Há problemas que são mais ou menos comuns à maioria das pessoas. Manter a 'chama' do amor acesa numa relação longa é um desses dilemas e não tem nada de simples, mas é possível. Possível, porém, difícil e complexo.
Quando a fase de 'lua de mel' e o fogo da paixão dão lugar a um amor mais maduro, o romance pode desvanecer e, volta e meia, tudo serve de pretexto para picardias. Mas isso não quer dizer que a relação esteja condenada ao fracasso, ainda que, no entender do neuropsicólogo e hipnoterapeuta Alberto Lopes, das Clinicas Dr. Alberto Lopes, a "luta pelo amor" pareça ter "perdido o seu valor". "Vivemos tempos em que encontrar alguém que deseje uma relação séria e comprometida parece ser excepcionalmente difícil", disse, em entrevista ao Lifestyle ao Minuto.
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"Para manter a chama acesa na relação, é essencial compreender que não existe uma fórmula mágica", sublinha, acrescentando que requer "a construção consciente de uma base sólida de amor, amizade, intimidade e projetos compartilhados". "Tudo isso firmemente apoiado pela comunicação eficaz."
Alberto Lopes© Clínicas Dr. Alberto Lopes
Existem casais que permanecem juntos mesmo que já não se sintam apaixonados, para corresponderem aos padrões da sociedade e por medo de refazerem as suas vidas?
As dinâmicas relacionais estão em plena transformação, ainda que persistam casamentos que se assemelham mais a contratos de conveniência do que a uniões movidas por amor genuíno. Muitos destes relacionamentos, sustentados por pressões familiares e sociais ou pelo medo da solidão, falham em buscar uma parceria equilibrada. Em vez disso, de forma inconsciente, procuram-se substitutos de figuras parentais, criando uma dinâmica de dependência que está fadada ao fracasso.
A transição da paixão para um amor mais maduro não só é natural como também aconselhável. É um alicerce para relações duradouras e significativas
Diz-se que as relações de hoje em dia tendem a ser menos duradouras. Porquê?
Em parte porque damos mais atenção aos nossos dispositivos eletrónicos do que aos nossos parceiros. A luta pelo amor parece ter perdido o seu valor e a ideia de substituição tornou-se um caminho mais fácil do que o compromisso de reparar e fortalecer uma relação. Vivemos tempos em que encontrar alguém que deseje uma relação séria e comprometida parece ser excecionalmente difícil.
Nota um padrão?
A tendência é procurar relacionamentos leves, sem compromisso, esquivando-se das responsabilidades que um lar compartilhado exige. Os números são inequívocos. Olhemos para dados da Pordata. Em 2022, estima-se que tenham existido 50 divórcios por 100 casamentos. Se recuarmos a 1960, por exemplo, existiam 1,1%, de divórcios. Infelizmente, aquilo que mais observamos é a busca por um relacionamento que se baseia na necessidade económica ou vemos que existe uma dinâmica em que ambos assumem papéis parentais, inclusive na forma como se dirigem um ao outro no dia a dia. Isto é uma bandeira vermelha e um sinal de que o verdadeiro significado de um casamento baseado na parceria amorosa ainda não foi compreendido.
Por falar em 'red flags', há quem considere que o conforto numa relação é uma bandeira vermelha. É realmente assim?
Não me parece. Aliás, essa evolução pode bem ser um indicador de maturidade. A transição da paixão para um amor mais maduro não só é natural como também aconselhável. É um alicerce para relações duradouras e significativas. No meu mais recente livro, 'Nem Sempre Faço Sexo, mas Todos os Dias Faço Amor', destaco as três fases do amor: a paixão, o amor passional e o amor companheiro. Esta progressão da fase da paixão para um amor mais maduro e estável é um processo natural e desejável para o fortalecimento da relação entre o casal. A paixão traz consigo uma felicidade efémera, impulsionada por neurotransmissores associados ao prazer. Estes neurotransmissores ativam circuitos no cérebro que são semelhantes aos estimulados pelo uso de drogas, criando uma experiência quase transcendental. Este período de atração intensa dura entre seis a dezoito meses e é marcado pela liberação de dopamina, oxitocina e endorfinas. No entanto, após esta fase inicial de euforia, migramos para uma fase de amor caracterizada por uma maior maturidade e consciência.
