ONU: Novamente na liderança do "trabalho mais impossível do mundo"
António Guterres vai assumir sexta-feira o segundo mandato como nono secretário-geral das Nações Unidas, cargo que foi exercido pela primeira vez pelo norueguês Trygve Halvand Lie a 02 de fevereiro de 1946.
© Reuters
Mundo António Guterres
Na história da organização, apenas três secretários-gerais da ONU não cumpriram dois mandatos -- Halvand Lie, que foi demitido em 1952, já em pleno segundo mandato, o sueco Dag Hammarskjöld, apesar de reeleito em 1957, morreu num desastre aéreo em 1961, e o egípcio Boutros Boutros-Ghali, que não o renovou em 1997 porque não recebeu o apoio nesse sentido.
Os cinco restantes cumpriram dois mandatos -- o birmanês U Thant (1961/1971)
O austríaco Kurt Waldheim (1972/1981), o peruano Javier Pérez de Cuéllar (1982/1991), o ganês Kofi Annan (1997/2006) e o sul-coreano Ban Ki-moon (2007/2017).
Trygve Halvdan Lie assumiu funções como primeiro secretário-geral da ONU dia 02 de fevereiro de 1946, ocupando o cargo até à sua demissão em 1952. Político norueguês e diplomata, é dele a frase que viria a definir a tarefa nas Nações Unidas: "bem-vindo ao trabalho mais impossível do mundo", disse ao seu sucessor, Dag Hammarskjöld, no dia em que o diplomata sueco foi eleito.
Lie viu-se obrigado a demitir-se em 1952, uma vez que não se encontravam reunidas, explicou, "as condições suficientes para prosseguir com o mandato", devendo-se por diferentes razões, a pressões por parte da então União Soviética e dos Estados Unidos.
Dag Hammarskjöld, foi então escolhido em 1953 e seria reeleito em 1957, mas acabaria por morrer quando o avião em que seguia, se despenhou a 18 de setembro de 1961 na Rodésia do Norte, atual Zâmbia.
Durante os seus mandatos, participou na resolução das crises do Canal do Suez (1956), do Líbano e da Jordânia (1958). Em 1960, o Congo Belga -- hoje a República Democrática do Congo -- tornou-se independente, dando início a um longo período de violência e instabilidade na região.
Foram enviadas forças de manutenção de paz da ONU para a região no início de setembro, uma decisão que não agradou aos representantes da União Soviética, que exigiram a demissão de Hammarskjöld e que fosse substituído por uma 'troika', com um representante ocidental, outro comunista e um terceiro neutro, o que não aconteceu.
O legado deste secretário-geral passa pelo seu papel na prevenção da escalada de conflitos e pela organização das primeiras conferências internacionais sobre o Uso Pacífico de Energia nuclear.
U Thant assumiria funções como terceiro secretário-geral da ONU a 30 de novembro de 1961, iniciando um mandato que se estenderia por 10 anos, até 1971. Nascido em Birmânia (atual Myanmar), foi o primeiro secretário-geral não europeu.
No período como secretário-geral, facilitou as negociações entre John F. Kennedy (Estados Unidos) e Nikita Khrushchev (União Soviética) durante a crise dos mísseis de Cuba (1962), posicionou-se fortemente contra a intervenção americana no Vietname e assistiu à entrada de vários países recém-independentes na ONU.
Ao diplomata birmanês sucedeu o austríaco Kurt Waldheim, em 1971, que foi reeleito em 1976, cumprindo o segundo mandato até 1981, tendo proposto manter-se para um terceiro mandato, o que foi recusado e aproveitado pela ONU para definir o número máximo de mandatos à frente da organização -- dois.
Ex-Presidente da Áustria e diplomata de carreira, Waldheim deu início à prática ainda corrente de visitar áreas e países de especial interesse para as Nações Unidas, o que lhe permitiu travar conhecimento e testemunhar, em primeira mão, de que forma os problemas que ocupavam a agenda internacional de então afetavam concretamente a vidas das pessoas em todo o mundo.
