"Oitenta e quatro por cento dos empréstimos do FMI encorajam, e nalguns casos obrigam, os países pobres duramente atingidos pelas consequências económicas da pandemia a adotarem mais medidas duras de austeridade a seguir à crise de saúde", lê-se numa análise aos programas de ajuda que o Fundo lançou para ajudar os países em dificuldades.
Os 76 dos 91 programas negociados com 81 países desde março deste ano, quando a pandemia foi declarada pela Organização Mundial, "defendem um 'aperto do cinto' que pode resultar em profundos cortes aos sistemas públicos de saúde e às pensões, congelamento de salários dos funcionários públicos, como médicos, enfermeiros, e professores, e sistema de segurança social, como subsídios de doença", de acordo com o documento consultado hoje pela Lusa.
Entre os países africanos apontados como exemplo estão Angola e a Nigéria, "que deverão implementar ou aumentar a coleta de um imposto sobre o valor acrescentado (IVA), que se aplica a produtos quotidianos como alimentação, vestuário e produtos domésticos, e incide desproporcionadamente sobre as pessoas mais pobres".
Além destes dois países africanos produtores de petróleo, que beneficiam de programas de apoio financeiro do FMI, a Oxfam apresenta também o caso do Equador, que "foi aconselhado pelo FMI a reduzir os aumentos na despesa em saúde", e outros 14 países que deverão congelar os aumentos salariais para os funcionários públicos.
"O FMI fez soar o alarme relativamente ao forte aumento na desigualdade, no seguimento da pandemia, mas está a conduzir os países para um sistema em que os gastos durante a pandemia serão depois pagos através de cortes austeros que vão aumentar a pobreza e a desigualdade", comentou a diretora-executiva interina, Chema Vera.
"Estas medidas podem deixar milhões de pessoas sem acesso ao sistema de saúde ou de rendimento enquanto procuram trabalho, e pode acabar com qualquer esperança de uma recuperação sustentável", acrescentou.
Em resposta a esta análise da Oxfam, o diretor de comunicação do FMI comentou à Bloomberg que os fundos de emergência focados no apoio orçamental imediato foram disponibilizados sem quaisquer condições e acrescentou que depois da pandemia haverá muitos países confrontados com dívidas mais elevadas e receitas mais baixas, sendo necessário medidas para colocar as finanças no rumo certo.
Neste sentido, Gerry Rice apresentou três prioridades: aumentar as receitas através de medidas fiscais progressivas ao mesmo tempo que se evitam fugas e evasão fiscal, novas prioridades de despesa e aumento da eficiência, e mais apoio da comunidade internacional na concessão de financiamento concessional, alívio adicional de dívida e, nalguns casos, reestruturação ou reescalonamento da dívida.