma "meta simbólica", porque "o mais importante é a trajetória e não tanto se a dívida ficou em 100%, ou um pouco acima ou um pouco abaixo, até porque isso pode ser apenas resultado de escolhas de tesouraria, da almofada de liquidez".
Ainda assim, destaca os dados relativos ao PIB tornam mais "provável" uma queda além do projetado oficialmente para 2023.
De acordo com os dados do Banco de Portugal, em novembro de 2023, a dívida pública, na ótica de Maastricht, diminuiu 2,5 mil milhões de euros, para 267,9 mil milhões de euros e quando líquida dos depósitos das administrações públicas manteve-se nos 252,6 mil milhões de euros.
"Impulsionado por um crescimento económico acima do esperado pelo executivo, sobretudo suportado pelo inesperado desempenho positivo da economia nacional no último trimestre de 2023, e beneficiando também de um deflator do PIB ainda relativamente elevado, o PIB nominal no ano passado rondou os 266 mil milhões de euros, possibilitando um rácio da dívida pública face ao PIB nominal à volta de 99,5% no ano passado, caso o montante total da dívida pública portuguesa tenha descido para os 265 mil milhões de euros", prevê o economista sénior do Banco Carregosa Paulo Rosa.
Por seu lado, o diretor do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade, Pedro Braz Teixeira, considera que dado que com a execução melhor do que a estimada no relatório do OE2024, "é muito provável que seja possível ficar abaixo dos 103% do PIB, embora seja menos seguro que se consiga ficar abaixo da marca simbólica dos 100% do PIB".
"Aliás, os dados do PIB do quarto trimestre, muito acima do esperado, reforçam a ideia de ser possível um bom resultado para as contas públicas, quer no défice quer na dívida", aponta.
No final do ano passado, o ministro das Finanças montou, segundo o semanário Expresso, "uma operação especial gigantesca, que incluiu a recompra de títulos de dívida pública a privados, seguradoras e bancos, por um lado, e o pagamento antecipado de dívida das empresas públicas" com o objetivo de fechar o ano com o rácio abaixo dos 100%.
Contudo, a generalidade dos economistas considera que a recompra tem um efeito pontual.
"Esta atuação tem a vantagem de conseguir fazer descer o rácio sem que seja necessário cortar na despesa ou aumentar impostos, mas é uma medida essencialmente de gestão de tesouraria porque não altera a dívida líquida", explica Filipe Garcia.
No entanto, assinala que "se a taxa de aplicação que o Estado deixa de receber pelo depósito que tem parqueado for mais baixa do que a taxa marginal de endividamento, financeiramente até pode trazer algum ganho".
"Preferiria ter a certeza de que os níveis de liquidez que o Tesouro, as empresas públicas e a Administração Pública detêm são os adequados e não que estão ao serviço de cumprir este ou aquele rácio", aponta, acrescentando que, no entanto, há uma outra vantagem nesta "estratégia": soltar liquidez para a economia.
Segundo Pedro Braz Teixeira, a estratégia "melhora a imagem das contas públicas, mas sem qualquer alteração da substância", pelo que não é "sustentável, havendo necessidade de, no curto prazo, repor a almofada financeira, para não estar a criar um risco excessivo na gestão da dívida".
"É uma opção com objetivos claramente eleitoralistas, para ficar abaixo da marca simbólica dos 100% do PIB, mas que não pode ser repetida", alerta.
João Borges de Assunção adverte ainda que "há pequenos efeitos adicionais caso a dívida seja comprada acima ou abaixo do valor facial da dívida".
"A compra de grandes lotes de dívida pública portuguesa ao sistema financeiro podem influenciar o seu preço de forma adversa", considera, questionando: "o que farão os bancos com os recursos financeiros recebidos? Irão investir em dívida italiana, grega ou espanhola?".
"Essa alteração na composição dos ativos financeiros dos bancos pode ter efeitos secundários negativos", refere, acrescentando que "já o pagamento antecipado de dívida das empresas pública deveria ser visto caso a caso", dado que "no caso das empresas solventes pode ajudar a reduzir o custo do serviço da dívida".
Por seu lado, Paulo Rosa destaca que "um dos principais pontos positivos, diminuindo o rácio da dívida pública para valores inferiores a 100%, é mostrar à Europa a credibilidade de Portugal, fortalecendo a sua fidúcia nos mercados internacionais e a sua robusta capacidade creditícia".
No entanto, assinala que "pagamentos incluem transferências de dinheiro, eventualmente suportados por alguma dívida acrescida que se mantém dentro de todo o perímetro da administração pública, incluindo empresas públicas, munindo-se esta estratégia de uma relativa engenharia financeira e diferimentos de dívida".
No terceiro trimestre deste ano, Portugal registou a segunda maior redução homóloga do rácio da dívida pública entre os países da zona euro (-10,9 pontos percentuais), para os 107,5% do PIB nacional.
Em 2022, o rácio da dívida pública caiu para 112,4% do PIB.
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