Síria: Investigadores da ONU acusam Moscovo de crimes de guerra

Investigadores das Nações Unidas acusaram hoje Moscovo de crimes de guerra ligados a ataques aéreos na Síria e advertiram Ancara que pode ser responsabilizada por crimes de guerra contra os curdos no norte do país.

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Lusa
02/03/2020 16:00 ‧ 02/03/2020 por Lusa

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Síria

 

Num relatório divulgado hoje e que abarca o período de 11 de julho de 2019 até 10 de janeiro, a Comissão de Inquérito Internacional sobre a Síria (COI) afirma ter encontrado provas da participação de aviões russos em dois ataques aéreos na província de Idlib e na zona rural de Damasco, em julho e agosto do ano passado, que causaram mais de 60 mortos.

"A comissão concluiu que um avião russo participou em cada um dos incidentes", declarou, adiantando que "a força aérea russa não dirigiu os ataques para um objetivo militar específico, o que equivale ao crime de guerra que consiste em lançar ataques indiscriminados contra zonas civis".

O relatório indica ainda que a Turquia pode ser responsabilizada criminalmente por graves violações cometidas pelos seus aliados do Exército Nacional Sírio (rebeldes pró-turcos), entre as quais a execução de uma responsável política curda.

Tropas turcas e os seus aliados na Síria invadiram uma parte do norte do país após terem lançado em outubro uma campanha militar contra as forças curdas, que causou a fuga de dezenas de milhares de pessoas.

A COI, criada em 2011 pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU, dá conta de relatos de famílias curdas deslocadas e outros civis que acusaram os rebeldes sírios apoiados por Ancara de execuções e pilhagens, bem como de terem confiscado propriedades.

Dirigida pelo advogado brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro, a COI destaca em particular a execução sumária a 12 de outro de uma responsável política curda, Hevrin Khalaf, e do seu motorista pelos rebeldes pró-turcos.

A secretária-geral do partido Futuro da Síria, da direção do Conselho Democrático Sírio, tinha 35 anos quando foi detida numa autoestrada por membros da brigada 123 do Exército Nacional Sírio. Estes arrastaram-na da viatura pelos cabelos e mutilaram-na antes de a executar, segundo a COI.

"Se se provar que os membros de grupos armados agiam sob o comando e o controlo efetivos das forças turcas, estas violações podem levar à responsabilidade penal dos comandantes que sabiam ou deveriam saber dos crimes ou não tomaram todas as medidas necessárias para os evitar", sublinha o relatório.

É também apontado um ataque aéreo, a 12 de outubro, sobre uma caravana de 80 veículos, incluindo famílias com crianças e jornalistas. Morreram 11 pessoas e 74 ficaram feridas.

Os investigadores denunciam ainda que "objetos necessários à sobrevivência da população civil" são tomados como alvos, como foi o caso de ataques aéreos perto da estação de água de Aluk, que interromperam a distribuição de água a 460.000 pessoas.

A COI já acusou por diversas vezes as diferentes partes no conflito da Síria de terem cometido crimes de guerra e em alguns casos crimes contra a humanidade.

Desta vez, os investigadores descobriram crimes de guerra das forças russas, dos rebeldes sírios apoiados pela Turquia, das forças pró-governamentais e dos 'jihadistas' do Hayat Tahrir al-Sham (HTS, antigo ramo sírio da Al-Qaida).

As forças pró-regime terão utilizado bombas de fragmentação em campos de deslocados densamente povoados e HTS é citado em pelo menos uma execução.

Durante o período analisado ocorreram igualmente outros desenvolvimentos importantes, nomeadamente o reforço no início de dezembro da ofensiva do regime, apoiado pelo aliado russo, na província de Idlib (noroeste), o último grande bastião dos insurgentes, na maior parte controlado pelos 'jihadistas'.

A COI denunciou hoje, a propósito, que quase um milhão de deslocados recentes no noroeste sírio não recebe ajuda humanitária, o que coloca em risco as suas vidas.

Mulheres, crianças e outros civis sírios enfrentam "um nível sem precedentes de sofrimento e dor", disseram os membros da comissão.

Desencadeada em março de 2011, a guerra da Síria já causou mais de 380.000 mortos e milhões de deslocados e refugiados.

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