Afinal, o que é a síndrome de Tourette? Que tiques causa? Médica explica

Esta semana, na rubrica O Médico Explica, esclarecemos algumas dúvidas sobre a síndrome de Tourette com Mónica Vasconcellos, neurologista pediátrica e presidente da Sociedade Portuguesa de Neurologia Pediátrica.

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Margarida Ribeiro
11/04/2023 08:22 ‧ 11/04/2023 por Margarida Ribeiro

Lifestyle

O Médico Explica

Hoje em dia, graças a artistas extremamente conhecidos, como Billie Eilish e Lewis Capaldi, muito se fala sobre a síndrome de Tourette. Trata-se de uma condição que muitos reconhecem pelos tiques vocais, nomeadamente, dizer asneiras, mas existem outros e mais coisas a saber. 

Tendo isto em conta, o Lifestyle ao Minuto, fez algumas questões a Mónica Vasconcellos, neurologista pediátrica e presidente da Sociedade Portuguesa de Neurologia Pediátrica (SPNP), sobre este "distúrbio neuropsiquiátrico caracterizado por múltiplos tiques motores e fonéticos, que flutuam de intensidade".

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"Não existe atualmente terapêutica curativa" e todos os tratamentos aplicados servem como forma de atenuar os tiques, se "estes interferirem na qualidade de vida da criança ou jovem", esclarece a médica. 

Para ser considerado o diagnóstico de Tourette, é necessário que existem vários tiques motores e "um ou mais tiques vocais, que ocorrem várias vezes ao dia, durante um período superior a um ano". Geralmente, "a idade de início é sempre antes dos 18 anos", acrescenta. 

Notícias ao Minuto Presidente da Sociedade Portuguesa de Neurologia Pediátrica© Mónica Vasconcellos  

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O que é a Síndrome de Tourette? 

A síndrome de Tourette (ST) é um distúrbio neuropsiquiátrico caracterizado por múltiplos tiques motores e fonéticos, que flutuam de intensidade, com um padrão característico de exacerbações e remissões ao longo do tempo.

O que a causa?

Tem uma etiologia multifactorial, em que fatores genéticos estão claramente implicados.

Normalmente é diagnosticada em que idades? 

A apresentação inicial mais frequente é com tiques motores simples (frequentemente tiques palpebrais e movimentos cefálicos, que surgem em média por volta dos 7 anos) e cerca de dois a três anos depois surgem os tiques vocais. Novos tiques podem substituir os anteriores ou associarem-se num crescente, tendo esta doença uma expressão máxima por volta dos 10 a 12 anos de idade.

Não tem cura, mas gerir os tiques é possível? Como?

A abordagem terapêutica dos tiques deve ser discutida em conjunto com os pais e/ou cuidadores e baseada no nível de impacto funcional e psicológico causado. Não existe atualmente terapêutica curativa; o tratamento é sintomático e tem como objetivo reduzir os tiques, se estes interferirem na qualidade de vida da criança ou jovem.

A terapia comportamental, com treino de reversão de hábitos para tiques e intervenção comportamental compreensiva para tiques, tem demonstrado eficácia. O tratamento farmacológico deve ser reservado para os casos mais graves, se os tiques causam dor ou injúria, se interferem nas relações sociais da criança ou se interferem funcionalmente na vida quotidiana.

Quais são as melhores formas de lidar com a doença?

É importante avaliar o impacto que os tiques têm no ambiente familiar, perceber como é que os pais lidam com os tiques. Deve ser explicada a evolução natural da doença, relembrar que os tiques devem ser ignorados, ao contrário de castigar a criança ou pedir-lhe constantemente que pare (os tiques são movimentos involuntários). Enfatizar que os tiques têm uma evolução flutuante, com períodos de remissão e exacerbação, independentemente do tratamento farmacológico

O tratamento dos tiques com fármacos é puramente sintomático, não altera o prognóstico da doença. Ou seja, os fármacos podem atenuar os tiques, mas não os eliminar por completo. É ainda muito importante o tratamento das co-morbilidades associadas. 

Que tipo de ajuda deve procurar uma pessoa que recebeu este diagnóstico? 

De acordo com a gravidade dos tiques, o impacto funcional será diferente. Nos casos mais graves, podem ocorrer problemas psicossociais, como isolamento social, conflitos interpessoais, vitimização por pares e disrupção nos ambientes escolar e familiar, com diminuição da qualidade de vida e sofrimento psicológico associado. Estes indivíduos devem ser referenciados para intervenção comportamental e acompanhamento médico (pedopsiquiatria ou neuropediatria).

Muitos acham que o tique mais comum é dizer asneiras sem querer. Existem outros. Quais são?

Os tiques podem classificar-se em motores ou vocais e, ambos, em simples ou complexos. Caracteristicamente, na ST os tiques flutuam em tipo, frequência, gravidade e localização, ao longo do tempo. Geralmente, evoluem de simples para complexos, numa progressão rostro-caudal e com um padrão característico de exacerbações e remissões.

Os tiques motores complexos envolvem atividades motoras sequenciais ou movimentos decorrentes da ação coordenada de diversos grupos musculares, copropraxia (gestos obscenos), ecopraxia (imitar os outros). Os tiques vocais complexos envolvem sílabas, palavras, frases ou sons musicais; pode ocorrer coprolália (dizer asneiras) e ecolália (repetir os sons e as palavras de terceiros).

Como se distinguem os tiques que estão relacionados com Tourette dos que não estão?

O diagnóstico de ST implica a presença de tiques motores múltiplos e um ou mais tiques vocais, que ocorrem várias vezes ao dia (praticamente diários), durante um período superior a um ano. A idade de início é sempre antes dos 18 anos.

Consegue ser uma doença incapacitante? Em que tipo de casos?

Os tiques de uma forma geral e, em especial, na ST estão associados a várias co-morbilidades e problemas de comportamento que muitas vezes são mais incapacitantes do que os próprios tiques (exemplo: perturbação de hiperatividade e défice de atenção, comportamentos obsessivo-compulsivos, distúrbios de ansiedade, depressão, perturbações do sono, comportamento oposição-desafio...)

É algo que vai melhorando e acalmando ao longo dos anos? Ou mantém-se estagnado e vai manifestando sempre os mesmos problemas?

O pico da gravidade da doença é por volta dos 10-12 anos de idade e os tiques diminuem de frequência na adolescência ou no início da idade adulta.

A evolução é flutuante, variando na sua forma, localização e frequência, sendo possíveis períodos variáveis de tempo sem tiques.

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