Em entrevista à agência Lusa, a investigadora do Instituto Português de Relações Internacionais (IPRI), da Universidade Nova de Lisboa, referiu que a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) funcionará nesta questão "mais como um fórum informal de concertação de visões", sendo as intervenções militares levadas a cabo no quadro da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC).
A SADC aprovou numa cimeira extraordinária, no final de junho, o envio de forças para o norte de Moçambique e uma missão avançada deverá chegar esta semana. Além destas forças, chegou na sexta-feira um primeiro contingente de tropas ruandesas, que também vão apoiar o país lusófono, no âmbito de um acordo bilateral.
Por seu lado, a União Europeia aprovou na segunda-feira uma missão de formação militar em Moçambique que visa "treinar e apoiar as Forças Armadas moçambicanas" no "restabelecimento da segurança" em Cabo Delgado, que terá a duração de dois anos e que será chefiada no terreno pelo brigadeiro-general do Exército português Nuno Lemos Pires.
A nível da SADC, defendeu Alexandra Magnólia Dias, a expetativa é que a África do Sul seja a "maior contribuinte com forças" por ser a potência continental e regional.
A professora especialista em assuntos africanos destacou também a missão da União Europeia, "pela sua experiência no combate ao extremismo violento", referindo como exemplo as intervenções na Somália e no Mali, "em que militares portugueses também estiveram integrados", ou em outros contextos regionais no Corno de África ou no Sahel.
"Esta experiência é importante em termos de lições aprendidas, o que se deve evitar trazer para o quadro de Moçambique, de Cabo Delgado e para aquela região fronteiriça com a Tanzânia, de fronteiras porosas", acrescentou.
Para a investigadora, mesmo a missão da UE é limitada à formação e ao apoio técnico porque "há uma arquitetura de paz e segurança africana".
"Há um dispositivo regional, as tais comunidades económicas regionais onde faz sentido então falar do empenhamento e Moçambique mostrou-se mais recetivos relativamente a um enquadramento regional de uma intervenção internacional", lembrou.
Sobre o papel de Angola, que também integra a SADC, Alexandra Magnólia Dias referiu que o país lusófono podia ter um "papel duplo" por integrar a organização regional e pela "experiência de outros teatros de operações dos Grandes Lagos", mas o facto é que "a potência hegemónica", continental e regional, é a África do Sul.
Moçambique está assim a apoiar-se nas "relações privilegiadas" com "os países vizinhos contíguos", disse, referindo que "o movimento de insurgência extremista violento em Cabo Delgado constitui uma ameaça para a segurança da própria África do Sul".
Da parte da CPLP, a XIII cimeira de Chefes de Estado e do Governo, na sexta-feira e no sábado, em Luanda, "é importante como fórum onde pode haver uma discussão ao mais alto nível dos diferentes Estados-membros de formas efetivas de manifestação de solidariedade com Moçambique", mas "não faz sentido pensar numa missão de apoio à paz ou numa intervenção" da organização lusófona, concluiu.
Grupos armados aterrorizam Cabo Delgado desde 2017, sendo alguns ataques reclamados pelo grupo 'jihadista' Estado Islâmico, numa onda de violência que já provocou mais de 2.800 mortes, segundo o projeto de registo de conflitos ACLED, e 732.000 deslocados, de acordo com a ONU.
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