Hoje é o Dia Mundial da Pneumonia. Eis as respostas às principais dúvidas
O Lifestyle ao Minuto esteve à conversa com Paula Duarte, assistente graduada senior de pneumologia e vice-presidente da Associação Respira, para abordar o impacto da pneumonia e perceber que cuidados devem ser adotados.
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Lifestyle Entrevista
Dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) mostram que, em 2022, a pneumonia provocou a morte de mais de 12 portugueses por hora. Apesar dos números, a doença pneumocócica é uma das principais causas de mortalidade e morbilidade evitável em todo o mundo.
Causada pela bactéria 'Streptococcus pneumoniae', a doença pneumocócica é uma das principais causas de infeções respiratórias, entre as quais a pneumonia. A maioria dos casos (63,4%) são pneumonias não invasivas, mas, por cá, os casos de doença pneumocócica invasiva (DIP), onde se inclui a pneumonia bacteriémica, a meningite e a septicemia, têm aumentado ao longo dos anos.
Nestes casos, mais de 24% dos doentes hospitalizados vão para os cuidados intensivos, ficando cerca de 17 dias em internamento. A situação agrava-se quando olhamos para a taxa de mortalidade intra-hospitalar por DIP, que é de 16,5%.
Paula Duarte, assistente graduada senior de pneumologia e vice-presidente da Associação Respira, admite que a pneumonia é um desafio de saúde pública. "A mortalidade geral nos doentes internados é de cerca de 24%, aumentando nos indivíduos com mais de 70 anos. Penso que a população não tem noção deste impacto", refere em entrevista ao Lifestyle ao Minuto, a propósito do Dia Mundial da Pneumonia, que se assinala esta terça-feira, 12 de novembro.
Como se desenvolve uma pneumonia?
A pneumonia é um processo inflamatório agudo do parênquima pulmonar. Falando numa linguagem mais acessível e de forma resumida, desenvolve-se através da combinação de vários fatores, nomeadamente a suscetibilidade do hospedeiro, a virulência do agente patogénico e o inóculo de microrganismos que consegue alcançar os alvéolos, apesar dos mecanismos de defesa do aparelho respiratório.
A sintomatologia varia em função do contexto clínico e etário dos doentes. Um idoso, por exemplo, pode apresentar apenas confusão e recusa alimentar
O que difere a pneumonia de uma gripe?
A pneumonia, de causa bacteriana ou viral, afeta diretamente o pulmão profundo. A gripe é uma infeção viral, com envolvimento das vias aéreas superiores e só raramente do tecido pulmonar.
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Existem diferentes tipos de pneumonia?
Há a considerar a pneumonia adquirida na comunidade e a pneumonia nosocomial, que ocorre num contexto de internamento hospitalar por outra causa. Centrando-me na primeira, a infeção aguda do parênquima pulmonar pode ser causada por bactérias, vírus, fungos e parasitas, e pode assumir graus diferentes de gravidade. A avaliação conjugada dos sintomas e sinais, dos resultados dos meios auxiliares de diagnóstico e do contexto clínico do doente determinam a gravidade da doença, o local onde deve ser abordada - ambulatório ou internamento - e a terapêutica a instituir. A maioria das pneumonias acaba por ser em ambulatório.
A causa mais comum é a bactéria pneumococo?
Sim. Trata-se de uma pneumonia bacteriana causada pela bactéria Streptococcus pneumoniae. A doença pneumocócica tem a sua expressão mais grave na doença invasiva pneumocócica, que inclui a meningite, a bacteriémia, a sepsis e a pneumonia bacteriémica.
Mas, além disso, muito se escreve sobre o facto de a pneumonia também ser provocada por vírus. Sabe detalhar quais são?
Uma pneumonia pode ser causada por vírus respiratórios, nomeadamente os influenza e parainfluenza, o vírus respiratório sincicial, o SARS-COV2, os rinovírus e os coronavírus humanos comuns, ou ainda, mais raramente, por outros como o herpes simplex, varicela zoster e o citomegalovírus.
E fungos?
Os fungos são agentes causais também pouco frequentes, associados maioritariamente a contextos de imunossupressão. De referir ainda o Pneumocystis jirovecci, os aspergillus e os cryptococcos.
Que fatores de risco são considerados?
A idade - idosos e crianças estão em risco superior -, doenças respiratórias/cardíacas/renais crónicas, diabetes mellitus, má nutrição, infeções respiratórias virais e estados de imunossupressão, assim como outros relacionados com o estilo de vida, nomeadamente o tabagismo e o consumo excessivo de álcool.
