Os trabalhadores humanitários finalmente começaram a chegar à região, encontrando hospitais saqueados e até destruídos.
Um novo relatório da ONU baseado nas primeiras avaliações no local confirma algumas das preocupações em torno dos cerca de seis milhões de habitantes de Tigray, desde que o conflito começou em 04 de novembro entre as forças etíopes e as da região de Tigray.
Esta crise ameaça desestabilizar um dos países mais poderosos e populosos da África e próximo de vizinhos como o Sudão.
Os líderes do Tigray dominaram o Governo da Etiópia por quase três décadas antes de o atual primeiro-ministro etíope, Abiy Ahmed, assumir o poder e afastá-los no âmbito de profundas reformas no país, que lhe renderam o Prémio Nobel da Paz, também devido ao fim do conflito com a Eritreia.
Abiy rejeitou a "interferência" internacional no conflito, mesmo quando a ONU e outros pediram o acesso irrestrito a Tigray, porque alimentos, medicamentos e outros bens acabaram.
Agora a covid-19 emergiu como a mais recente fonte de preocupação.
"Apenas cinco dos 40 hospitais em Tigray são fisicamente acessíveis", diz o novo relatório da ONU hoje divulgado.
"Além daqueles em Mekele (capital da província), os hospitais restantes foram saqueados e muitos supostamente destruídos", indica-se no documento.
O trabalho de vigilância e controlo da covid-19 foi interrompido por mais de um mês em Tigray, e isso, junto com o deslocamento de centenas de milhares de pessoas, provoca o temor de que foi facilitada "a transmissão em grande escala da pandemia pela comunidade", refere-se no relatório.
A Etiópia tem um dos maiores números de casos no continente africano, com mais de 127.000 infeções confirmadas. Embora a sua taxa de casos diários tenha diminuído nas últimas semanas, as autoridades não disseram se estão a receber dados da região de Tigray.
"As unidades de saúde fora das grandes cidades não estão a funcionar e nas grandes cidades estão a trabalhar parcialmente, sem reservas de suprimentos e ausência de profissionais de saúde", sublinha-se no relatório da ONU.
O relatório também diz que a região de Tigray permanece volátil.
"Os combates localizados e a insegurança continuam, com conflitos relatados em áreas rurais e nas periferias de Mekele, Shiraro e Shire, entre outros locais, na semana passada", refere-se no documento.
A situação humanitária geral é "terrível", segundo a ONU, com suprimentos de alimentos "muito limitados" e relatos de saques generalizados.
"Apenas alimentos produzidos localmente estão disponíveis e a preços crescentes, tornando os bens básicos inacessíveis. A maioria dos residentes de Tigray são agricultores de subsistência, e o conflito interrompeu a colheita", de acordo com o relatório.
Dois importantes campos que acolhem dezenas de milhares de refugiados na vizinha Eritreia continuam inacessíveis, sendo outra fonte de preocupação, porque foi confirmada a presença de tropas da Eritreia em Tigray.
Ninguém sabe quantos milhares de pessoas foram mortas no conflito. Pelo menos cinco trabalhadores humanitários foram mortos.
Depois de meses de desconfianças mútuas, o primeiro-ministro Abiy Ahmed lançou em 04 de novembro uma operação militar para desalojar os dirigentes "ilegítimos" do Tigray e aí instalar uma nova administração.
A operação acabou oficialmente no final de novembro, mas os antigos dirigentes continuam em fuga e o Tigray continua a ser de acesso muito difícil para a ONU, jornalistas e organizações humanitárias.
Não existe qualquer balanço oficial do conflito, mas os combates levaram mais de 50 mil pessoas a procurar refúgio no Sudão e outros 63 mil a procurar abrigo em outros locais da região, segundo a ONU.