Pais separados. Como ultrapassar divergências e sobreviver ao Natal

Com o objetivo de ajudar as famílias, estivemos à conversa com a psicóloga Sofia Câmara, da Sociedade Portuguesa de Psicossomática.

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Ana Rita Rebelo
23/12/2024 07:46 ‧ há 3 horas por Ana Rita Rebelo

Lifestyle

Entrevista

Em muitas famílias, esta é a altura do ano em que a palavra de ordem é união. No entanto, quando falamos de filhos de pais separados, o sentimento nem sempre é esse e o simbolismo da época natalícia choca com uma enorme angústia pela logística envolvida e possíveis discordâncias.

 

Como se decide com quem a criança passa o Natal? Apesar de não ter uma resposta concreta à pergunta, a experiência da psicóloga Sofia Câmara, da Sociedade Portuguesa de Psicossomática, diz-lhe que, "na maior parte dos casos, estas datas são passadas de forma alternada com um dos progenitores, para assim equilibrar, de certa forma, as experiências com ambos os lados da família". 

"Apesar de as crianças supostamente não decidirem onde ficam ou não, acho que é um dever nosso ouvir sempre o que nos têm a dizer e o que preferem", acrescenta a especialista, em entrevista ao Lifestyle ao Minuto.

O Natal pode ser uma altura desafiante para casais separados com filhos pelo meio. Como proporcionar uma época festiva feliz a estas crianças? É possível um 'reencontro'?

Como em tudo, depende de vários fatores. Tem de haver autoconsciência e maturidade por parte dos pais e mães para perceber se esta reunião será um momento acolhedor e não mais um campo de batalha e de agressões, expondo as crianças ao ambiente tóxico que irá permanecer nas memórias de todos, podendo ainda fazer com que esta altura seja associada a uma época traumática, o que, infelizmente, acontece com tantas famílias. Caso seja uma família que, apesar de ter tido uma rutura, consiga manter uma relação saudável, poderá haver este reencontro, mas isso depende das tradições de cada um.

Muitas vezes há esta questão de que estar num lado é abandonar o outro, uma vez que muitos pais e mães não conseguem esconder a tristeza da separação

Esta pode ser uma situação stressante para as crianças? Como abordar o tema com elas?

O Natal será sempre um momento feliz se as pessoas estiverem tranquilas e felizes. Para filhos de pais separados - e para os pais também -, estes dias serão recheados de bons momentos e outros de muitas saudades. No entanto, cabe ao adulto gerir isto da melhor forma com a criança, mostrando, por exemplo, que a saudade faz parte, mas isso não implica que estamos a abandonar lugar nenhum, que a distância não afasta os sentimentos e ainda que, o facto de sermos felizes num lugar, não implica que estamos a abandonar o outro.

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Como podem os pais ajudar os filhos?

Muitas vezes há esta questão de que estar num lado é abandonar o outro, uma vez que muitos pais e mães não conseguem esconder a tristeza da separação, fazendo com que se acentue mais esta culpabilidade de ser feliz quando não se está com um dos dois. Uma das formas de desfazer isto é mostrar que o amor é mais forte que a distância e que faz com que fiquemos felizes por ver o outro bem, seja connosco ou não. Não deve transferir para a criança a lacuna que fica quando não a tem perto de si. 

Notícias ao Minuto © Sofia Câmara, psicóloga da Sociedade Portuguesa de Psicossomática

E quando a solução é a alternância anual da noite de Natal dos filhos em casa de cada um dos pais? Como lidar com a situação?

Na maior parte dos casos estas datas são passadas de forma alternada com um dos progenitores, para assim equilibrar, de certa forma, as experiências com ambos os lados da família. Normalmente esta é uma decisão standard, muitas vezes planeada na regulação das responsabilidades parentais, no momento da separação.

Os filhos devem ser ouvidos e decidir em que casa querem ficar? A decisão deve ser tomada em conjunto?

Apesar de as crianças supostamente não decidirem onde ficam ou não, acho que é um dever nosso ouvir sempre o que nos têm a dizer e o que preferem. Não para serem elas próprias a decidirem sozinhas, mas sim porque um dos seus direitos é serem ouvidas, independentemente da idade. E o que dizem e sentem deve sempre ser tido em consideração.

Aos pais que este ano não passarão o Natal com os filhos deixo a sugestão de tentarem passá-lo com outras pessoasE se a criança se recusa a ir para a casa suposta durante o Natal, deve ser forçado a tal? Que conselhos deixa aos pais que, este ano, não vão passar a noite de Natal com os filhos? 

Quando se trata de pais e mães funcionais a nível prático e emocional e que sabem olhar para a criança independentemente dos seus conflitos, conseguem, em conjunto, perceber as causas de uma possível recusa em passar o Natal com um dos dois. Põem os seus egos de lado e decidem o melhor para aquela criança naquele momento. Infelizmente, isto nem sempre acontece. Existem situações delicadas em que a recusa em estar com um dos progenitores está relacionada com situações graves, como contextos de violência doméstica. Muitas vezes, a presença da criança é sentida por um dos progenitores e pela própria como um dever, em vez de ser vista, por outro lado, como um direito da criança de poder ter a presença de ambos os progenitores. Nunca uma imposição.

Isso seria tema para outra conversa.

Sim...

Como é que estes pais se podem preparar para passar um Natal sem a família?

Aos pais que este ano não passarão o Natal com os filhos deixo a sugestão de tentarem passá-lo com outras pessoas que os aqueçam também. É normal sentirem tristeza e saudade. No entanto, devem evitar ficar submersos na nostalgia dos Natais em que todos estavam presentes. Será útil interiorizar que alguns Natais de agora em diante serão diferentes e aquilo que faltará num, irá recuperar-se no outro. E se se perceber que os filhos estão felizes e tranquilos com o outro progenitor, que isto seja uma forma de aceitar esta mudança.

E quando é o pai ou a mãe a rejeitar passar o Natal com os filhos?

Acredito que seja importante passarmos o Natal com outras pessoas que também nos preenchem e nos aquecem nestes momentos. Poderão até criar-se novos rituais nos Natais em que estão sem os filhos, aproveitar outros momentos e vivê-los sem culpabilidade. Na verdade, é muito comum o sentimento de culpa também nos pais e mães que se divertem na ausência dos filhos. Mas tal como deverá ser dito aos filhos, o facto de nos conseguirmos divertir na ausência deles, não significa que os estamos a abandonar.
  
Que consequências pode ter esta 'rejeição' nas crianças?

Infelizmente, alguns progenitores não priorizam os momentos em família e após a separação, começam a centrar-se principalmente em si e na sua vida pessoal, acabando por colocar estas épocas num plano secundário das suas vidas. Apesar de poder não ser o objetivo destes progenitores, a criança inevitavelmente sentirá este comportamento como rejeitante ou mesmo como um abandono. Cabe a quem acompanha a criança amparar este sentimento, tentando colmatá-lo com a presença e o carinho de quem está.

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