Na doença invasiva, quase um quarto dos doentes hospitalizados são internados em cuidados intensivos, com demoras médias de internamento superiores a duas semanas
Como ocorre o contágio?
O aparelho respiratório está exposto permanentemente a vários microrganismos, que ficam retidos no nariz e na faringe, podendo ser inalados e aspirados. A existência de mecanismos de defesa do sistema respiratório faz com que esses agentes sejam eliminados. Se houver compromisso destes mecanismos de defesa, se o agente for particularmente infecioso ou a sua quantidade for muito elevada, estão criadas as condições para o desenvolvimento de doença. Nas pneumonias bacterianas, por exemplo, o risco de contágio é mínimo, pelo que não há indicação para isolamento dos doentes.
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E quanto a sintomas? A que devemos prestar atenção?
Febre, tosse seca ou produtiva, toracalgia, falta de ar e sintomas gerais, como anorexia, adinamia e astenia. No entanto, a sintomatologia varia em função do contexto clínico e etário dos doentes. Um idoso, por exemplo, pode apresentar apenas confusão e recusa alimentar.
É sabido que as infeções respiratórias têm aumentado, sendo a pneumonia uma das mais prevalentes. Mais: quase 40% do aumento das mortes causadas por doenças do aparelho respiratório está relacionado com a pneumonia, de acordo com dados do INE, relativos a 2022. A que se deve este cenário?
Em 2022, as doenças do aparelho respiratório - isto sem abranger a Covid-19 - causaram mais 18,1% de óbitos do que no ano anterior. Cerca de 40% do aumento das mortes causadas por doenças do aparelho respiratório associou-se ao aumento das mortes por pneumonia, com 4 488 óbitos em 2022, ou seja, 3,6% da mortalidade ocorrida em 2022 (vs 3,0% em 2021). Existem várias causas possíveis: maior sobrevida dos doentes, com aumento da população idosa, comorbilidades significativas, terapêuticas imunossupressoras, e, entre outras, dificuldades no acesso a cuidados de saúde.
Qual o impacto desta doença? Os portugueses estão cientes?
É elevado, quer do ponto de vista social, como económico. Na doença invasiva, quase um quarto dos doentes hospitalizados são internados em cuidados intensivos, com demoras médias de internamento superiores a duas semanas. Estima-se que o custo médio por adulto internado por doença invasiva supere os seis mil euros. Além disso, a morbimortalidade é muito significativa. Está documentada a associação entre pneumonia adquirida na comunidade e risco aumentado de doença cardiovascular. A mortalidade geral nos doentes internados é de cerca de 24%, aumentando nos indivíduos com mais de 70 anos. Penso que a população não tem noção deste impacto.
Quais os grupos de risco? Quem deve vacinar-se contra a pneumonia?
As crianças com idade inferior a dois anos, pessoas com mais de 65 anos e os doentes com determinadas doenças crónicas ou com imunossupressão.
E quanto ao tratamento?
Deve iniciar-se o mais rapidamente possível após o diagnóstico de pneumonia, pois há uma relação direta entre mortalidade e atraso no início do tratamento. Nas formas mais comuns da doença, em que a abordagem é feita no ambulatório, sem critérios de gravidade, a antibioterapia é oral e deve, em geral, ter curta duração. Quando há critérios para internamento, o tratamento é injetável e varia de acordo com os fatores de risco para infeção por determinadas bactérias, como a pseudomonas aeruginosa e Staphylococcus aureus.
Persistem mitos em relação à pneumonia? A relação entre o clima e as infeções respiratórias é um deles?
Há relação entre infeções respiratórias e meses frios do ano, com um aumento da incidência neste período. Ainda assim, os internamentos por pneumonia registam-se em todos os meses do ano.
Há também quem acredite que uma pneumonia pode dever-se a uma gripe mal curada. É assim?
Esse é um 'conceito' que não existe do ponto de vista médico. Ou estamos perante uma pneumonia ou não. E a pneumonia, se existir, pode ser uma provocada pelo próprio vírus ou resultar de uma sobreinfeção bacteriana.
A propósito do Dia Mundial da Pneumonia, que mensagem gostaria de deixar aos leitores do Lifestyle ao Minuto?
No fundo, quero reforçar que é preciso prevenir as formas graves de pneumonia através da vacinação generalizada das populações de risco, de regras de etiqueta respiratória, e adotando um estilo de vida saudável. É igualmente necessário valorizar os sintomas para tratar precocemente no local adequado e com a terapêutica mais indicada, sensibilizando a população para o impacto social e económico da doença.
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