Todos os anos são diagnosticados em Portugal cerca de três mil novos casos de cancro ginecológico. Os cancros do endométrio, colo do útero, ovário, vulva e vagina são os cinco principais em Portugal, sendo o do endométrio o mais frequente e o do ovário o mais letal. A adoção de estratégias para o aumento do diagnóstico precoce é decisiva para garantir um prognóstico mais favorável. Porém, dados apontam que as mulheres são diagnosticadas mais tarde do que os homens em relação a 700 doenças.
Ainda assim, "em Portugal, não reconheço desigualdade no acesso aos cuidados de saúde nem à investigação entre mulheres e homens", frisa Cristiana Marques, médica oncologista da Unidade Local de Saúde Gaia e Espinho, em entrevista ao Lifestyle ao Minuto. Admite, no entanto, que o acesso à inovação terapêutica "está particularmente comprometido" no cancro do ovário, "nomeadamente no acesso a tratamento de manutenção após a quimioterapia". Por cá, "apenas uma minoria das doentes tem acesso aos mesmos".
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Considera que é dada uma menor atenção à saúde das mulheres? Segundo um relatório do Fórum Económico Mundial divulgado em janeiro, ainda que as mulheres vivam em geral mais tempo do que os homens, a sua qualidade de vida é inferior devido à desigualdade existente ao nível da investigação e tratamentos médicos.
Do ponto de vista global, essa pode ser uma realidade em muitos países. Contudo, em Portugal, não reconheço desigualdade no acesso aos cuidados de saúde nem à investigação entre mulheres e homens.
Fala-se em falta de equidade no acesso ao tratamento do cancro e em disparidades na incidência e mortalidade provocadas por esta doença. É assim?
Em relação ao acesso à inovação terapêutica, esta está particularmente comprometida no cancro do ovário, nomeadamente no acesso a tratamento de manutenção após a quimioterapia. Estes tratamentos são, neste momento, o estado da arte, mas em Portugal apenas uma minoria das doentes têm acesso aos mesmos.
O que são exatamente cancros ginecológicos?
Referem-se a tipos de cancro que afetam os órgãos reprodutivos femininos, como o útero, os ovários, o colo do útero, a vagina e a vulva. Os cancros ginecológicos mais comuns são o cancro do colo do útero, o cancro do endométrio (cancro do útero) e o cancro do ovário. Cada um destes tipos de cancro tem causas, sintomas, fatores de risco e tratamentos específicos.
Quais os fatores de risco?
Dependem do tipo de cancro. No cancro do ovário destacaria o histórico familiar, a presença de mutação BRCA, a nuliparidade e a idade. No cancro do endométrio, a idade avançada, a obesidade, a terapia hormonal após menopausa. Quanto ao cancro do colo uterino/vagina/vulva, destaco a infeção por Vírus do papiloma humano (HPV), a infeção pelo Vírus do Papiloma Humano, o tabagismo, ausência de vacinação para o HPV.
Tem ideia de quantos casos são detetados anualmente em Portugal?
De acordo com os dados do Globocan, foram diagnosticados em 2022 cerca de 1400 cancros do corpo uterino, cerca de 900 cancros do colo uterino e cerca de 700 cancros do ovário.
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Quais são os sintomas mais frequentes?
Podem variar dependendo do tipo específico de cancro e do estadio da doença. No entanto, alguns sintomas comuns que podem indicar a presença de cancros ginecológicos:
- Sangramento vaginal anormal, por exemplo, sangramento entre os períodos menstruais, sangramento após a relação sexual, sangramento após a menopausa ou períodos menstruais mais abundantes ou prolongados do que o normal;
- Dor pélvica ou abdominal, isto é, dor persistente ou desconforto na região pélvica ou abdominal, que não está relacionado com o ciclo menstrual ou outras condições benignas;
- Alterações urinárias ou intestinais, nomeadamente dificuldade/ dor para urinar, aumento da frequência urinária ou alterações nos hábitos intestinais, como obstipação ou diarreia;
- Dor durante as relações sexuais, pode ser um sintoma de cancros ginecológicos, especialmente quando é persistente e não relacionada com outras condições, como infeções, secura vaginal, secreção vaginal anormal, por exemplo com odor forte, sangue ou uma cor anormal.
- Aumento do volume abdominal. Pode ocorrer devido ao crescimento de um tumor nos ovários ou no útero;
- Perda de peso ou cansaço inexplicado.
Podem ser facilmente confundidos?
Sim. Os sintomas são comuns a outras doenças, nomeadamente infeções ou neoplasias benignas. Por isso, é fundamental consultar um médico para obter um diagnóstico preciso e a orientação adequada.
Quais são as faixas etárias mais afetadas?
As faixas etárias mais afetadas pelo cancro ginecológico variam dependendo do tipo específico de cancro. No entanto, de forma geral, o cancro do colo do útero (cervical) é mais comum em mulheres entre os 30 e os 50 anos. Já os cancros do corpo uterino e do ovário são mais comuns em mulheres após a menopausa, geralmente após os 50 anos de idade. No entanto, também pode afetar mulheres mais jovens.
Dos cancros ginecológicos mencionados, o cancro do ovário é o que tem um crescimento silencioso e os sintomas mais inespecíficos, pelo que são frequentemente confundidos com outras etiologias, levando a um atraso no diagnóstico
Começam a ser diagnosticados em idades cada vez mais jovens?
Sim e existem alguns fatores que podem contribuir para isto, como a mudança nos hábitos alimentares, estilo de vida sedentário, o aumento da obesidade e o consumo de álcool e tabaco em idades mais jovens.
Estes cancros são esquecidos?
Dos cancros ginecológicos mencionados, o cancro do ovário é o que tem um crescimento silencioso e os sintomas mais inespecíficos, pelo que são frequentemente confundidos com outras etiologias, levando a um atraso no diagnóstico. É importante que as utentes, procurem consulta médica quando os sintomas persistem. Não existe método de rastreio validado para o cancro do ovário.
Que estratégias devem ser adotadas para aumentar o diagnóstico precoce e, assim, garantir um desfecho favorável?
A deteção precoce é crucial para o tratamento bem-sucedido dos cancros ginecológicos. Para aumentar o diagnóstico precoce e garantir melhores desfechos para as doentes, é fundamental a educação sobre cancros ginecológicos, nomeadamente dos sintomas que motivam observação médica e dos fatores de risco associados. A adesão à vacinação para o HPV, bem como ao programa de rastreio do cancro do colo uterino com o teste HPV, são também essenciais para um diagnóstico precoce.
O exame do Papanicolau deve fazer parte dessa estratégia?
Atualmente, o rastreio do cancro do colo uterino faz-se nas mulheres com idades compreendidas entre os 25 e os 65 anos, com teste do HPV de cinco em cinco anos e citologia reflexa. É importante salientar que o rastreio baseado no teste do HPV tem proteção de 60%/70% superior para cancro invasivo comparativamente ao rastreio baseado em citologia/Papanicolau.
É importante uma abordagem multidisciplinar no tratamento do cancro ginecológico em mulheres que planeiam ser mães?
É importante em todos os cancros ginecológicos, incluindo as mulheres que planeiam ser mães.
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