Após 18 dias sem que o presidente aparecesse em público, o que desencadeou inúmeros rumores sobre a sua saúde, o vice-presidente da Tanzânia, Samia Suluhu, confirmou hoje a sua morte devido a problemas cardíacos.
O seu último ano como chefe de Estado foi marcado por uma estratégia de combate ao coronavírus - baseada na fé e na oração - que provocou críticas dentro e fora das fronteiras da Tanzânia.
Além disso, o seu negacionismo deu origem a comparações com o homólogo brasileiro, Jair Bolsonaro, ou com o ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, dois líderes mundiais que rejeitaram a existência da covid-19 e acabaram por contrair a doença.
Em março de 2020, pouco depois da deteção do primeiro caso de covid-19 no país, o presidente tanzaniano afirmou que o coronavírus era "o diabo" e que, portanto, se a população tivesse fé, seria impossível ao vírus "sobreviver no corpo de Cristo".
Rejeitava as vacinas e censurava qualquer medida "criada pelo ocidente", tendo chegando a alegar que testes defeituosos de deteção do novo coronavírus tinham dado resultados positivos numa papaia e numa cabra.
Desde junho, que a Tanzânia não publica quaisquer números relativos a casos da doença, com os dados oficiais estagnados em 509 infeções e 21 mortes.
Nascido em 1959 em Chato, no noroeste da Tanzânia, Magufuli estudou matemática e doutorou-se em química na Universidade de Dar es Salaam, o centro regional do pensamento anticolonialista e pan-africanista onde estudaram várias figuras políticas que governam ou governaram nos últimos anos na África Oriental, como o ugandês Yoweri Museveni ou o congolês Laurent-Désiré Kabila.
Eleito, pela primeira vez, quinto presidente da Tanzânia em 2015 à frente da formação que governa o país desde a sua independência em 1961, o Partido da Revolução, Magufuli foi reeleito para um segundo mandato a 28 de outubro, em eleições descritas pela oposição como "fraudulentas" e nas quais quase não houve observadores.
Chegou à presidência como nacionalista e evocando a herança do "pai da nação tanzaniana", Julius Nyerere, o socialista que continua a ser a grande referência política do país mesmo vinte anos após a sua morte.
Os seus grandes planos de desenvolvimento, ao começar como ministro das Obras Públicas com explorações de gás ou a expansão do porto de Dar es Salaam, valeram-lhe a alcunha de "bulldozer", enquanto as reformas que promoveu levaram os seus apoiantes a considerá-lo um "Nyerere" contemporâneo.
A sua popularidade aumentou após ter transformado o Dia da Independência num dia de limpeza coletiva, de ter proibido membros do seu governo de viajarem para o estrangeiro sem a sua autorização, uma proposta poupou ao Estado milhões de dólares, e de ter expulsado dezenas de pessoas acusadas de corrupção.
O seu legado durante o primeiro mandato inclui a assinatura com o Uganda do primeiro projeto regional de gasoduto e da mega-barragem de Stiegler no Parque Selous (sul da Tanzânia), o que lhe valeu críticas de ativistas ambientais por ter alterado uma enorme reserva natural declarada Património Mundial pela Unesco.
Ao longo do mandato, as suas posições foram endurecendo, e na última campanha eleitoral, proibiu qualquer comício político da oposição.
Nas últimas semanas de ausência, quando muitas vozes já duvidavam da sua saúde, a polícia tanzaniana seguiu os seus passos prendendo todos aqueles que espalham alegadas "falsas notícias".
Desde a sua chegada ao poder em 2015, dezenas de pessoas foram presas por sedição ou blasfémia e a principal figura da oposição agora no exílio, o advogado Tundu Lissu, foi preso pelo menos seis vezes.
Magufuli, um católico fervoroso, lançou-se igualmente numa cruzada contra a comunidade LGTBI, proibiu raparigas grávidas e adolescentes de frequentarem a escola, fez campanha contra o uso de contracetivos e minou a liberdade de imprensa e de expressão no país, segundo várias organizações de defesa dos direitos humanos.
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