Novo gasoduto deixa Alemanha "entre a espada e a parede"
O gasoduto "Nord Stream 2", que liga a Rússia à Alemanha, pode estar em risco de não vir a operar devido à escalada da tensão com a Ucrânia, deixando Berlim "entre a espada e a parede".
© Getty Images
Mundo Nord Stream 2
Marcel Dirsus, politólogo e investigador não-residente no ISPK - Instituto de Política de Segurança da Universidade de Kiel, avalia a situação como extremamente complexa.
De um lado a pressão dos aliados da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO), do outro o abastecimento de gás essencial para a Alemanha e para os restantes países da Europa Central.
"Não estou a ver o Nord Stream 2 arrancar se a Rússia atacar a Ucrânia. Penso que terá de haver uma moratória ao projeto do gasoduto porque até os alemães vêm que, se isso acontecesse, daria uma péssima perceção que nunca seria do interesse da Alemanha", frisou, em declarações à agência Lusa.
A operadora do gasoduto Nord Stream 2 anunciou hoje em comunicado que vai criar uma subsidiária alemã para desbloquear o processo de certificação.
A subsidiária Gas for Europe, sediada na cidade alemã de Schwerin (norte) "vai concentrar todos os esforços para o cumprimento dos requisitos de forma a dar continuidade ao processo de certificação", indica o comunicado da empresa hoje.
Em novembro do ano passado, o regulador alemão travou temporariamente o processo de autorização ao início da operação do gasoduto, controlado pela gigante russa Gazprom, e exigiu à operadora que adotasse uma forma jurídica de acordo com a lei alemã para poder gerir o troço alemão da infraestrutura, de 54 quilómetros.
Explicou ainda na altura que, uma vez cumpridos todos os requisitos, existe um prazo de quatro meses para preparar um projeto de decisão, que, de acordo com o direito comunitário, será posteriormente transferido para a Comissão Europeia para que esta se pronuncie.
Sobre o futuro das relações entre a Alemanha e a Rússia, caso haja um ataque à Ucrânia, Dirsus não tem dúvidas de que "irão piorar seriamente".
Franziska Holz, investigadora no Departamento de Energia, Transporte e Ambiente do DIW -- Instituto alemão de Investigação Económica, acredita que se um confronto armado se concretizar, será muito difícil para o novo chanceler, Olaf Scholz, manter a sua posição.
O Governo alemão tem insistido que está ao lado dos seus aliados da NATO na questão da ameaça militar da Rússia à Ucrânia, advertindo que Moscovo pagará um preço elevado se lançar qualquer ação militar contra aquele país vizinho.
Mas, ao contrário de muitos outros países da Aliança Atlântica, a Alemanha continua a sublinhar que não fornecerá à Ucrânia armas letais, argumentando que não quer aumentar mais as tensões. No entanto, o executivo de Scholz esclareceu que ajudou a financiar um hospital militar no país.
"Há posições divergentes dentro do próprio governo de coligação. Os Verdes, na Alemanha e na Europa, relacionam o conflito ao Nord Stream 2. Já os social-democratas são, tradicionalmente, mais brandos com a posição da Rússia", revelou à Lusa Francisca Holz.
Para a investigadora alemã, Scholz deverá assumir a mesma posição assumida pela antiga chanceler em relação ao gasoduto, tentando manter o assunto longe das decisões políticas durante o maior tempo possível.
A União Europeia é altamente dependente do gás da Rússia e perturbações no fornecimento podem fazer aumentar os preços energéticos.
"A dificuldade é precisamente o facto de estarmos muito dependentes, a curto prazo, do fornecimento da Rússia. Os armazéns estão relativamente vazios, a capacidade de importação de gás natural é insuficiente para compensar a interrupção do fluxo que provém da Rússia", explicou à Lusa Hanns Koenig, analista do setor da energia na "Aurora Energy Research".
"Isso contribuiu muito para a posição vacilante da Alemanha quando se trata de novas sanções", continuou.
Segundo agências noticiosas internacionais, fontes da administração dos Estados Unidos indicaram na terça-feira que Washington está a trabalhar com os aliados europeus para procurarem mercados alternativos ao gás natural e petróleo oriundos da Rússia, para abastecer a Europa no caso de uma invasão russa da Ucrânia, o que também permite evitar a dependência de Moscovo e infligir danos à sua economia.
Os países ocidentais acusam a Rússia de pretender invadir novamente o país vizinho, depois de ter anexado a península ucraniana da Crimeia, em 2014, e de patrocinar, desde então, um conflito em Donbass, no leste da Ucrânia.
A Rússia nega quaisquer planos para uma invasão, mas associa uma diminuição da tensão a tratados que garantam que a NATO não se expandirá para países do antigo bloco soviético.
Para o analista Hanns Koenig, é "difícil imaginar" que o projeto do Nord Stream 2 seja implementado caso haja de facto uma invasão da Ucrânia por parte da Rússia.
Sobre a escolha de Klaus Müller, antigo ministro dos Verdes com a pasta do Ambiente no governo de Schleswig-Holstein, para o mais alto cargo na agência federal dedicada à energia, Koenig acredita que o papel da instituição deverá continuar a ser apenas de regulador, sem interferência nas decisões políticas.
Também para Franziska Holz a posição "cuidadosa e prudente" da agência não deverá sofrer alterações com Müller na liderança.
"Pedindo que o operador do Nord Stream 2 fosse uma empresa alemã, a agência ganhou tempo para que os decisores políticos tomassem uma decisão em relação à abertura. Por isso, não espero que a posição da agência se altere com a entrada do senhor Müller", salientou.
Os preços da energia na Alemanha, no mês de dezembro, subiram 69% em relação a dezembro de 2020.
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