A linguagem dos bebés. O que querem eles dizer-nos?
Perceber aquilo que um bebé diz não é fácil, mas está longe de ser impossível. Falámos com a terapeuta da fala Joana Rombert sobre a importância do afeto na comunicação dos bebés e dos pais.
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Lifestyle Joana Rombert
O bebé chora, o bebé sorri, o bebé imita, o bebé mexe-se, o bebé comunica. A comunicação do bebé começa ainda na fase intra-uterina, com os pontapés que dá na barriga mãe. Mas, que tanto comunica o bebé?
Muita coisa, especialmente curiosidade, afetos e necessidades. Os bebés querem que alguém responda aos seus pedidos fisiológicos, mas querem também muitos mimos, atenção e sempre alguém por perto. Os bebés querem comunicar e os pais devem responder. Afinal, até com os bebés é 'a falar que a gente se entende'.
Segundo a terapeuta da fala Joana Rombert, responder ao bebé, ou seja, comunicar com ele à maneira dele, ajuda a que a sua capacidade de relacionar-se e expressar-se – consigo mesmo ou com os outros – seja melhor. A existência de um “cuidador principal” (sejam os pais em conjunto ou separadamente ou até mesmo um dos avós ou tios) é fundamental para que a capacidade comunicativa não fique comprometida.
Em conversa com o Lifestyle ao Minuto, a especialista salienta que “o mais importante é que haja um cuidador principal. Se for sempre uma avó ou sempre um avô também poderá fazer esse papel de interlocutor, estamos a falar de laços. Conseguimos criar laços com alguém e, por isso, conseguimos melhor comunicar”.
No caso de crianças institucionalizadas, “como não há um cuidador principal, são várias pessoas, não há uma ligação primordial naquele bebé, por isso, será difícil que ele se faça entender, que comunique e que consiga ligar-se aos outros. Quando temos dificuldades em nos ligar aos outros, em estabelecer relações, também temos dificuldade em comunicar aquilo que queremos, de que gostamos, em comunicar as nossas intenções”.
Uma vez que os primeiros sinais de comunicação do bebé passa pela imitação, a forma como os pais falam entre si pode afetar a forma como o bebé irá comunicar no futuro. “Aprendemos a ver com o que temos à nossa volta. O contexto familiar, o contexto em que estou inserido, vai moldar mais à frente o meu futuro, a forma como vou comunicar, como me vou relacionar”, explica, salientando que a forma como as pessoas estão na própria casa é também um fator determinante.
“Uma família em que há muitas discussões, se calhar é uma família em que se comunica bastante, em que de expõe os seus problemas. Depende do tipo de discussão, porque há discussões que nos dão mal-estar. Mas o facto da família discutir, quer dizer que é uma família que comunica, que diz o que quer, o que deseja. Nas famílias mais silenciosas, em que as pessoas se relacionam mais pelo que fazem, não por afetos, comunicam mais sobre as coisas do dia a dia, vai fazer com que a criança, inserida naquela forma de comunicar, vá buscar aquele modelo. As expressões de cada família vai moldar a forma como a criança se vai expressar”, conta-nos a também autora do livro ‘A Linguagem Mágica dos Bebés’ [editora A Esfera dos Livros].
O maternalês e a necessidade de dar importância à comunicação do bebé
O ‘gu-gu-dá-dá’ faz sentido? Perguntámos nós e Joana Rombert não hesitou em responder: “Numa fase inicial é muito bom”.
“Isso é aquilo a que chamamos de maternalês, a forma como aquela conversa em que dizemos ‘olá-a-a-a-a’, esta forma pausada, com frases curtas, com entoação, com melodia. É uma forma de falar dirigida aos bebés mais pequenos. E nós fazemos isto tudo intuitivamente, mas a verdade é que o bebé apreende melhor esta conversa do que se dissermos ‘olá bebé, estás bom?’. Parece pouco natural. Temos tendência a ir à linguagem do bebé e quanto mais formos à linguagem do bebé adequada à sua idade, melhor será para eles”, esclarece a terapeuta do Hospital de Santa Maria, em Lisboa.
Mas, quando é que um pai e/ou uma mãe sabe que tem de mudar a forma como fala com o bebé? “Intuitivamente vai sabendo, não é de um dia para o outro. Há uma altura em que as crianças já dizem ‘ó pai, não gosto que fales comigo à bebé’. O falar à bebé pode ser várias coisas, os pais que dizem ‘o copinho’, ‘a colherzinha’, ‘a chavinha’ e faltam muito em diminutivos, se calhar não é uma fala muito natural. Mas não é por falar de vez em quando assim que vai trazer problemas à criança. A tendência dos miúdos é seguirem os modelos que são corretos, que são melhores. Se a criança tem uma mãe, um avô, um cuidador que fala bem e um pai que fala à miminho, não é isso que vai prejudicar o desenvolvimento natural da linguagem da criança. Se calhar quando está com o pai, a criança pode fazer aquilo no sentido carinhoso para o pai, tem a ver com afeto”.
O choro é um das formas mais genuínas da criança comunicar com os pais e descodificar o que quer dizer nem sempre é fácil. No seu livro, a terapeuta da fala dá a conhecer alguns dos possíveis sinónimos do choro (como cólicas, fome, dor, etc.) e as expressões que mais facilmente podem estar associadas ao momento. Mas trata-se de uma questão assim tão linear? Não. Segundo a autora, a capacidade de descodificar um choro tem a ver com duas coisas: “o período em que o choro acontece e com a expressão global do bebé. Nem todos os choros são codificados, às vezes percebem que o bebé chora com fome outras têm mais dificuldade”.
Mas mais importante do que tentar decifrar cada um dos choros do bebé, especialmente até aos três meses – idade em que a frequência com que chora diminui - “é a tentativa permanente dos pais responderem ao choro do bebé, independentemente da forma como o faz”.
“Os pais devem ir à procura daquele que pode ser o significado do choro, mesmo que não entendam, só o estar lá e a tentativa de perceber o choro vai fazer com que o bebé sinta que há alguém que dá significado àquilo que estou a fazer e por isso vou querer continuar a expressar-me e a comunicar”, diz, frisando que “sim”, que os pais “devem ir ter com o bebé e entender o que se passa com ele. E se às vezes sentem que o choro não acalma, ficar ali um tempo com o bebé. Devemos responder sempre ao que está a pedir”.
E se pensa que o bebé fica mais mimado por ir ter sempre com ele engana-se. De acordo com a especialista, o bebé não é capaz de chorar mais alto ou por mais tempo para obter mais atenção ou mais mimo.
“Um bebé não tem esse tipo de elaboração, mesmo quando se recusam a comer – ainda com meses – eles não têm essa intenção, do ‘eu vou deixar de comer só para os meus pais ficarem irritados’. A partir dos nove meses, eles são mais firmes, sabem o que querem e, portanto, se eles percebem que ao deixar de comer há um olhar ou uma reação diferente dos pais, eles vão achar graça aquilo e vão marcar a sua autonomia. Já sabe bem o que quer ou não quer, mas sua autonomia é muito limitada. Até aos nove meses, as coisas são muito fisiológicas e naturais, mas depois dos nove meses eles ainda não têm esse tipo de elaboração. A partir dos três meses o choro começa a diminuir e claro que ele já sabe que os pais vêm aí, mas ele chora porque quer atenção e que o ajudem nas suas necessidades”.
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