O risco existe pela possibilidade de as empresas aproveitarem para fazer propostas de salário de valor inferior, acomodando, assim, uma parcela da subida do rendimento líquido que o IRS Jovem vai proporcionar ou pelo facto de a medida levar a um aumento da oferta de pessoas disponíveis para trabalhar e, dessa forma, ter um efeito negativo nos salários.
Em resposta à Lusa sobre se está previsto algum mecanismo que possa evitar um eventual aproveitamento do efeito líquido do IRS Jovem através da oferta de remunerações mais baixas a quem entra no mercado de trabalho, fonte oficial do Ministério do Trabalho refere a valorização salarial contemplada no acordo assinado com os parceiros sociais e a aplicação de várias medidas que concorrem para o objetivo de "atrair e reter talento jovem em Portugal com melhores condições de trabalho e de vida".
"O Governo acordou com os parceiros sociais a medida de valorização do salário médio, numa percentagem de 4,7% para 2025, cujos encargos serão deduzidos em sede de IRC", assinala o ministério, acrescentando que o executivo está "otimista sobre a apresentação de salários que valorizem as qualificações adquiridas pelos jovens, que são simultaneamente objeto de medida ativa de emprego escalonada em função da sua qualificação nos estágios, e no apoio à contratação sem termo no caso de jovens com qualificação superior".
"É evidente que esse risco de captura [de parte do benefício] existe", disse à Lusa a economista Susana Peralta, notando que esse cenário se coloca sempre que se mexe na tributação. Porém, assinala, este tipo de situação será sempre impossível de monitorizar, porque "ninguém sabe" qual seria o salário oferecido "com e sem o benefício".
Salientando não ser sequer desejável que houvesse algum tipo de controlo a este nível, a economista e professora da Nova School of Business and Economics acentua não haver nada, à partida, que leve a crer que as empresas vão ficar com todo o benefício, tal como não há nada que leve a crer que os jovens fiquem com todo o benefício.
A mesma ideia é partilhada por João Loureiro, economista e professor da Faculdade de Economia da Universidade do Porto, que refere ainda ter dúvidas sobre a eficácia do IRS Jovem na retenção e atração de pessoas, por ser uma medida "solta".
"Esse risco, é um risco potencial" e "não estou a dizer que se vá concretizar, mas existe", afirma o economista, lembrando que no passado já houve casos em que o benefício fiscal não teve o efeito desejado nem foi usufruído pelo destinatário, exemplificando com a última descida do IVA na restauração há uns anos, em que "não houve uma descida dos preços, o que houve foi uma subida da margem de lucro dos restaurantes".
Susana Peralta também aponta ao recente IVA zero, referindo que, apesar da medida incidir sobre preços facilmente observáveis, há estudos a indicar que as empresas capturaram cerca de 30% do benefício.
João Cerejeira, economista e professor da Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho, por seu lado, não antecipa que haja qualquer risco de as empresas baixarem a remuneração das ofertas de trabalho, por saberem à partida que com o IRS Jovem o novo trabalhador vai ter uma subida do salário líquido, mas acredita que o aumento da oferta de pessoas disponíveis para trabalhar possa, em alguns casos, baixar os salários.
"O IRS Jovem faz com que seja mais atrativo trabalhar ou menos atrativo emigrar e isso pode fazer uma pressão adicional da oferta do trabalho", afirma João Cerejeira, notando que apenas por "esse efeito" entende que [a medida] "poderia baixar salários".
o IRS Jovem, uma das bandeiras do Governo, terá um custo de 525 milhões de euros.
Esta medida, que foi alterada após negociações com o PS, vai abranger, segundo o ministro das Finanças, 350 a 400 mil jovens, prevendo uma isenção total do imposto no primeiro ano de trabalho e um desconto fiscal nos nove anos seguintes.
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