"Todos os dias têm de ler um bocadinho. Não há ecrãs a seguir ao jantar"
Estivemos à conversa com Mariana Alvim, escritora e locutora da RFM.
© Soraia do Carmo
Fama Mariana Alvim
Mariana Alvim. O nome é familiar aos que ouvem o 'Café da Manhã', na RFM. Foi na rádio que a comunicadora conquistou o carinho do público, no entanto, esta não foi a sua primeira paixão. Desde a infância é amante de literatura, por isso, logo aos 13 anos confessou que queria ser escritora.
Quis a vida que optasse pelo Marketing já em adulta. Ao fim de sete anos numa carreira que já não a fazia feliz arriscou-se na escrita, tornando-se guionista de algumas das temporadas da série juvenil de sucesso 'Morangos com Açúcar' e ainda de uma novela da noite.
Nesta época inicia a escrita de um livro dedicado a adolescentes que terminou recentemente e que se intitula 'Estou Tramada', pertencente à coleção 'Os Fininhos'.
Como é que apresentaria este livro?
Basicamente é um livro para adolescentes que tinha começado a escrever há uns anos. Escrevi o primeiro volume que é o 'Amigas à Força' e o segundo que é 'Consequências Inesperadas'. No primeiro temos como protagonistas raparigas de 15 anos e no segundo, embora seja o mesmo grupo de amigos, dou mais destaque aos rapazes de 18. A ideia é conseguir apanhar adolescentes de todos os géneros.
Por mais que as coisas tenham mudado não deixamos de ser os mesmos seres humanos. As fraquezas e inseguranças são as mesmas Uma vez que o começou a escrever há alguns anos, teve de fazer adaptações, correto?
Foi para aí há oito anos que escrevi e achei que era só reler e escrever o terceiro. Mas nessa altura as amigas trocavam emails e não havia Instagram ou WhatsApp. Elas não iam sequer à Internet nas férias.
Mas porquê dirigido para adolescentes?
Escrevi 'Morangos com Açúcar', nessa altura já era guionista. Fiz parte da equipa, escrevi três séries e depois a novela da noite. Na altura, uma editora propôs a escrita de um livro para adolescentes porque ainda não havia muita coisa. Comecei a pensar como é que tinha sido a minha adolescência, porque por mais que as coisas tenham mudado não deixamos de ser os mesmos seres humanos. As fraquezas e inseguranças são as mesmas.
Quando estava como senior no Marketing já não era tão feliz. Ganhei coragem, larguei tudo, preguei um susto aos meus pais e tornei-me guionista dos 'Morangos com Açúcar'
A Mariana sempre quis escrever? Era esse o seu desejo?
Com 13 anos disse à minha professora de português que quando fosse grande queria ser escritora. Quando tirei o curso na faculdade de Comunicação [Empresarial], a achar que ia ser jornalista, apaixonei-me pela rádio. Por força das circunstâncias comecei a trabalhar em Marketing. Então, fui tirando cursos paralelos de comunicação e escrita criativa. Quando estava como senior no Marketing já não era tão feliz. Ganhei coragem, larguei tudo, preguei um susto aos meus pais e tornei-me guionista dos 'Morangos com Açúcar'.
Tinha quantos anos?
Lembro-me perfeitamente de pensar: 'Tenho 28 anos e um filho, portanto, é agora que eu arrisco, não vai ser aos 40'. Foi uma mudança na minha vida e também um sacrifício pessoal, familiar e financeiro até.
Correu bem e ao fim de dois anos e quase quatro novelas fui para um casting na RFM, tendo sido a feliz vencedora. A Carla Rocha teve um bebé e ia para casa durante quatro meses por causa da licença de maternidade e fez-se um casting para ver quem é que ficava com o lugar dela.
Sendo esta uma história para adolescentes teve de voltar atrás no tempo e recordar também a sua adolescência. Há alguma coisa aqui que tenha sido a Mariana a ter vivido?
A protagonista é muito magrinha e tem complexos por isso mesmo e eu era assim: uma adolescente demasiado magra, que usava óculos e tinha esta voz grossa, por isso não foi fácil [diz, enquanto se ri]. Mas não é de todo autobiográfico, até porque a protagonista, a Margarida, está apaixonada pelo Gonçalo e a Catarina é uma 'boazona' (eu não tive Catarina nenhuma na minha vida). Cheguei a ter um ou outro fraquinho [por rapazes] que as jeitosas é que ficavam com eles, mas não me deixou traumas.
Não quero ser moralista para não ser chata, porque quero atrair os jovens
Quais são os temas abordados na história?
Há um miúdo que tem os pais a separarem-se. Há outro que tem vergonha de assumir publicamente que gosta de escrever, outro que finge que está tudo bem, mas depois tem imensas inseguranças. Não quero ser moralista para não ser chata, mas acabo por abordar um bocadinho de cada coisa da realidade dos jovens hoje em dia. Há uma saída à noite com consequências inesperadas, complexos de miúdas, mal entendidos entre amigas...
© DR
Qual é a diferença entre escrever para adolescentes e escrever para adultos?
