Vincent Lurquin, que viajou para Kigali para visitar Rusesabagina, graças a um acordo entre o seu país e o Ruanda, denunciou, na sexta-feira, que o Governo ruandês o tinha impedido de ter acesso ao seu cliente até que a Bélgica abandonasse as suas investigações sobre Rusesabagina, que tem nacionalidade belga e viveu no exílio entre a Bélgica e os Estados Unidos da América vários anos.
Estas investigações datam de 2018, quando o Ruanda pediu ao país europeu de investigasse as alegadas ações criminosas daquele notório crítico de Paul Kagame, o Presidente ruandês.
De acordo com declarações do tenente-coronel Regis Gatarayiha, que chefia a Direção-Geral da Imigração e Emigração do Ruanda, à agência de notícias Efe, Lurquin violou as condições do visto de visitante.
"Entrou no país em 16 de agosto de 2021 com um visto turístico de 30 dias, mas nós, autoridades de imigração, ficámos surpreendidos ao vê-lo fazer o seu trabalho sem uma autorização de trabalho", disse Gatarayiha.
"Era suposto obter autorização da Ordem dos Advogados do Ruanda e depois vir à imigração para obter uma autorização de trabalho", acrescentou.
Já a Ordem dos Advogados ruandesa disse à Efe que lhe foi negada a autorização, porque não existe um "acordo" de reciprocidade com a associação belga equivalente, que permita aos advogados de cada país trabalharem no outro território.
Por isso, Vicent Lurquin foi deportado no sábado sem ter podido visitar o seu cliente na sexta-feira, depois do sistema judicial ruandês ter adiado, na semana passada, o veredicto sobre o caso de terrorismo de que é acusado, para 20 de setembro, e que estava inicialmente previsto para 20 de agosto.
Rusesabagina, de 66 anos, é alvo de nove acusações de terrorismo, acusado de liderar a Frente de Libertação Nacional (FLN), a ala armada do seu partido, o Movimento Ruandês para a Mudança Democrática (MRCD).
As acusações incluem a formação de um grupo armado irregular, e a sua filiação num grupo terrorista e financiamento do terrorismo, bem como de homicídio, rapto e assalto à mão armada no âmbito de ato de terrorismo.
O Ministério Público ruandês pediu a prisão perpétua do antigo herói que inspirou o filme "Hotel Ruanda" e milhões de dólares em compensação pelos danos causados às vítimas da FLN.
O acusado e a sua família atribuem estas acusações a perseguição política, pelas suas críticas a Kagame e afirmam que a sua detenção, em agosto de 2020, foi ilegal.
Rusesabagina foi gerente do Hotel Thousand Hills, na capital ruandesa, e alojou mais de mil tutsis e hutus moderados, para os salvar dos hutus extremistas durante o genocídio de 1994.
Estes eventos inspiraram mais tarde o filme "Hotel Ruanda", o que lhe trouxe um amplo reconhecimento mundial.
Em casa, porém, foi criticado por muitos sobreviventes que o acusaram de explorar o genocídio em proveito pessoal.
O genocídio no Ruanda teve início em 07 de abril de 1994, após o assassinato, no dia anterior, dos Presidentes do país, Juvénal Habyarimana (hutu), e do Burundi, Cyprien Ntaryamira (hutu), quando o avião em que viajavam foi abatido sobre Kigali.
A violência resultou na morte de cerca de 800.000 tutsis e hutus moderados em cerca de 100 dias, um dos piores assassinatos étnicos da história recente.
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