Ao contrário de outras potências, como os Estados Unidos da América (EUA), o Reino Unido ou a União Europeia (UE), que condenaram o golpe de Estado conduzido pelas forças militares birmanesas em fevereiro passado e que decidiram impor sanções visando interesses específicos do exército birmanês, Pequim tem mantido uma postura recetiva em relação ao regime militar.
Ao abrigo do mecanismo de cooperação Lancang-Mekong, iniciado em 2016 e que integra seis países asiáticos (China, Camboja, Myanmar, Laos, Tailândia e Vietname), Pequim acordou com a junta militar o financiamento de projetos que abrangem diferentes áreas, como é o caso da vacinação de animais, proteção contra desastres naturais ou turismo, segundo noticiou hoje a imprensa oficial birmanesa.
Entre 2017 e 2020, a China investiu mais de 16,3 milhões de dólares (13,9 milhões de euros) em mais de 50 projetos de desenvolvimento em solo birmanês através deste mecanismo de cooperação, precisou o jornal The Global New Light of Myanmar, atualmente controlado pela junta militar.
A China, que há vários anos procura ampliar a sua influência em Myanmar através da abertura de oleodutos, da construção de portos ou do desenvolvimento de zonas económicas especiais, apresenta-se neste momento, a par da Rússia (o principal exportador de armas para o território birmanês), como um dos principais aliados do regime militar.
O exército de Myanmar justificou o golpe de Estado militar de 01 de fevereiro deste ano com supostas fraudes eleitorais durante as legislativas de novembro de 2020, cujo resultado deu a vitória à Liga Nacional para a Democracia, força política liderada pela ativista e Nobel da Paz Aung San Suu Kyi.
As eleições legislativas foram consideradas legais pelos observadores internacionais.
Desde então, Myanmar encontra-se numa situação de caos, com a economia paralisada e palco de manifestações e distúrbios fortemente reprimidos pelas forças militares e pela polícia birmanesa, que chegaram a disparar balas reais, além do recurso a gás lacrimogéneo, balas de borracha e granadas de choque, contra os manifestantes.
A par das manifestações, a contestação também tem sido expressa em greves conduzidas por milhares de trabalhadores do setor público em todo o país, que geraram problemas em várias áreas de atividade, incluindo saúde, banca, educação e indústria, e deixaram o sistema público à beira do colapso.
Segundo a Associação de Assistência a Presos Políticos (AAPP), a repressão da oposição birmanesa fez 945 mortos e mais de 7.130 pessoas foram detidas arbitrariamente.
Cerca de 200 mil pessoas foram igualmente forçadas a fugir de casa devido às ações militares em bairros e em localidades daquele país.
A profunda crise política e social desencadeada pelo golpe militar está a ser agravada pela disseminação descontrolada do novo coronavírus no país, cujo sistema de saúde está em colapso, segundo relatam as agências internacionais.
O líder da junta militar, Min Aung Hlaing, comprometeu-se recentemente a realizar novas eleições no país "até agosto de 2023", tendo justificado novamente o golpe de fevereiro com a suposta fraude eleitoral no escrutínio de novembro de 2020.
No passado dia 26 de julho, a junta militar anulou os resultados das eleições de novembro, alegando que mais de 11 milhões de casos de fraude tinham sido detetados, acusação que o partido de Aung San Suu Kyi negou.
Aung San Suu Kyi, de 76 anos, continua sob prisão domiciliária e foi acusada de vários delitos, incluindo corrupção e sedição, incorrendo em pesadas penas de prisão.
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