Há uma diferença técnica que sentia quando escrevia 'Morangos com Açúcar' e a novela da noite. Os jovens é preciso mais ritmo. Tem de acontecer muita coisa, ser menos profundo e mais rápido.
É como se de repente o meu filho já não fosse uma pessoa que conheço assim tão bem e isso assusta-me O que é que mais assusta a Mariana Alvim ao observar os adolescentes da atualidade?
Nós não crescemos com telemóvel. Tenho um filho adolescente que no outro dia disse-me que viu uma série. Um ano antes tinha-me pedido para ver e eu não deixei. Pensei que controlava a televisão em casa e ele disse-me que tinha visto no telemóvel. Ou seja, há todo um mundo que eu não tenho acesso e não controlo. Há coisas que tento controlar, por exemplo, quando vai para a cama o telemóvel dele fica no meu quarto. É como se de repente o meu filho já não fosse uma pessoa que conheço assim tão bem e isso assusta-me.
Aí já se lembra de algumas das palavras dos seus pais que agora fazem sentido?
Já as repito! Dou por mim a dizer aqueles clichês: 'Já tive a tua idade'. Quando começarem a sair à noite não vou estar preparada, quando tiverem namoradas… vou ser uma sogra péssima [afirma, em jeito de brincadeira].
O que gostava que os seus filhos aprendessem com este livro?
O mais velho já o leu. Houve perguntas que estava à espera que ele me fizesse e não fez, o que quer dizer que já sabe mais do que pensava. O meu objetivo é que os jovens se identifiquem sem perceberem que foi escrito por um adulto que lhes quer ensinar alguma coisa. Em 'As Consequências Inesperadas' mostram que as asneiras que eles fizeram à noite se calhar era melhor não terem feito. Mas não é de todo moralista. Simplesmente mostro que há consequências e as personagens são perfeitamente normais.
Podemos esperar novos projetos?
O que eu ando a mastigar já há demasiados anos e tenho alguma coisa no papel é um romance para mulheres.
As mulheres ainda têm de provar muito. Acho que têm de usar mais a inteligência emocional Porquê para mulheres?
Porque gosto muito de ler romances. Há conversas que são precisas de ter e não estou a falar de feminismos, mas conversas entre amigas. Tenho um site chamado 'Entre Amigas' com contos. No outro dia, havia um que contava a história de uma mulher que foi à bomba de gasolina, viu um homem ao lado dela e percebeu que ele lhe achou graça. Só que era casada e não alimentou a coisa. Mas fez-lhe bem ao ego perceber que ainda tem alguma coisa nela. Recebi o comentário de uma senhora a dizer que bom que é fazerem-nos bem ao ego.
Sente de que certa forma inspira outras mulheres? Alguma técnica que queira partilhar para conseguir conciliar tantas coisas?
Uma vez uma amiga disse-me que há uma diferença entre o querer e o gostar. Gostava de ser mais magra, está bem, mas se me derem chocolate eu vou comer. Realmente acordo demasiado cedo, tenho três filhos, estou cansada, tenho uma profissão exigente.
O dia tem 24 horas, é uma questão de gerir o meu tempo. Nem que fosse duas horas por dia ia para a biblioteca escrever, porque já sei que em casa acabo por não fazer nada. É disciplina e sobretudo força de vontade.
A Mariana considera que as expectativas em relação às mulheres ainda são demasiado altas?
Acho que são. Tenho amigas super trabalhadoras com filhos e uma vida agitadíssima, mas ainda esperam da parte delas o que é o jantar, ou as compras de supermercado, ou a gestão da casa. A gestão da casa antes era uma profissão. Hoje ainda há um bocadinho esse hábito. Já muito foi ultrapassado, mas as mulheres ainda têm de provar muito. Acho que as mulheres têm de usar mais a inteligência emocional.
Lá em casa ponho um limite de televisão e disse que todos os dias têm de ler um bocadinho ao fim dos trabalhos de casa. Não há ecrãs a seguir ao jantarRecentemente fez uma publicação no Instagram a marcar 16 anos de casamento. Algum segredo?
Acho que sobretudo é falar. Temos de esclarecer tudo um com o outro. Graças a Deus ainda estamos apaixonados, também pode ser sorte, é preciso querer. Eu era uma miúda quando o conheci e hoje sou uma mulher, mas nós crescemos na mesma direção, ainda há muito amor e companheirismo.
Ver esta publicação no Instagram
Como é que podemos incentivar os adolescentes a ler mais?
É muito mais fácil pegar num consola do que ler. Até as minhas amigas quando me dizem que não têm tempo para ler eu pergunto: 'O que é que fazes a seguir ao jantar?'. Vão ver uma série, eu não, vou para a cama ler.
Lá em casa ponho um limite de televisão e disse que todos os dias têm de ler um bocadinho ao fim dos trabalhos de casa. Não há ecrãs a seguir ao jantar. Agora até vão mais cedo para a cama para lerem, quer queiram, quer não. Mas também não posso obrigá-los a lerem um livro que não gostam. Há que descobrir um género que apreciem.
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