Isso quer dizer que esse arrefecer da paixão até pode ser benéfico?
Sim, pode contribuir para a estabilidade do relacionamento, uma vez que dá lugar a um amor fundamentado na cumplicidade, no respeito mútuo e na partilha do quotidiano. Nesta fase, a intimidade transcende o mero desejo físico, apoiando-se também na admiração e no apoio mútuo face aos desafios.
O meu conselho mais precioso: primeiro escolha a pessoa com quem quer passar o resto da sua vida com amor e depois ame a sua escolha
Agora, a pergunta de milhões. Apesar de não existir uma fórmula exata, como é que se pode manter a chama acesa numa relação longa?
O dramaturgo e escritor brasileiro Caio Fernando Abreu dizia que a vida é feita de escolhas. "Primeiro fazemos as nossas escolhas, depois as nossas escolhas fazem-nos." E eu não podia concordar mais. O amor maduro é, na verdade, uma escolha deliberada e um estado de alma sublime. Para manter a chama acesa na relação, é essencial compreender que não existe uma fórmula mágica. Quando se encontra alguém com quem existe uma forte atração, com quem se partilha risos e momentos felizes e se revela um companheiro exemplar, surge a fase do amor maduro. Agora, para se tornar num amor companheiro é algo que deve ser construído diariamente, mas vale sempre a pena. Um amor companheiro assemelha-se a um refúgio que nos dará estabilidade emocional e sentido de pertença. Portanto, manter a chama acesa na relação envolve mais do que simples gestos românticos.
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Requer o quê?
A construção consciente de uma base sólida de amor, amizade, intimidade e projetos compartilhados, tudo isso firmemente apoiado pela comunicação eficaz. Para mim, estes são os pilares que, juntos, formam uma relação madura, estável e, acima de tudo, profundamente conectada. O meu conselho mais precioso: primeiro escolha a pessoa com quem quer passar o resto da sua vida com amor e depois ame a sua escolha. No meu livro abordo esta dinâmica através de uma analogia que denomino 'a Cadeira do Amor'. Esta metáfora ilustra os elementos fundamentais para a construção de uma relação sólida e equilibrada. Ou seja, se quiser estabelecer um amor companheiro, deve seguir algumas dicas, as 'quatro pernas da cadeira do amor':
1- Amor consciente: a primeira perna da nossa 'cadeira do amor' é, naturalmente, o vínculo que atrai e mantém o casal unido;
2- Amizade e cumplicidade: a segunda 'perna' é essencial para a força do relacionamento;
3- Sexualidade: não sejamos tímidos, a importância da intimidade física não deve ser subestimada. O sexo, quando entrelaçado com amor, enriquece a relação, tornando-a mais satisfatória e plena.
4- Partilha e projeto a dois: ter objetivos comuns e trabalhar juntos para realizá-los fortalece o compromisso mútuo e solidifica a relação.
Finalmente, não esquecer que a base que sustenta estas pernas é uma comunicação afetiva e efetiva. Um diálogo sincero e aberto é o alicerce que permite que todos esses elementos se mantenham firmes e coesos. A capacidade de expressar sentimentos, desejos e preocupações de maneira clara e respeitosa é crucial para a saúde e o desenvolvimento da relação.
Sobre a questão da sexualidade, é sabido que a componente sexual e a intimidade são necessárias para nos mantermos ligados à pessoa que está ao nosso lado. Nesse sentido, como ultrapassar a falta de desejo?
Concordo que amor e sexo são fundamentais num relacionamento. Freud já destacava como se sentir amado fortalece uma pessoa, enfatizando que a realização sexual vem de se sentir valorizado por alguém. No entanto, nem sempre nos encontramos recetivos à sexualidade, mas a ausência de desejo sexual pode ser superada com diálogo aberto sobre preferências sexuais, apoio profissional e exploração de novas formas de intimidade. A sexualidade, especialmente no amor companheiro, é vital para manter a relação coesa. Sugiro ainda que o quarto seja um espaço reservado ao sono e à intimidade, livre de distrações - sobretudo digitais.
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