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Ascensão do nacionalismo decorre de "mudança social fundamental"

A ascensão de partidos nacionalistas no mundo ocidental decorre de uma mudança fundamental nas sociedades, de base mais cultural que económica, defendem dois destacados cientistas políticos especializados em assuntos europeus.

Ascensão do nacionalismo decorre de "mudança social fundamental"
Notícias ao Minuto

08:53 - 16/10/18 por Lusa

Mundo Académico

A belga Liesbet Hooghe e o britânico Gary Marks, professores na Universidade da Carolina do Norte, são apontados como os primeiros académicos que identificaram uma clivagem na forma como as populações viam a integração europeia e previram, há uma década, a ascensão dos nacionalismos.

"Chamamos-lhe clivagem porque não traduz uma discordância em relação a políticas, mas algo que afasta as pessoas em relação a assuntos sobre os quais discordam", explica Marks, numa entrevista à agência Lusa.

"As pessoas que tendem a gostar da Europa, do multiculturalismo, das fronteiras abertas, tendem a ser pessoas com mais formação, especialmente educação superior, que vivem em cidades e exercem 'profissões sociais', em que lidam com pessoas a um nível mais elevado", precisa Hooghe.

Do outro lado, os que privilegiam "uma soberania nacional defensiva, a unidade nacional, que se preocupam com a imigração, tendem a ser pessoas com menos educação e encontram-se mais em zonas rurais", acrescenta.

Marks frisa que não se trata de classes sociais no sentido tradicional, porque "a diferença entre classes reduziu-se", e dá como exemplo o eleitorado dos partidos de esquerda, outrora composto sobretudo por trabalhadores manuais, e o dos de direita, por profissionais e empresários, diferença que hoje é residual.

"As pessoas formam grupos socioestruturais diferentes e isso vai contra a forma como costumávamos entender a política", afirma.

"Costumávamos pensar que a instrução libertaria as pessoas da sua origem. Seriam educadas, cognitivamente sofisticadas e tomariam decisões em face dos factos. Seria a individualização da política. Mas isso não aconteceu", prossegue o investigador.

"Na essência, temos um modelo político em que uma mudança fundamental social leva a que os indivíduos tenham crenças profundamente enraizadas", precisa.

Marks e Hooghe criaram dois acrónimos que agregam estes novos grupos sociais, que coexistem sem se sobrepor à esquerda e à direita: GAL, ou Green, Alternative, Libertarian (Ambiental, Alternativo, Libertário) e TAN, Tradicional, Autoritário, Nacionalista.

"É uma forma diferente de organizar as ideias", até porque os partidos nacionalistas "não são a direita radical, muitas vezes são economicamente centro-esquerda, especialmente quanto à proteção social dos nacionais", explica Marks.

"É muito mais cultural, menos económico", acrescenta Hooghe.

Estas mudanças vão refletir-se nas próximas eleições para o Parlamento Europeu.

"Provavelmente os maiores vencedores vão ser os Verdes, ou partidos como eles que não se chamam assim mas são igualmente transnacionalistas, e por outro lado os nacionalistas", diz Hooghe.

"As eleições [de domingo] na Baviera são um indicador. Os Verdes quase duplicaram a votação e os sociais-democratas caíram para metade", acrescenta Marks. Nas europeias, "os partidos GAL-TAN vão aumentar a sua votação e os partidos de esquerda e de direita vão vê-la reduzida".

"E a tendência é para que, entre os partidos convencionais, a social-democracia, a esquerda moderada, tenda a ter muita dificuldade em manter-se", adianta Hooghe.

Liesbet Hooghe e Gary Marks foram entrevistados pela Lusa à margem da conferência "A Europa na encruzilhada" que decorreu na segunda-feira no Instituto de Ciências Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa (UL).

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