O cargo seguinte foi exercido pelo peruano Javier Pérez de Cuéllar, que permaneceria nessas funções durante dois mandatos, até 1991, tendo dedicado os mandatos à resolução de conflitos e à manutenção de paz. Entre as suas inúmeras participações em negociações internacionais, encontram-se a mediação de conversações entre o Reino Unido e a Argentina após a Guerra das Falklands, a independência da Namíbia e o conflito Irão-Iraque. Foi também durante o seu mandato que os "capacetes azuis" receberam o Prémio Nobel da Paz (1988).
A seguir ao primeiro sul-americano, Boutros-Ghali tornou-se o primeiro de dois africanos a assumir as funções de secretário-geral da ONU, onde ficaria apenas durante um mandato (1992/1997).
Em 1992, a ONU via a sua influência crescer após um papel preponderante na Guerra do Golfo, mas rapidamente perdeu a simpatia da sociedade civil após o genocídio do Ruanda em 1994, em que Boutros-Ghali foi criticado pelo papel passivo da organização durante o genocídio. A juntar às críticas, e entre outras controvérsias, veio também a sua oposição à intervenção da NATO na Bósnia, razões apontadas como as principais para a não renovação do mandato.
O ganês Kofi Annan (1997/2007) seria o sétimo secretário-geral da ONU, o primeiro, porém, a ser eleito entre os funcionários da própria organização, para a qual entrou em 1962 através da Organização Mundial de Saúde (OMS).
Enquanto secretário-geral, entre inúmeras negociações relevantes em que participou encontram-se, por exemplo, em 1998, o esforço para influenciar o Iraque a cumprir com as resoluções do Conselho de Segurança -- que ajudou a evitar a eclosão de hostilidades iminentes naquela época -- e o envolvimento no processo pelo qual Timor-Leste se tornou um país independente (2001).
Em 2001, juntamente com a própria ONU, foi distinguido com o Prémio Nobel da Paz pela criação do Fundo Global de Luta contra a Sida, Tuberculose e Malária, fruto do seu papel de liderança na mobilização da comunidade internacional na luta contra essas doenças nos países em desenvolvimento.
Em 2007 seguiu-se o sul-coreano Ban Ki-moon, que permaneceria no cargo até 2017. Na altura da sua eleição, Ban Ki-moon era ministro dos Negócios Estrangeiros e do Comércio da Coreia do Sul.
António Guterres sucedeu a Ban Ki-moon em 2017. Entrou para o Sistema das Nações Unidas em 2005, quando foi nomeado Alto-Comissário das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), cargo que viria a ocupar durante 10 anos, período em que lidou com uma das mais graves crises de refugiados das últimas décadas, com o agudizar de conflitos na Síria, no Iraque e no Iémen e de várias crises no continente africano, como no Sudão do Sul e na República Centro-Africana.
Neste período, promoveu uma série de reformas estruturais no ACNUR, visando melhorar a capacidade de resposta e a eficácia da agência em situações de emergência.
Lista dos nove secretários-gerais da Organização das nações Unidas (ONU):
- Trygve Halvand Lie (Noruega) (1946, reeleito em 1951. Em 1952 apresentou a demissão);
- Dag Hammarskjöld (Suécia) (1953, reeleito em 1957. Morreu num acidente de avião a 18 de setembro de 1961);
- U Thant (Myanmar -- ex-Birmânia) (1961/1971)
- Kurt Waldheim (Áustria) (1971/1981);
- Javier Pérez de Cuéllar (Peru) (1981/1991);
- Boutros Boutros-Ghali (Egito) (1991/1997 -- apenas um mandato);
- Kofi Annan (Gana) (1997/2007)
- Ban Ki-moon (Coreia do Sul) (2007/2017)
- António Guterres (Portugal) (desde 2017, reeleito em 2021).
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