O Governo confirmou que vai revogar as medidas do programa Mais Habitação que considera "erradas", entre as quais o arrendamento forçado, os congelamentos de rendas e as "medidas penalizadoras" do alojamento local.
As reações a este tema não demoraram a chegar e tanto os proprietários como os inquilinos já mostraram qual é a sua posição. Vamos por partes.
Programa do Governo satisfaz proprietários, mas preocupa inquilinos
O Programa do Governo foi recebido de forma diferente por proprietários e inquilinos, com os primeiros satisfeitos com as medidas adotadas e os segundos a criticarem a "política assistencialista".
A Associação Nacional de Proprietários (ANP) regozija-se com "o respeito" pela propriedade privada demonstrado pelo Governo (PSD/CDS-PP) e diz-se "disponível" para contribuir "no sentido de resolver a crise e apoiar as reformas que tiverem de ser feitas".
Porém, António Frias Marques, presidente da ANP, sublinhou, em declarações à Lusa, que a confiança dos senhorios e dos proprietários "se perdeu há bastante tempo" e "é necessário" recuperá-la.
"Há um grande incumprimento do pagamento das rendas", que tem afastado "a vontade de arrendar as casas", apontou.
A ANP apoia o fim do "controlo administrativo de preços", que beneficia da mesma forma proprietários remediados e "tubarões da indústria", e aprova a implementação do IVA (Imposto sobre o Valor Acrescentado) a 6% para toda a reabilitação.
"O nosso parque habitacional, principalmente nos cascos antigos das cidades, precisa, todo ele, de ser reabilitado", constata.
O subsídio de rendas deve ser atribuído aos arrendatários "sem possibilidades", concorda, frisando que "não se pode transferir o ónus da ajuda a essas classes para os privados, têm de ser o Estado central e as autarquias a proporcionar-lhes boa habitação".
Sobre o que não consta do Programa do Governo, a ANP vai lutar pelo fim da penalização fiscal sobre os edifícios devolutos e do Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (AIMI), que se aplica a patrimónios superiores a 600 mil euros.
Quanto às parcerias público-privadas propostas pelo executivo, "é sempre mais do mesmo", porque "são sempre feitas com os privados do costume, não é com o pequeno proprietário", recorda Frias Marques.
"Parece-nos que este Governo vai no sentido correto", resume o representante dos proprietários.
Já a Associação dos Inquilinos Lisbonenses (AIL) critica o Programa do Governo, por propor "uma política assistencialista, através de subsídios e compensações", alertando que "é o Orçamento do Estado que vai pagar as rendas altas".
O Governo tem de "encontrar medidas de outro tipo, que estabilizem, que credibilizem o mercado de arrendamento", o que passa, "acima de tudo, por mais construção e mais disponibilidade de casas", nomeadamente pondo "os devolutos ao serviço", aponta o secretário-geral da AIL, António Machado, em declarações à Lusa.
O Programa do Governo "devia ser uma coisa mais integrada e não é, continuamos a ter um conjunto de medidas avulsas, que não resolve, no essencial, o problema da habitação e do arrendamento", considera.
No documento, o Governo diz não acreditar "que a resposta à crise da habitação passe pelo controlo administrativo de preços, por congelamento de rendas ou pela sua limitação dentro de bandas muito estritas, ignorando as regras vigentes, para todos".
"Se não é assim, como é que é?", pergunta António Machado, defendendo que "isto não pode funcionar por fezadas, isto tem de funcionar por medidas concretas (...), a regulação do mercado, a fiscalização do mercado e, por exemplo, uma fiscalidade sobre as rendas que seja escalonada e progressiva, como por exemplo o IRS".
"A especulação imobiliária é um dos problemas sérios do que se passa na habitação", sublinha o representante dos inquilinos, relatando que o que está a acontecer é "a não renovação dos contratos e os mesmos intervenientes, sobre a mesma coisa, fazem um novo contrato quase todos os anos, com aumentos de renda fora dessas limitações e isso não é tratado nem atacado".
Ora, sobre isso, o Programa do Governo não apresenta medidas, pelo que "a selvajaria do mercado mantém-se em vigor", critica, notando a falta de fiscalização e de regulação.
"Enquanto não se atacar, isto é o salve-se quem puder, com a vantagem da propriedade", lamenta.
Alojamento Local saúda equilíbrio de Programa
A Associação do Alojamento Local Em Portugal (ALEP) acredita que o Programa do Governo permite um "equilíbrio" e garante a "estabilidade" do setor, afastando-se de uma "discussão politizada" sobre a crise da habitação.
Recordando as promessas de campanha da Aliança Democrática (PSD/CDS-PP/PPM), que venceu as eleições legislativas de março, no sentido de revogar as medidas "mais gravosas" do programa Mais Habitação, o presidente da ALEP, Eduardo Miranda, realçou que o programa de Governo, conhecido hoje, "nada mais é do que o retomar" de uma negociação com os vários partidos na Assembleia da República.
"Desse diálogo com o PSD surgiu uma proposta, que era uma alternativa ao Mais Habitação", lembrou, em declarações à Lusa.
Essa proposta "não apenas revogava algumas das medidas mais gravosas", como contrapunha "uma alternativa" que "desse um quadro de estabilidade" ao setor, permitindo, ao mesmo tempo, "um equilíbrio entre alojamento local e entre a habitação nas zonas onde há maior pressão, com a questão dos condomínios".
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