Berlim continua a adiar uma posição mais vincada em relação à Rússia e a uma eventual invasão da Ucrânia. Por um lado, o novo chanceler quer agradar aos Estados Unidos e aos aliados na Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO). Por outro lado, Olaf Scholz tem de manter boas relações com Moscovo, receando as consequências económicas para o país e para a Europa.
"É uma situação muito complicada para ele. Tem de preocupar-se não apenas com a política internacional, mas também interna, não só dentro do próprio SPD (Partido Social Democrata), como também na coligação", referiu o politólogo Marcel Dirsus em declarações à agência Lusa.
Para o investigador não-residente no ISPK - Instituto de Política de Segurança da Universidade de Kiel - conseguir ambos objetivos está a tornar-se "cada vez mais difícil", porque os aliados estão a interpretar a inação da Alemanha como "apoio indireto à Rússia".
Sascha Lohmann, investigador convidado no SWP -- Instituto alemão de Assuntos Internacionais e de Segurança, concorda que o chanceler Scholz tem de lidar com "posições divergentes".
"Tanto no seu governo de coligação, onde os Verdes se comprometeram a terminar com o projeto Nord Stream 2 (gasoduto), como na União Europeia, onde muitos Estados-membros exigem uma posição mais dura em relação à ação do governo russo, mantendo um canal diplomático aberto com Moscovo", indicou em declarações à Lusa.
O Governo alemão tem insistido que está ao lado dos seus aliados da NATO na questão da ameaça militar da Rússia à Ucrânia, advertindo que Moscovo pagará um preço elevado se lançar qualquer ação militar contra aquele país vizinho.
Mas, ao contrário de muitos outros países da Aliança Atlântica, a Alemanha continua a sublinhar que não fornecerá à Ucrânia armas letais, argumentando que não quer aumentar mais as tensões. No entanto, o executivo de Scholz esclareceu que ajudou a financiar um hospital militar no país.
"É impossível manter todos contentes. Vão acabar por ter de decidir fazer uma coisa ou outra. Financiar um hospital não será suficiente. O que a Alemanha provavelmente fará será endurecer a sua posição perante Moscovo, deixando claro que não é com uma intenção hostil, mas apenas como uma reação à ameaça da Rússia em relação à Ucrânia. É importante para o governo da Alemanha dar uma alternativa, uma escolha à Rússia para poder retroceder", sublinhou Marcel Dirsus.
"A recusa, até agora, em enviar armas de defesa foi justificada com referência à constituição alemã, entre outros motivos. No entanto, a divisão entre aliados da NATO está a crescer, principalmente depois do fornecimento de armas por parte do Reino Unido e outros, aumentando a pressão sobre a Alemanha para seguir o exemplo", apontou Sascha Lohmann.
A ministra dos Negócios Estrangeiros, Annalena Baerbock, sublinhou na segunda-feira, que a Alemanha está pronta para ajudar a Ucrânia financeira e economicamente. Palavras partilhadas em Bruxelas depois de no sábado, o homólogo ucraniano, Dmytro Kuleca, ter criticado Berlim por se recusar a fornecer armas a Kiev.
Para o politólogo Marcel Dirsus, não só a situação é "muito má para a Alemanha" como também o "timing é péssimo".
"Acho que muita gente subestimou a situação. É verdade que Olaf Scholz tem muita experiência governativa, mas a maioria dos seus ministros estão agora a começar este percurso e este é o primeiro real problema que enfrentam. E não é só o trabalho nos ministérios, é aprenderem a trabalhar todos em conjunto", acrescentou.
Os países ocidentais acusam a Rússia, que concentrou um grande número de tropas na fronteira com a Ucrânia nos últimos meses, de pretender invadir novamente o país vizinho, depois de ter anexado a península ucraniana da Crimeia, em 2014, e de alegadamente patrocinar, desde então, um conflito em Donbass, no leste da Ucrânia.
A Rússia nega quaisquer planos para uma invasão, mas associa uma diminuição da tensão a tratados que garantam que a NATO não se expandirá para países do antigo bloco soviético.
Moscovo manifestou hoje "grande preocupação" com a decisão dos Estados Unidos de colocar 8.500 militares em "alerta máximo" para um possível destacamento na Europa de Leste devido à escalada de tensões sobre a Ucrânia. A NATO também anunciou o reforço dos seus efetivos em países da frente oriental da Aliança Atlântica.
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